O QUE SE MANTÉM TAL COMO O CHEFE MANDOU
Um dos pontos que não foi alterado é o relativo à obrigação dos órgãos da comunicação social publicarem as notas oficiais, apesar das muitas reclamações. Por imperativo legal, os órgãos de imprensa, privada e pública, agora têm de divulgar “gratuitamente”, com a “máxima urgência e o devido relevo” as notas oficiais que venham do presidente da República, da AN, e dos tribunais (artigo 16.º). A redacção do artigo não alterou comparado à proposta, nem sequer o número. E há ainda a respectiva multa para os órgãos incumpridores, que varia de 500 mil a um milhão e meio de Kwanzas, pelo que recorremos ao exemplo que o Folha 8 já havia dado em matéria anterior. Será assim: se a rádio Despertar estiver a emitir o seu programa dominical “Angola e o Mundo em sete dias”, que faz uma resenha dos factos ocorridos na semana, e José Eduardo nomear um dos filhos ou outra pessoa para qualquer cargo no mesmo instante, o programa terá de ser interrompido para ler o despacho de nomeação do presidente. Ao não interromper a grelha normal de programação, o ministério da Comunicação Social ou a “nova polícia dos jornalistas” (Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana – ERCA) vai aplicar a referida pena. E importa destacar que a rádio Despertar também não recebe qualquer incentivo do Estado, segundo o seu director Emanuel Malaquias. Quanto aos incentivos à comunicação social, houve uma ligeira mas importante alteração na redacção. Enquanto a proposta dizia que “as empresas de comunicação podem […] beneficiar de incentivos”, mera possibilidade e não uma obrigação, a lei da imprensa nova determina que “o Estado estabelece um sistema de incentivos de apoio aos órgãos de comunicação social de âmbito nacional e local […]”. Porém, importa referir que a redacção final, e respectivo número, é a mesma da lei de imprensa ora revogada de 2006 (lei n.º 7/06). Na vigência da anterior lei, os órgãos claramente críticos ao regime do MPLA nunca beneficiaram de incentivos, o Folha 8 ob- viamente incluído, nada garante que estes órgãos terão benefícios nos termos da nova lei. O que também se manteve é a proibição de divulgação de informações que se encontrem “cobertas por segredo de Estado, segredo de justiça ou outro e ainda quando a informação afectar, gravemente, a reserva de intimidade dos cidadãos, constitucionalmente protegida” (artigo 19.º da lei de Imprensa). Uma “autêntica armadilhada”, é o que esta disposição significa para os jornalistas, que estão agora legalmente impedidos de exercer jornalismo investigativo. Ismael Mateus, aquando de uma das conferências organizadas pelo MISA-Angola para discutir as leis agora publicadas, afirmou: “Quando quisermos fazer jornalismo investigativo, que é o jornalismo essencial hoje para a qualidade da democracia e para a boa governação, corremos o risco de que alguém entenda que aquela informação que nós buscamos é obtida de modo ilícita ou desleal. Estão a ameaçar os jornalistas dizendo: `se você tiver acesso aos documentos serás penalizado`”. Os processos judiciais se vão multiplicar-se contra jornalistas que ousarem divulgar “informações cobertas por segredos”, dos quais se destaca o também activista pelos Direitos Humanos Rafael Marques que tem investigado e divulgado esquemas de corrupção até da presidência.