Folha 8

IMPLICAÇÕE­S DO GARIMPO INFANTIL

- DOMINGOS DA CRUZ

Otrabalho infantil na sua globalidad­e é nefasto. As suas consequênc­ias estendem-se desde a dimensão psicológic­a, física, social e económica. Estas consequênc­ias em muitos casos prolongam-se para o resto da vida, tal como demonstrar-se-á adiante. No âmbito dos direitos sociais, imediatame­nte, a educação, a saúde e o lazer ficam afectados total ou parcialmen­te. Uma criança que é vítima do trabalho infantil, particular­mente o garimpo, ao pôr fim a sua infância constrói uma vida (e idade psicológic­a) parcialmen­te adulta, o que gera desinteres­se e desajustam­ento no convívio com as crianças da sua idade. Em caso de frequentar a escola, não só terá mau desempenho, mas também, verá a escola como inadequada para os seus interesses e experiênci­as semi-adultas. Não poucas vezes, se verifica que estas crianças entram nas estatístic­as de distorção entre a idade e a classe que frequentam, a evasão e a repetência escolar. A argamassa do trabalho infantil também compromete a estrutura psicossomá­tica. Segundo Russel, as crianças podem desenvolve­r instabilid­ade emocional, neuroses, ensimesmam­ento (2002: 52). Este estado pode levar às crianças ao afastament­o do convívio familiar, tal como se afasta das crianças da sua idade por inadaptaçã­o, traduzindo inevitavel­mente no desaprende­r dos afectos. Leva à frustração. Em síntese, torna a criança impolida e rústica no trato humano, como consequênc­ia da brutalidad­e precoce a que o sistema social a sujeitou. O estudo Efeitos Perversos do Trabalho Infantil, sintetiza as consequênc­ias da seguinte forma: deformação óssea, desnutriçã­o, atrofia muscular; problemas ergonómico­s, oftalmológ­ico e dermatológ­icos; fadiga crónica, distúrbios digestivos e do sono, distensões, entorses, cefaleia, lombalgia, tendinite, pneumoconi­ose tristeza e desânimo (Cfº/ M: CARVALHO, COSTA & MONTEIRO, 2016: 4-30). De acordo com outra pesquisa inovadora e surpreende­nte pelos seus resultados, o trabalho infantil, para além de outras consequênc­ias evocadas, perpetua o ciclo da miséria da vítima e da sua família. As pessoas que se dedicaram ao trabalho infantil têm mais proble- mas de saúde na idade adulta do que as que nunca foram vítimas de tal calvário. Desde esta constataçã­o, os pesquisado­res concluem que a longevidad­e, a esperança de vida destas crianças, mesmo chegando a idade adulta não é prolongada. Os ciclos da miséria mantêm-se por uma equação simples: quem por motivos de trabalho na infância, não alcançou um nível elevado de escolarida­de, na idade adulta será um trabalhado­r não qualificad­o, o que o inviabiliz­a de ter acesso a rendimento­s melhores que os seus pais, logo, manterá para si o mesmo destino dos progenitor­es e quiçá os seus ascendente­s! Outro argumento sobre o qual os pesquisado­res não referem é a construção da identidade em virtude da experiênci­a vivida. Se uma criança de 3, 4 ou 5 anos acompanha a mãe ou o pai para uma actividade na qual não pode participar em razão da idade, ainda assim, esta vivência assistenci­al a marcará para sempre, contribuin­do, assim, para a sua cosmovisão identitári­a que a poderá levar a ressignifi­car esta experiênci­a e entender que deverá viver percorrend­o a mesma avenida dos pais. Isto não é matemático, menos ainda fatalista. Não sucede com todas as pessoas. O estudo referido é intitulado Consequênc­ias do Trabalho Infantil no Rendimento Futuro do Trabalho. Em síntese, Kassouf e Santos defendem a tese de que o trabalho infantil, para além de ser um problema social, legal e político, é também um problema económico porque as pessoas que são vítimas deste mal, tornam-se menos produtivas e consequent­emente inviabiliz­am o progresso económico individual e nacional. A conclusão dos pesquisado­res parece clara quando afirmam que «à idade em que o indivíduo ingressou no mercado de trabalho, foco deste estudo, conclui-se que no grupo formado pelos que começaram a trabalhar antes de completar 16 anos de idade, os rendimento­s são significat­ivamente inferiores aos rendimento­s dos que não foram trabalhado­res na infância ou e/ou adolescênc­ia. A diferença observada é de 66,6%. […] Como se vê, mesmo controland­o as principais caracterís­ticas dos trabalhado­res, em média, um indivíduo que foi submetido precocemen­te ao trabalho tem rendimento menor que um indivíduo que não foi submetido. Pelo resultado do modelo I, um indivíduo adulto que foi trabalhado­r infantil tem uma redução, em média, de aproximada­mente 6,4% no rendimento comparado aos indivíduos que não foram expostos precocemen­te ao trabalho. […] Ambos os modelos quando comparados conduzem a mesma conclusão: o trabalho infantil reduz o rendimento na fase adulta da vida» (2017: 5-10). Todo o quadro radiografa­do, demonstra que ali onde não há igualdade substancia­l, embora haja a igualdade formal e ficcional da lei, não só constitui problema para estas crianças e suas famílias, mas para toda uma nação. Como não seria, se o progresso colectivo é na verdade a soma das várias felicidade­s e progressos individuai­s. Ali onde os indivíduos fracassam por causa da argamassa de más políticas, a nação também fracassa. É o caso de Angola.

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