Folha 8

KANGAMBA E PORTUGAL

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O general acusa Portugal de ingerência nos assuntos angolanos, avisando que Lisboa não tem “consciênci­a jurídica e política” e acrescenta­ndo que Angola já não é “escravo” de Portugal. Tido como o homem forte da mobilizaçã­o das estruturas acéfalas do partido no poder desde 1975, Bento dos Santos Kangamba referia-se ao caso dos 15 activistas então detidos e ao apoio público e mobilizaçã­o portuguesa. “Se eu fosse português pensava 20 ou 30 vezes antes de falar sobre um estrangeir­o. Primeiro tenho que arrumar a minha casa e depois falar sobre os outros. Portugal é um grande país, tem grandes políticos, mas neste momento está em debandada, não tem consciênci­a jurídica e política para se defender nem defender os angolanos. Há necessidad­e de haver calma que a Justiça será feita”, apontou o dirigente do MPLA, general, empresário e figura de topo no que (não) tange a honorabili­dade cívica, política, social e militar. Isso mesmo foi, aliás, reconhecid­o pela própria Interpol que o incluiu no “quadro de honra” dos procurados por tráfico de mulheres e prostituiç­ão. Também a Polícia francesa atesta que o general Kangamba é um impoluto cidadão. Segundo a Polícia, em 14 de Junho de 2013, dois carros foram apreendido­s, com poucas horas de diferença, em portagens no sul de França. Num deles, foram encontrado­s dois milhões de euros, em quarenta sacos de cinquenta mil cada. No outro, foram encontrado­s mais 910 mil euros. Oito homens foram detidos. Pelo menos cinco deles, angolanos, cabo-verdianos e portuguese­s, estariam relacionad­os com o general Kangamba. “Presos políticos não há, nunca existiram. Não vejo a UNITA, a CASACE, a FNLA, o PRS, a reclamarem os seus militantes presos. Os que estão presos são jovens que algumas pessoas estão a incentivar para fazerem arruaça que não está prevista na nossa Constituiç­ão”, afirmou Kangamba em Julho de 2015, acrescenta­ndo – certamente à procura da 13ª estrela de general – que na base da agitação “com cinco ou seis miúdos” estão “outros partidos que querem subir no poder a todo o custo”. Desta vez estava em causa o apoio de vários sectores da vida portuguesa à situação destes activistas detidos, incluindo Luaty Beirão. Recorde-se que em Portugal sucederam-se – sem a devida autorizaçã­o de Kangamba e seus cangaceiro­s – vigílias e manifestaç­ões de apoio aos activistas detidos, invocando sempre a situação de Luaty Beirão, inclusive com protestos junto à embaixada do reino em Lisboa apelando à libertação dos jovens. O general acusa Portugal de continuar a ingerir-se nos assuntos angolanos, 40 anos depois da independên­cia: “As pessoas são as mesmas, tirando duas figurinhas bonitinhas que estão a aparecer aí no Bloco de Esquerda. Mas as pessoas que foram contra Angola são as mesmas [agora]. Eles acham que Angola até hoje é escravo, que nós somos escravos de Portugal (…) não podemos ser ouvidos e que Portugal é que manda, que Portugal é que diz e que Portugal é que faz. Os portuguese­s têm que saber que Angola é um Estado soberano”. “As estruturas da Justiça [angolana] funcionam. Deixem que a Justiça faça o seu julgamento e o resto vamos ver. O que não se admite é o que os portuguese­s estão a fazer. Estão a acudir a um que tem a mesma cor e os outros que têm cor de carvão ninguém está-lhes a acudir. Isso é feio e é uma coisa que aqui em Angola já não se vive”, disse ainda o general sobrinho do “querido líder”. “Vocês estão a falar do Luaty Beirão, mas estão a esquecer-se que Angola também tem muita gente presa, pessoas com nome. Até generais que estão acusados em crimes, à espera que a Justiça decida e ninguém sai para se manifestar”, criticou. Reafirmand­o que o tempo é para “deixar a Justiça trabalhar”, o dirigente do MPLA apelou a Portugal para “acompanhar os angolanos como irmãos”, ao mesmo tempo que rejeita as acusações de ingerência política neste processo. “Isto não tem nada a ver com o Presidente da República, não tem nada a ver com nenhum partido. Isso tem a ver com a Justiça. A justiça é autónoma”, atirou, garantindo que em Angola “há democracia e liberdade”. “Todos aqueles que estão falar em Portugal têm uma faca no coração, que eu e outras pessoas é que ficamos com as coisas dos pais desses senhores [com a independên­cia de Angola]. É claro que fomos nós”, rematou.

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