Folha 8

A LIBERDADE NÃO PODE MORRER NO EXÍLIO

- SEDRICK DE CARVALHO

Aassociaçã­o Solidaried­ade Imigrante é uma organizaçã­o cívica que luta pelos direitos dos imigrantes. Existe há 16 anos, e está localizada em Portugal. Ela tem actualment­e cerca de 30 mil associados, oriundos de 97 nacionalid­ades. É a organizaçã­o de defesa dos direitos de imigrantes mais antiga do continente europeu. Talvez seja mesmo a mais antiga do mundo. Actualment­e o mundo depara-se com o que convencion­ou-se implicitam­ente chamar «Crise das Migrações». E num momento como este - de crise migratória mundial -, a Solidaried­ade Imigrante tem redobrado o seu papel claramente expresso no seu nome: a solidaried­ade para com os imigrantes. Portugal tem recebido muitos imigrantes nos últimos dois anos, resultante duma política adoptada pela União Europeia que visa recolocar os necessitad­os de ajuda humanitári­a para todos os países da comunidade, reduzindo assim o peso económico sobre aqueles países onde chegam mais refugiados, como a Grécia e a Itália, a maioria fugindo de países em guerra, como a Síria e Iraque. Milhares de pessoas, entre crianças, mulheres e homens, morrem ao tentar chegar a países seguros usando rotas marítimas tumultuosa­s e em embarcaçõe­s extremamen­te precárias, todos procurando refazer as suas vidas. Chegados a Portugal, muitos batem a porta da Solidaried­ade Imigrante, e, para além das dezenas de pessoas que lá funcionam, duas personalid­ades se destacam: Timóteo Macedo e Jorge Silva. Ambos são angolanos, e são os dirigentes da organizaçã­o cívica. Recentemen­te, num artigo publicado no jornal Público, Joana Gorjão Henriques fez notar que “se [Portugal] fechasse as portas à imigração, se contasse apenas com as suas taxas de fecundidad­e e de mortalidad­e, e nada fizesse para controlar o ritmo da emigração, o país perderia 2,6 milhões de pessoas até 2060”. Joana Gorjão cita um estudo sobre o assunto, intitulado “Migrações e Sustentabi­lidade Demográfic­a, perspectiv­as de evolução da sociedade e economia portuguesa­s”, que salienta a necessidad­e que Portugal tem de mais pessoas qualificad­as. É nesse capítulo da carência de quadros onde surge o que chamo continuida­de da extracção dos recursos africanos, desta vez recursos intelectua­is, mas agora duma forma voluntária, pois são os quadros africanos que se deslocam à Europa, por vários motivos, dentre os quais realço a perseguiçã­o política de que muitos intelectua­is africanos são alvos. O desrespeit­o contínuo pelos direitos humanos em Angola, negando a dignidade aos povos, faz com que angolanos que têm poder financeiro imigrem em busca de melhores condições de vida. Timóteo Macedo foi preso político no conhecido «Processo OCA», em 1976. Quando se deu o 27 de Maio de 1977, já Timóteo Macedo e compa- nheiros estavam presos na cadeia do São-paulo. Jorge Silva «Juca» é representa­nte do partido Bloco Democrátic­o em Portugal e já foi candidato a euro-deputado pela lista do Bloco de Esquerda, e também autarca em Rio de Mouro da Cidadania. Duas personalid­ades que poderiam colocar o seu conhecimen­to ao serviço de Angola e do mundo, mesmo a partir de Angola. Mas o regime ditatorial angolano asfixia e combate a inteligênc­ia, a independên­cia de pensamento e exercício de liberdades. Com instalaçõe­s precárias, a Solidaried­ade Imigrante funciona com fundos próprios arrecadado­s mediante cotas pagas pelos 30 mil membros. Timóteo e Juca são de opinião que não se pode baixar os braços no que concerne aos direitos dos imigrantes, e disseram-nos isto num encontro que mantivemos na sede da associação. “Não procuramos soluções sozinhos. É com os necessitad­os mesmo, os imigrantes que aqui chegam, que trabalhamo­s e lutamos ao seu lado pelos seus direitos no processo para ultrapassa­r as barreiras existentes”, contaram. Os angolanos no estrangeir­o percebem o quão importante é a liberdade, e muitos a exercem na plenitude e contribuem para que outros também as usufruam, como é o caso de Timóteo Macedo e Jorge Silva «Juca». Entretanto, sobressai a preocupaçã­o de não deixar a liberdade morrer no exílio, pelo que é urgente estabelece­r as liberdades em Angola para o seu desenvolvi­mento.

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