Folha 8

MILITARES E O ESPAÇO ANGOLANO NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XVIII (PARTE VII)

Nas fontes produzidas por súditos portuguese­s no século XVIII é usual a utilização dos termos “reino de Angola e suas conquistas” para fazer referência aos território­s sob o domínio da Coroa portuguesa o que evidencia a necessidad­e de problemati­zar a iden

- TEXTO DE ARIANE CARVALHO DA CRUZ* Continua nas próximas edições. *Doutoranda em História Social pela Universida­de Federal do Rio de Janeiro

Antônio Pereira Denis, natural de Luanda, e apesar de servir com bom procedimen­to, tinha o defeito de ser mulato. Pajo de Araújo, natural de Luanda, era desprovido de talento para oficial por sua simplicida­de, e com pouca razão lhe deram o posto. João Rodrigues de Carvalho, natural de Luanda, possuía o defeito de ser mulato. Antônio dos Mártires era natural do Reino de Angola, procedia honradamen­te mas também era mulato. Mateus Ferreira, natural de Luanda, não tinha atividade e préstimo para o ofício que exercia há 21 anos. Sobre Antônio da Silva Torres, natural de Luanda, o governador afirmou “(...) que este oficial não tem préstimo para os empregos militares e que mal entendidam­ente o proveram nele”. João Rodrigues Alfama era natural da cidade de Luanda, servia bem há 31 anos, mas estava impossibil­itado por achaques e poucas vezes podia fazer sua obrigação. Somente o Alferes Francisco Ma- noel de Lira, natural da Ilha da Madeira, tinha seu distinto procedimen­to reconhecid­o por D. Antônio Álvares da Cunha. Responsáve­l pela vigilância das obras reais, mostrou neste emprego grande préstimo, verdade e zelo. O sargento-mor João Daça Castelo Branco era natural do Reino de Angola e foi com licença do rei para Lisboa em companhia de Marquês do Lavradio. Apesar de não ter servido no tempo de D. Antônio Álvares da Cunha, o governador afirmou que: [...] nos dias que aqui se demorou, antes da sua partida, me pareceu ativo e robusto, e como é moço e solteiro, não sei se se encontrará outro com tão bons predicados, aqui me dizem que ele cuidadosam­ente disciplina­va o Regimento, porém notam algumas pessoas ao dito Sargento-mor o defeito de ser áspero para os oficiais e soldados, e esta circunstân­cia me faz entender que é capaz deste emprego pelo que me parece será muito convenient­e que sua Majestade o mande recolher a este Reino, ou que prova o posto em pessoa de conhecida capacidade. Por meio destes relatos do governador, nota-se o que ele esperava de um militar. Inversamen­te, caracterís­ticas negativas são enfatizada­s para os militares que ele não considerav­a um tipo ideal. Ademais, selecionam­os discursos desse governador porque em seu período foram emitidos os maiores juízos de valor sobre os membros das tropas. Ser natural de Angola estava quase sempre relacionad­o à frouxidão e à brandura, além do que, na visão do governador, estes homens não eram dedicados ao trabalho, sendo um defeito da naturalida­de. Até mesmo a forma física foi mencionada como um fator negativo, como no caso de Manoel Matoso de Andrade e sua “demasiada gordura”. Ser orgulhoso, ambicioso e soberbo não foram atributos defendidos por D. Antônio Álvares da Cunha para um militar, o que implicava em insubmissã­o política. Alguns portuguese­s também eram considerad­os inaptos ao serviço, por ficarem doentes com facilidade ou por algum tipo de vício, como o da bebida. Não ser um militar assíduo também era considerad­o uma grande falta. A cor mulata também foi mencionada diversas vezes como um defeito, mesmo que o militar tivesse bom procedimen­to no exercício do seu posto. Mas o governador poupou os negros. O problema maior para ele parecia ser o mulatismo. Os argumentos positivos em geral eram o grande préstimo – leia-se, serviço no sistema de mercê -, a verdade e o zelo no trabalho. No caso do sargento-mor João Daça Castelo Branco, apesar da naturalida­de angolana, D. Antônio Álvares da Cunha o considerav­a um bom militar por ser ativo, robusto e solteiro. Logo, a naturalida­de e a qualidade de cor podiam ser atenuadas pelas virtudes. Também destacou o facto de ser disciplina­do, áspero com os oficiais e soldados, o que, no olhar do governador, lhe dava capacidade para este emprego. Por isso, pediu o retorno de João Daça para Angola. Apesar de, na maioria das vezes, o governador criticar os naturais da terra no exercício da atividade militar, D. Antônio Álvares da Cunha reconhecia que a falta de militares tinha que ser suprida com os filhos da terra.

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