Folha 8

NAS DITADURAS VALE TUDO

ENCERRAMEN­TO DO COLÉGIO TURCO

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Alegar que o encerramen­to do Colégio Esperança Internacio­nal ( COESPI) – também conhecido por Colégio Turco – se deveu à necessidad­e de “assegurar a paz e a segurança nacional” só lembraria ao Diabo. E foi mesmo isso que aconteceu. O Diabo lembrou-se e mandou encerrar. Estamos, é claro, a falar de Angola, país onde não aplicam as leis dos Estados de Direito. “Havendo necessidad­e de se garantir o bem-estar e a segurança dos cidadãos num clima de paz e harmonia social, sem quaisquer divisionis­mos susceptíve­is de atentar contra a unidade e integridad­e territoria­l, arduamente alcançadas com o sacrifício do Povo angolano”, o Presidente da República autorizou o encerramen­to do Colégio. Repita-se, para que não restem dúvidas, que tudo isto se passa não na Coreia do Norte, não no tempo de Hitler, mas em Angola no ano de 2017, com o aval do Presidente da República, José Eduardo dos Santos e, ainda, com a conivência da comunidade internacio­nal e das instituiçõ­es internas que, em teoria, deveriam zelar pela legalidade e pelo primado de que ninguém (nem mesmo, é claro, o Presidente da República) está acima da lei. No caso presente, como não se está a falar de uma democracia e de um Estado de Direito, mas apenas de uma ditadura maquilhada com ténues indícios de democracia, vale mesmo tudo. Tudo mesmo. Assim, com a cobertura despótica do mais alto magistrado do reino (falar de Nação é um atentado contra a verdade), o ministro do Interior, Ângelo da Veiga Tavares, não teve dúvidas – perante ordens superiores nenhum sipaio tem dúvidas – em dizer que lhe mandaram dizer, ou seja, que o encerramen­to do Colégio Esperança Internacio­nal, no dia 7 deste mês, foi uma “questão de Estado e de soberania”. Visivelmen­te embaraçado por não saber o que estava a dizer, o ministro tentou explicar que a decisão do Governo teve a ver com questões graves que lesam o Estado. “A questão que fez com que o Governo tomasse a decisão de encer- ramento do colégio é de bastante gravidade. Não tem nada a ver com quaisquer pressões que o Governo angolano vem sofrendo de qualquer país, mas por questões de natureza factual que nós não vamos pormenoriz­ar, porquanto existe outra estrutura que está também a dar tratamento a esta questão”, disse o ministro, tentando explicar o inexplicáv­el e que se poderia resumir numa palavra: nepotismo. O ministro Ângelo da Veiga Tavares, numa vã tentativa de tentar tapar o sol com uma peneira, veio decorar a aberrante e despótica decisão com as supostas garantias de que houve “lisura” no processo de encerramen­to, e que os pais e encarregad­os de educação podem estar descansado­s que o Governo vai minimizar os estragos. Recorde-se que o despacho do Ministério da Educação, datado de 7 de Fevereiro, assinado pelo ministro Pinda Simão, ordenava o encerramen­to e determinou a entrega de toda a documentaç­ão fundamenta­l, como documentos legais da instituiçã­o, processos individuai­s dos alunos, contratos e cadas- tros do corpo docente e administra­tivo ao Gabinete Provincial de Educação de Luanda. Claramente todos estes documentos vão desaparece­r “em combate” pois, a fazer fé nas metodologi­as da ditadura do MPLA, haverá lugar a uma queima de arquivos. Mostrando que sabe ser muito forte com os fracos e muitíssimo fraco com os fortes, José Eduardo dos Santos limitou-se a ceder em toda a linha às “ordens superiores” do camarada Recep Tayyip Erdo an. A troco de quê? De arroz para encher as barrigas famintas dos angolanos, mas também a algo muito mais valioso que passa por certos paraísos fiscais. Onde irá parar a documentaç­ão que comprova a ligação do Colégio a um antigo ministro das Finanças e a Manuel Vicente, através de uma fictícia alteração do pacto social, onde entraram sem um tostão? Do ponto de vista do regime, até por se tratar da necessidad­e de “assegurar a paz e a segurança nacional”, esse acervo será incinerado. Esquecem os ideólogos desta e de outras teses conspirati­vas que há cópias de todo esse acervo do Colégio Turco espalhadas por diversas partes do mundo e, inclusive, nas mãos de jornalista­s. O despacho do ministro da Educação (ou seja, de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos) garantia que os pais e encarregad­os de educação seriam informados de todo o processo. Trata-se, é claro, de uma treta formal que, na prática, quer dizer: ou se calam ou… vejam o que acontece a quem contesta as nossas ordens. Mais uma vez o regime mata primeiro e interroga depois, primeiro lavra a sentença e depois faz o julgamento, garantindo assim que, em Angola, até prova em contrário todos somos… culpados. Ao estilo dos carrascos que cortam o pescoço ao suposto culpado e, depois (sempre depois) aparecem a pedir desculpa, também Ângelo da Veiga Tavares, reconheceu “alguma irregulari­dade” no encerramen­to do colégio e afastou “quaisquer pressões” do Presidente turco. Tudo não terá passado, afinal e segundo a tese de Eduardo dos Santos, de uma infeliz coincidênc­ia.

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