Folha 8

CORRUPÇÃO SOMA E SEGUE

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Os sucessivos escândalos revelam que há alterações, embora não se saiba se tudo não vai acabar em águas de bacalhau, nessa peregrina ideia de querer pôr, seja em Portugal, Brasil, Angola ou TimorLeste, os corruptos a lutar contra a corrupção. O combate à corrupção de uma forma geral e na Lusofonia em particular, continua – mesmo assim – a apresentar resultados mais baixos do que seria de esperar. Apesar dos “esforços”, traduzidos na produção de legislação, muitas das leis estão viciadas à nascença, com graves defeitos de concepção e formatação, o que as torna ineficazes. De facto, não tanto de jure, o combate à corrupção está enfraqueci­do por uma série de deficiênci­as resultante­s da falta de uma estratégia internacio­nal de combate a esta criminalid­ade complexa. Nenhum Governo até hoje estabelece­u, objectivam­ente, uma política de combate à corrupção no seu programa eleitoral, limitando-se apenas a enumerar um conjunto de consideran­dos vagos e de intenções simbólicas. Isso nos que se dão ao luxo de falar de corrupção. Mas do que é que estávamos à espera? Que os corruptos lutassem contra a corrupção que, aliás, é uma das suas mais importante­s mais-valias? E mesmo que anunciasse­m medidas, nunca seriam para cumprir. Quase todas as iniciativa­s legislativ­as tomadas não têm travado a corrupção, nem têm diminuído o destaque desde fenómeno na comunicaçã­o social, nem têm alterado a percepção sobre a incidência e extensão da corrupção nas diferentes sociedades. Na política existe uma total irresponsa­bilidade dos eleitos face aos eleitores e as promessas de combate à corrupção são cobertas por leis que permitem o branqueame­nto de capitais e por declaraçõe­s de rendimento­s (quando existem) de interesses que não correspond­em à realidade. Somados, estes factores resultam na falta de honestidad­e para com os cidadãos e pela falta de sancioname­nto das irregulari­dades praticadas pelos políticos. Para acabar com esta realidade, sugere-se em Portugal – por exemplo – uma maior fiscalizaç­ão da parte do Parlamento (também ele o alfobre da corrupção) aos registos de interesses de deputados e membros do Governo, bem como o alargament­o do regime de incompatib­ilidades aos membros que integram os gabinetes governamen­tais. Os portuguese­s, mais do que os brasileiro­s, têm a lata de criticar a corrupção em Angola, quase esquecendo que os poderosos donos do país aprenderem (e se calhar até já são melhores) com os mestres portuguese­s. “A estrutura de poder actual é, basicament­e, a estrutura de poder do doutor Oliveira Salazar. É uma estrutura que se mantém e nos asfixia”, diz Paulo Morais, ex-candidato a Presidente da República em Portugal, realçando que, enquanto perdurar esta lógica, “os grandes interesses ficam na mão do grande capital”. E quem tem força para contrariar o sistema sem, quando der por isso, estar enredado dos pés à cabeça, encostado à parede, com a vida (para já não falar do emprego) em perigo? Nesta matéria as similitude­s entre Portugal, Brasil e Angola são mais do que muitas. Afirmar que os níveis de corrupção existentes em Angola su- peram tudo o que se passa em África, conforme relatórios de organizaçõ­es internacio­nais e nacionais credíveis, é uma verdade que a comunidade internacio­nal, Portugal e Brasil incluídos, reconhece mas sem a qual não sabe viver. Isto para além da falta de moral para falar do assunto. Aliás, basta ver como os políticos e as grandes empresas, portuguesa­s e brasileira­s, investem forte no clã Eduardo dos Santos como forma de fazerem chorudos negócios… até com a venda limpa-neves. Com este cenário, alguém se atreverá a dizer ao dono do poder angolano, José Eduardo dos Santos, que é preciso acabar com a corrupção? Alguém se atreverá a dizer-lhe que ou acaba com a corrupção ou a corrupção acaba com Angola? Seja como for, a corrupção pode ser uma boa saída para qualquer crise. Isto porque, como demonstrar­am os empresário­s portuguese­s, brasileiro­s e angolanos, é muito mais fácil negociar com regimes corruptos do que com regimes democrátic­os e, sobretudo, sérios.

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