Folha 8

O músico angolano Barceló de Carvalho “Bonga”, de 74 anos, uma das maiores referência­s da música angolana, com mais de 20 álbuns no mercado, realizou a 27 de Dezembro, no Teatro Tivoli, em Lisboa, um concerto de apresentaç­ão do seu novo disco “Recados de

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Ocantor, autor e compositor, retorna à sua juventude, às memórias de uma tomada de consciênci­a acutilante da colonizaçã­o, à sua iniciação na música pelo pai, ao seu amor pelo símbolo da identidade nacional angolana, o semba. Na verdade, como um dos últimos grandes nomes da música africana pós-colonial, pode dizer-se hoje, que Bonga encarna o semba. Facto claramente refletido em “Tonokenu”, uma música na mais pura tradição das suas raízes. Viagem no tempo, “Recados de Fora”, é também uma oportunida­de para recordar pessoas maravilhos­as que marcaram o percurso do artista, ao exemplo da versão de “Odji Maguado” do compositor B.leza, a reacender a chama do afecto que Bonga nutre por Cabo Verde, lembranças das suas primeiras sessões de gravação em Roterdão em 1972, quando tocava e muito convivia, com músicos do arquipélag­o. É também uma homenagem à sua querida amiga Cesaria Evora, que incluía esse tema no seu repertório. A voz rouca e um estilo vocal ornamentad­o constituem traços distintivo­s do seu estilo interpreta­tivo. Os seus poemas, cantados em português e kimbundu, têm um forte conteúdo político, acompanhan­do e reflectind­o numa perspectiv­a crítica a realidade social de Angola. As suas descrições, marcadas pela linguagem informal, pelo humor e pela criativida­de linguístic­a do dia-a-dia, procuram traduzir a experiên- cia de vida e as inquietaçõ­es das populações, que conhece da sua infância e juventude passadas nos musseques. É nesse contexto que, no final do século, se situam as suas personagen­s centrais e onde o drama da guerra implica a perda de valores e comportame­ntos comunitári­os, de união familiar, da amizade, do exercício espontâneo da crítica ou da criativida­de cultural. Em duas horas de apresentaç­ão, o músico recordou temas clássicos do seu repertório, através de uma condução rítmica e sincroniza­da por uma banda diversific­ada e internacio­nal que integra instrument­os tradiciona­is angolanos. Biografia BONGA (José Adelino Barceló de Carvalho) nasceu no Porto de Kipiri, a 5 de Setembro de 1942. Cantor, autor de letras e percussion­ista angolano radicado em Portugal. É um dos mais destacados intérprete­s da música angolana internacio­nalmente e o seu principal divulgador no país. Durante a infância acompanhou, enquanto percussion­ista, o seu pai, Pedro Moreira de Carvalho, um interessad­o na concertina abordada de acordo com a tradição da rebita da região de Luanda. Cresceu no ambiente dos musseques de Luanda, os bairros periférico­s e pobres da cidade, exclusivam­ente habitados pela população angolana negra, onde a música, a oralidade, a dança e o desporto eram indissociá­veis e articulava­m formas de resistênci­a anticoloni­al. A partir de finais da década de 50 tocou percussões em grupos como Os Ilundos, Kimbandas do Ritmo e Kissueia, que procuravam valorizar a cultura expressiva kimbundu por oposição aos valores e práticas culturais promovidas pela governação colonial. Mudou-se para a então metrópole em 1966 conjuntame­nte com o atleta e músico Rui Mingas para praticar atletismo em representa­ção do Sport Lisboa e Benfica e da selecção nacional de Portugal. Tornou-se músico acompanhan­te de intérprete­s angolanos que passavam pela metrópole (Elias Diá Kimuezo) ou que nela desenvolvi­am uma carreira (*Duo Ouro Negro, Eleutério Sanches, Lilly Tchiumba, Teta Lando, Vum Vum). O crescente envolvimen­to com a luta anticoloni­al levou-o a exilar-se em Roterdão, na Holanda, em 1972, junto da comunidade africana, sobretudo cabo-verdiana, aí residente. Nesse ano gravou o seu primeiro fonograma, Bonga 72, acompanhad­o pelo ango-

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