IMPLICAÇÕES DO GARIMPO INFANTIL
Otrabalho infantil na sua globalidade é nefasto. As suas consequências estendem-se desde a dimensão psicológica, física, social e económica. Estas consequências em muitos casos prolongam-se para o resto da vida, tal como demonstrar-se-á adiante. No âmbito dos direitos sociais, imediatamente, a educação, a saúde e o lazer ficam afectados total ou parcialmente. Uma criança que é vítima do trabalho infantil, particularmente o garimpo, ao pôr fim a sua infância constrói uma vida (e idade psicológica) parcialmente adulta, o que gera desinteresse e desajustamento no convívio com as crianças da sua idade. Em caso de frequentar a escola, não só terá mau desempenho, mas também, verá a escola como inadequada para os seus interesses e experiências semi-adultas. Não poucas vezes, se verifica que estas crianças entram nas estatísticas de distorção entre a idade e a classe que frequentam, a evasão e a repetência escolar. A argamassa do trabalho infantil também compromete a estrutura psicossomática. Segundo Russel, as crianças podem desenvolver instabilidade emocional, neuroses, ensimesmamento (2002: 52). Este estado pode levar às crianças ao afastamento do convívio familiar, tal como se afasta das crianças da sua idade por inadaptação, traduzindo inevitavelmente no desaprender dos afectos. Leva à frustração. Em síntese, torna a criança impolida e rústica no trato humano, como consequência da brutalidade precoce a que o sistema social a sujeitou. O estudo Efeitos Perversos do Trabalho Infantil, sintetiza as consequências da seguinte forma: deformação óssea, desnutrição, atrofia muscular; problemas ergonómicos, oftalmológico e dermatológicos; fadiga crónica, distúrbios digestivos e do sono, distensões, entorses, cefaleia, lombalgia, tendinite, pneumoconiose tristeza e desânimo (Cfº/ M: CARVALHO, COSTA & MONTEIRO, 2016: 4-30). De acordo com outra pesquisa inovadora e surpreendente pelos seus resultados, o trabalho infantil, para além de outras consequências evocadas, perpetua o ciclo da miséria da vítima e da sua família. As pessoas que se dedicaram ao trabalho infantil têm mais proble- mas de saúde na idade adulta do que as que nunca foram vítimas de tal calvário. Desde esta constatação, os pesquisadores concluem que a longevidade, a esperança de vida destas crianças, mesmo chegando a idade adulta não é prolongada. Os ciclos da miséria mantêm-se por uma equação simples: quem por motivos de trabalho na infância, não alcançou um nível elevado de escolaridade, na idade adulta será um trabalhador não qualificado, o que o inviabiliza de ter acesso a rendimentos melhores que os seus pais, logo, manterá para si o mesmo destino dos progenitores e quiçá os seus ascendentes! Outro argumento sobre o qual os pesquisadores não referem é a construção da identidade em virtude da experiência vivida. Se uma criança de 3, 4 ou 5 anos acompanha a mãe ou o pai para uma actividade na qual não pode participar em razão da idade, ainda assim, esta vivência assistencial a marcará para sempre, contribuindo, assim, para a sua cosmovisão identitária que a poderá levar a ressignificar esta experiência e entender que deverá viver percorrendo a mesma avenida dos pais. Isto não é matemático, menos ainda fatalista. Não sucede com todas as pessoas. O estudo referido é intitulado Consequências do Trabalho Infantil no Rendimento Futuro do Trabalho. Em síntese, Kassouf e Santos defendem a tese de que o trabalho infantil, para além de ser um problema social, legal e político, é também um problema económico porque as pessoas que são vítimas deste mal, tornam-se menos produtivas e consequentemente inviabilizam o progresso económico individual e nacional. A conclusão dos pesquisadores parece clara quando afirmam que «à idade em que o indivíduo ingressou no mercado de trabalho, foco deste estudo, conclui-se que no grupo formado pelos que começaram a trabalhar antes de completar 16 anos de idade, os rendimentos são significativamente inferiores aos rendimentos dos que não foram trabalhadores na infância ou e/ou adolescência. A diferença observada é de 66,6%. […] Como se vê, mesmo controlando as principais características dos trabalhadores, em média, um indivíduo que foi submetido precocemente ao trabalho tem rendimento menor que um indivíduo que não foi submetido. Pelo resultado do modelo I, um indivíduo adulto que foi trabalhador infantil tem uma redução, em média, de aproximadamente 6,4% no rendimento comparado aos indivíduos que não foram expostos precocemente ao trabalho. […] Ambos os modelos quando comparados conduzem a mesma conclusão: o trabalho infantil reduz o rendimento na fase adulta da vida» (2017: 5-10). Todo o quadro radiografado, demonstra que ali onde não há igualdade substancial, embora haja a igualdade formal e ficcional da lei, não só constitui problema para estas crianças e suas famílias, mas para toda uma nação. Como não seria, se o progresso colectivo é na verdade a soma das várias felicidades e progressos individuais. Ali onde os indivíduos fracassam por causa da argamassa de más políticas, a nação também fracassa. É o caso de Angola.