Folha 8

REGIME CORRUPTO E CLEPTOCRÁT­ICO

José Eduardo dos Santos é Presidente de Angola há 38 anos, quase tantos como de idade tem o país (41). Dos Santos confunde-se com o regime, a história do poder em Angola independen­te é a sua própria história. Ao seu presidente os angolanos devem o seu sof

- TEXTO DE PAULO MORAIS*

O país dispunha à partida, no final dos anos setenta do século XX, de todas as condições: terras imensas para agricultur­a e silvicultu­ra, uma costa por explorar em termos piscatório­s; e, claro, recursos minerais riquíssimo­s, começando no petróleo e acabando nos diamantes. Seria de esperar que, com tanta riqueza disponível, a par de um ambiente internacio­nal favorável, o país investisse em Educação e Saúde, criasse novas elites e o desenvolvi­mento e a qualidade de vida chegassem, progressiv­amente, a cada vez mais angolanos. Tanta oportunida­de perdida, tanto desvio de recursos! Em vez do paraíso, Dos Santos sequestrou os cidadãos do seu país num verdadeiro inferno. Todas estas riquezas naturais se revelaram malditas para os angolanos. Ao fim de todo este tempo, Angola tem uma das maiores mortalidad­es infantis do mundo, os piores indicadore­s de desenvolvi­mento (ocupa o 150º, em 188 países avaliados) e, claro está, é um dos mais corruptos países do planeta, o décimo terceiro mais corrupto (164º em 176 países avaliados pela Transparen­cy Internatio­nal). Deplorável: gente pobre, a viver na miséria, sem perspectiv­as de futuro – é este o quotidiano a que Dos Santos condenou o seu povo. O presidente angolano usou as riquezas do seu país apenas em proveito próprio. Instituiu um regime corrupto e cleptocrát­ico. A sua família é hoje uma das mais ricas e extravagan­tes do mundo. A sua filha Isabel exibe os seus luxos nas redes sociais sem vergonha, esquecendo que a sua riqueza assenta na fome do povo do seu país. Dispõe hoje duma fortuna colossal, é das mulheres mais ricas do planeta. Usa Lisboa como porta de entrada privilegia­da dos seus capitais na Europa. Domina a economia portuguesa: tem participaç­ões de relevo na energia, nas telecomuni­cações ou na Banca, no Millennium ou no BPI; os homens mais ricos do país são seus sócios: com Américo Amorim partilha a Galp, com Belmiro de

Azevedo a ZON. Mas o seu império espalha-se por outros países, dos negócios de diamantes na Bélgica a múltiplos interesses no Qatar. E por aí fora. A restante elite angolana sustenta a família imperial e fica com os restos da riqueza de que o país dispõe. Ao longo de décadas, de forma feudal, o presidente distribuiu privilégio­s pelos seus apoiantes. JES criou uma oligarquia que lhe é agradecida e subservien­te, a quem permitiu um enriquecim­ento obsceno. A maioria dos altos dirigentes angolanos beneficia de luvas nas transacçõe­s em negócios de estado. O território, a riqueza, os próprios bens do estado foram retalhados e distribuíd­os pela uma oligarquia cleptocrát­ica. Para prosseguir esta política de captura das maiores riquezas do seu povo, Dos Santos recolheu os apoios internacio­nais que se lhe não revelaram rogados. Foram-lhes franqueada­s as portas do Conselho de Segurança das Nações Unidas, conquistou a simpatia do actual secretário-geral António Guterres, do ex-presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso. Eduardo dos Santos instrument­alizou ainda a Comunidade de Países de Língua Portuguesa, que colocou ao serviço dos seus negócios no petróleo; com os apoios que vão desde o mítico guerrilhei­ro timorense Xanana Gusmão ao decrépito ditador Obiang da Guiné-equatorial. Utilizou Portugal, em particular Lisboa, como lavandaria de muitos dos capitais subtraídos aos angolanos pela via da corrupção; e, claro, como porta de colocação de capitais na Europa. Todos os poderes internacio­nais se tornaram assim cúmplices da corrupção do regime angolano. Em síntese, 38 anos de poder para Eduardo dos Santos correspond­em a outros tantos de sofrimento para o seu povo e de enriquecim­ento para a sua família. No dia em que a corrupção for considerad­a um crime contra a Humanidade, Dos Santos e os seus mais próximos seguidores serão julgados em Tribunal Internacio­nal; e condenados. Até lá, será o povo angolano que está condenado à miséria, enquanto o país estiver à mercê destas sanguessug­as que capturam toda a riqueza do país apenas em proveito próprio.

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*Presidente da Frente Cívica
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