CULPA DA MOTA-ENGIL?
Noutra frente, as autoridades de saúde registaram nas últimas semanas vários casos de infecção com o vírus Zika, passando o país a estar em vigilância epidemiológica. De acordo com fonte da Direcção Nacional de Saúde Pública, o primeiro caso de infecção com o Zika registou-se com um cidadão francês, que apresentou os primeiros sintomas no final de 2016. “O Governo francês notificou-nos e imediatamente iniciamos a vigilância epidemiológica”, indicou a mesma fonte. A 26 de Dezembro as autoridades de saúde registaram oficialmente o segundo caso de Zika no país, em Luanda, no município de Viana, precisou ainda. A Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou em Novembro que o vírus Zika, associado a graves anomalias cerebrais em recém-nascidos, deixou de ser uma “emergência de saúde pública” a nível mundial. A declaração de emergência sobre o vírus estava em vigor há nove meses e a organização vai agora apontar para uma abordagem a longo-prazo no combate ao Zika. O Zika é disseminado principalmente por picada de mosquito, mas o contágio também pode ocorrer através de relações sexuais. Para a maioria dos infectados, os sintomas são febre, urticárias e dores nas articulações. Desde 2015, pelo menos 73 países tinham sido afectados pelo vírus Zika, a maior parte dos quais na América Latina e Caraíbas, e cerca de 23 países anunciaram ter constatado casos de microcefalia ligados ao vírus. Duas vacinas contra o Zika estão actualmente a ser avaliadas, refere a OMS, sublinhando que e os resultados da primeira fase de ensaios clínicos já estão a ser examinados. Algumas, ou mesmo todas, estas epidemias “estão relacionada com o consumo de água imprópria e deficiente saneamento do meio”, indicou o Ministério da Saúde de Angola, em comunicado. De acordo com o insuspeito Boletim Oficial do regime (Jornal de Angola), a empresa MotaEngil está associada ao surgimento de um surto de febre-amarela em Luanda. Ao que parece, o mosquito responsável pela transmissão da doença vai deixar de se chamar “Aedes aegypti” passando, no caso de Angola, a designar-se “Mota-engil”. A Mota-engil não assume a “paternidade” da doença e nega “qualquer associação dos trabalhos realizados por esta empresa ao surgimento de um surto de febre-amarela”. Num editorial publicado a 25 de Dezembro, intitulado “Mensagem de harmonia expressa em dia de Natal”, o Boletim Oficial do MPLA (ou do regime, é a mesma coisa) associou o grupo de António Mota aos problemas de saúde pública registados em Luanda há um ano. “No ano de 2015, de grande significado para os angolanos, a empresa lusa Mota-engil foi contratada para reabilitar todos os passeios e ruas da cidade de Luanda. Durante as obras, a construtora vedou com alcatrão toda a rede de esgotos, sarjetas e valas de drenagem das ruas. Quando nesse ano as fortes chuvas chegaram, as ruas ficaram transformadas em rios e no sítio dos esgotos abriram-se crateras que ainda hoje se vêem. Com a acumulação de charcos e lixo, as condições de saúde na capital angolana degradaram-se. A cidade foi assolada por um surto de febre-amarela”, escreveu o director do Boletim Oficial, José Ribeiro. “Não entendemos as críticas que nos foram efectuadas no vosso editorial e muito menos entendemos qualquer associação dos trabalhos realizados por esta empresa ao surgimento de um surto de febre-amarela. Em nada contribuímos para este, tendo, bem pelo contrário, apoiado as várias medidas adoptadas por entidades oficiais para a sua erradicação”, afirma a Mota-engil. No uso do direito de resposta assinado pelo presidente do Conselho de Administração, Paulo Dias Pinheiro, a empresa diz não compreender nem vislumbrar o fundamento das afirmações. Recorda a Mota-engil que é uma sociedade de direito angolano, “e uma parte significativa do seu capital é detida por reputadas entidades nacionais”, além de que “tanto a sua administração como as várias direcções integram cidadãos angolanos e muitos dos seus quadros construíram a sua carreira na empresa”. Em 2015, acrescenta, “a Mota-engil realizou, em devido tempo, a primeira fase de recuperação das Ruas de Luanda, uma obra exigente do ponto de vista técnico pela intervenção em zona ur- bana. Esta recuperação decorreu, assinale-se, de forma colaborativa com a população luandense”. O grupo refere ainda que “com a concretização dos objectivos previstos para a primeira fase de recuperação das Ruas de Luanda, a Mota-engil Angola foi reconhecida como entidade seleccionada para a execução da segunda fase, intervindo em outras Ruas não incluídas na primeira intervenção. Naturalmente que o cumprimento dos requisitos de qualidade técnica na primeira fase foram determinantes para que tal pudesse acontecer”. “Reconhecendo o trabalho do Jornal de Angola, estamos certos que, reavaliados os termos com que a Mota-engil Angola foi tratada neste excerto do editorial, merecemos a devida reposição dos factos, em prol da verdade e da isenção de que somos todos defensores”, afirma ainda a empresa, que iniciou a sua actividade em Angola em 1946. A empresa esquece-se que a sua origem portuguesa é quanto basta para ser culpada de tudo. Em tempos recentes o próprio Presidente da República (nunca nominalmente eleito e no poder há 37 anos), José Eduardo dos Santos, considerou que a província de Luanda vive “graves problemas decorrentes da situação complicada herdada do colonialismo, mormente no domínio das infra-estruturas e saneamento básico”. Segundo o nosso Kim Jong-un, os 30 anos de guerra que o país viveu (por culpa dos portugueses, é claro) não permitiram a mobilização de recursos humanos e financeiros para satisfazer todas as expectativas das populações. É claro que, para além da Mota-engil, há muitos mais “culpados”, todos portugueses. Com todo este cenário, é bom de ver que Portugal para se redimir de todos os seus históricos erros em relação a Angola, deve rapidamente pedir desculpas às terças, quintas e sábados e pedir perdão às segundas, quartas e sextas. Aos domingos deve tomar a hóstia que tira todos os pecados, desde que esta esteja abençoada por sua majestade o “escolhido de Deus”, José Eduardo dos Santos.