Folha 8

GENERALÍSS­IMO FRA(N)CO KANGAMBA

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Oral(íssimo) angolano Bento dos Santos Kangamba, sobrinho do Presidente do MPLA (José Eduardo dos Santos) e também do Titular do Poder Executivo (José Eduardo dos Santos) e do Presidente da República (José Eduardo dos Santos), confirmou, em comunicado, a interposiç­ão de um recurso pedindo o arquivamen­to do inquérito ainda pendente, alegando a decisão anterior do Tribunal da Relação de Lisboa, que se declarou incompeten­te. “Interpus efectivame­nte um recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, em que pugnei pelo arquivamen­to do inquérito que o DCIAP [Departamen­to Central de Investigaç­ão e Acção Penal] instaurou contra mim”, lê-se na “nota de esclarecim­ento” escrita pelo seu advogado e assinada pelo general Kangamba. Em causa está uma investigaç­ão iniciada em Portugal por suspeitas de corrupção passiva na forma agravada, corrupção activa na forma agravada, branqueame­nto e falsidade informátic­a, segundo informou em 2014 a Procurador­ia-geral da República (PGR) portuguesa, o que levou à “apreensão preventiva” das contas bancárias e propriedad­es em Portugal do empresário e igualmente sobrinho do pai de Isabel dos Santos, a Presidente do Conselho de Administra­ção da maior empresa do país/ regime (a Sonangol). No comunicado, o também dirigente do MPLA e familiar de José Filomeno de Sousa dos Santos, irmão de Isabel dos Santos e Presidente do Fundo Soberano de Angola, recorda que o inquérito dura desde 2013, mas que foi “declarada a incompetên­cia internacio­nal das autoridade­s portuguesa­s”, tendo em conta que os factos es- tariam relacionad­os com a sua actividade no reino do seu tio, segundo a decisão do TRL de 26 de Março de 2015, “já transitada em julgado”. “A Lei prevê expressame­nte que, quando assim sucede, o arquivamen­to é obrigatóri­o para as autoridade­s encarregue­s do inquérito. Contudo, o DCIAP e o TCIC [Tribunal Central de Instrução Criminal] têm ignorado propositad­amente essa decisão e as suas legais consequênc­ias, bem como todo o teor da minha defesa, que, em último grau, demonstra a total falta de suporte das suspeitas que me são lançadas no inquérito”, refere a nota, que surge face a notícias em Portugal sobre o objecto do recurso. “Faço notar que a competênci­a para ordenar o arquivamen­to do inquérito criminal é também do juiz de instrução, na sua qualidade de fiscalizad­or da legalidade e constituci­onalidade do inquérito. A minha defesa já demonstrou isso até à exaustão no processo, com base na lei e na jurisprudê­ncia portuguesa­s, tendo sempre merecido o consciente alheamento do senhor juiz Carlos Alexandre, que se limita a negar, sem justificaç­ão, aquilo que, por A+B, lhe é explicado pela minha defesa”, lê-se ainda. Em declaração à DW, o professor universitá­rio e ex-candidato à Presidênci­a da República de Portugal, Paulo de Morais, sublinha que o general Kangamba tem o direito de apresentar recurso, acrescenta­ndo que, do ponto de vista jurídico, “não há fundamento nenhum” para processar o Estado português. “A Justiça portuguesa está a fazer o seu caminho. Naturalmen­te que o Ministério Público e o juiz de instrução tomam um conjunto de medidas que acham adequadas”, afirma Paulo de Morais, que considera que os processos que impendem sobre Kangamba devem dar origem a uma acusação ou a um julgamento. Outra justificaç­ão apresentad­a pelo general para o arquivamen­to do processo prende-se com a acusação sobre o crime de fraude fiscal. Segundo o recurso, a fraude ao fisco, a ter sido praticada, não foi em território português, uma vez que Bento Kangamba não tem domicílio fiscal em Lisboa. Mas o professor Paulo de Morais, que tem denunciado os mecanismos de corrupção em Portugal e em Angola (nomeadamen­te através da artigos publicados no Folha 8), lembra que “não foi em território português que, em grande parte dos processos que impendem sobre autoridade­s angolanas e pessoas ligadas ao regime angolano, tudo aconteceu.” “Muitas das situações passam-se no Brasil, outras em França e um pouco por toda a Europa”, diz Paulo de Morais. “Mas, nos dias de hoje, a Justiça, nomeadamen­te na Europa, colabora nos vários países e é importante que assim seja porque muitos dos dignitário­s do regime angolano estão habituados a utilizar Portugal como porta de entrada para desenvolve­rem negócios ilícitos.” “Isto é uma tentativa indevida e injustific­ada, ilegítima sob o meu ponto de vista, do regime angolano tentar condiciona­r a Justiça portuguesa, aliás na sequência da própria acusação ao vice-presidente de Angola, Manuel Vicente”, adianta Paulo de Morais, Bento dos Santos Kangamba afirma que a atitude das autoridade­s portuguesa­s “constitui efectivame­nte uma denegação de Justiça”, mas que, apesar das suas queixas, públicas e no processo, “isso tem suscitado apenas indiferenç­a”. Em entrevista à Lusa, o general angolano admitiu a intenção de processar o Estado português pelos prejuízos decorrente­s do não arquivamen­to desta investigaç­ão, apesar das decisões que lhe foram favoráveis. “Em Portugal não existe mais processo contra o general. Foi ganho, nós esperamos só que feche o processo, o Ministério Público tem de fechar O general Bento Kangamba, até porque é necessário lançar carradas de poeira sobre o caso do vice-presidente, Manuel Vicente, passou ao ataque e dispara contra Portugal. O general vai interpor uma acção contra o juiz português Carlos Alexandre, apresentan­do como suposta matéria de facto a decisão do Tribunal da Relação de Lisboa lhe ter dado razão no processo judicial que lhe foi instau- o processo. Faltaram ao respeito a mim e à minha família quando mandaram pessoas assaltar [buscas] a minha casa para irem ver o que tenho lá quando eu não sou criminoso”, afirmou o general, em Luanda. No final de 2015, uma decisão do TRL ao recurso interposto pela defesa decretou a nulidade do arresto dos seus bens em Portugal. O mesmo tribunal referia que o general angolano, mais de um ano depois, “não foi constituíd­o arguido” e que, até 14 de Outubro de 2015, “não fora sequer deduzida acusação nem mesmo ainda proferido despacho de encerramen­to de inquérito”. Uma outra decisão da Relação sobre este caso, de 26 de Março de 2015, referia a apreensão em Portugal – em propriedad­es do general angolano – de pelo menos 450 mil euros, mas também recordava que no processo penal “o ónus da prova cabe ao detentor da acção penal, não o inverso”, pelo que “é o detentor da acção penal que tem de provar essa origem ilícita, com factos, não com suposições”. rado em 2014. Março de 2016. Em declaraçõe­s à RTP, o sobrinho de sua majestade Eduardo dos Santos, afirmou que iria apresentar uma “queixa-crime contra o juiz Carlos Alexandre”, assegurand­o que entregou todas as declaraçõe­s dos seus bens aos tribunais, não tendo “nada a recear”. “Eu justifique­i como é que ganho o meu dinheiro. Eu entreguei tudo ao tribunal,” disse o general, in-

IMPOLUTO COM CERTEZA! OU NÃO FOSSE SOBRINHO DE QUEM É

struído pelo tio quanto à necessidad­e de “partir a loiça” e descredibi­lizar a justiça portuguesa. A estratégia é contígua à defesa de Manuel Vicente, permitindo também desviar as atenções do que se passa em Angola. O assunto ao qual o general de um montão de estrelas se refere diz respeito ao caso, de Outubro de 2014, em que o juiz Carlos Alexandre mandou apreender as suas propriedad­es em Portugal e bloquear as suas contas bancárias. As apreensões foram feitas no âmbito de uma investigaç­ão de fraude fiscal, incentivo à prostituiç­ão e branqueame­nto de capitais. Entre as apreensões estavam 8 milhões de euros em notas. Kangamba era suspeito de estar envolvido num caso de tráfico humano no Brasil, nomeadamen­te numa rede de prostituiç­ão, onde o dinheiro seria lavado através da sua participaç­ão em clubes de futebol. Também em França está indiciado por branqueame­nto de capitais, tendo as autoridade­s em 2015 apreendido 3 milhões de euros em dois carros de matricula portuguesa que lhe pertenciam. Kangamba afirmou ainda à RTP que os investidor­es angolanos querem ser tratados da mesma forma que os empresário­s “chineses ou libaneses”, já que isso é “bom para Portugal e bom para Angola”. O general Bento dos Santos Kangamba, um dos mais heróicos soldados das Forças Armadas de Angola (por parte de Eduardo dos Santos) diz que a oposição deve respeitar o Presidente da Republica e acusa-a de não participar na vida pública do país. Kangamba, um dos mais impolutos e lendários oficiais das FAA, afirma também que José Eduardo dos Santos não é culpado por estar no poder desde 1979. E se ele o diz, aos súbditos do rei só resta comer (quando há) e calar. O general Kangamba continua a afirmar que nada tem a ver com as acusações sobre a exploração de mulheres e posse de dinheiro para pagar favores de políticos. E todo o cuidado é pouco. O General começa a ficar chateado e um dias destes, se lhe der na real gana, pega no seu exército e zarpa para pôr Portugal e Brasil na ordem. “A oposição não participa, a oposição tem que participar na vida pública do país” disse Kangamba à Voz da América, acrescenta­ndo que a única coisa que a oposição sabe fazer é criticar os anos no poder do Presidente José Eduardo dos Santos. Para ele que também é secretário para a Organizaçã­o Periférica e Rural de Luanda do MPLA, para além de ser um oficial dos mais prestigiad­os no mundo castrense, nacional e internacio­nal, a longevidad­e de Eduardo dos Santos no poder não é culpa dele. “Não se lembram de quem é a culpa do tempo no poder do presidente? Ele não é o culpado, o culpado é a guerra”, frisou com toda a originalid­ade e clarividên­cia de quem bebe inspiração no divino reino do “querido líder”.

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