A INDIGNAÇÃO DA FILHA DE NETO
A deputada Irene Neto em discussão do ante projecto lei, não deixou de manifestar a sua indignação, face a mais uma lei que visa apenas cobrir um homem, quando o direito impõe, que as leis sejam gerais e abstratas e não para protecção de um homem, principalmente, se estivermos em democracia. Mas acompanhemos uma vez mais o que retrata Irene Neto, filha do primeiro presidente de Angola, na versão MPLA: “1. Começaria pela Constituição da República de Angola, na alínea e) do número 2, do Artigo 135 sobre o (Conselho da República): consta que os antigos Presidentes da República são membros do Conselho da República e, no número 3 deste Artigo, gozam das imunidades conferidas aos deputados da Assembleia Nacional. Por esta razão o legislador obriga o ex -Presidente da República a fazer parte do Conselho da República. No entanto, não está explícito se o ex -Presidente da República pode renunciar ao cargo de membro deste Conselho, como é possível, por exemplo, em Espanha e na Itália. Não está tão pouco claro se são remunerados enquanto membros do Conselho da República. 2. O Capítulo I, Artigo 1º, no ponto 2, sobre (trata- mento protocolar, imunidades e segurança), refere que a designação, após a cessação de funções, pode ser de “Presidente da República Emérito”. Primeiro quero saber quando pode ser e quando o não pode. É ou não é? Esta denominação não está prevista na Constituição da República de Angola. Gostaria de obter também uma clarificação quanto ao conceito e título de emérito, mais usado como título honorífico de pessoas que se destacaram na academia e religião. Todos os ex -Presidentes da República serão eméritos? Na academia, esse grau não é automático. Um professor para se tornar emérito, necessitará de uma deliberação da Faculdade, à qual se seguirá um decreto do Reitor. Um presidente que se torna ex-presidente, não é o mesmo que um presidente sem o “ex” e que se consagra como um “Presidente da República emérito”. Isto é, retém o direito de vantagens por aquilo que é e não por aquilo que foi. Resultariam daí vantagens «instituídas» e não «concedidas», nomeadamente nas precedências? Sobre as precedências: espero que se definam de uma vez por todas estas questões do Protocolo de Estado para evitar as gentilezas cruéis, falta de respeito e de educação das atabalhoadas precedências protocolares nas cerimónias formais ou solenes. Por exemplo, qual será a precedência prevista entre as figuras institucionais do Presidente Fundador da República e do Presidente da República emérito? O Presidente Fundador é o primeiro dos primeiros e sempre o será. As pessoas têm de se adaptar à alternância que é um facto normal das democracias e tem de haver comedimento para não se criarem tensões e crispações desnecessárias com o Presidente da República em funções. 3. No Artigo 2º, sobre o (Foro especial) para efeitos criminais ou responsabilidade civil do ex-presidente da República: que foro é este no Tribunal Supremo? 4. No Artigo 3º sobre (Pensão): quero enfatizar que não estamos, ou não devemos estar, a legislar e assentar privilégios para uma só pessoa em particular. A lei será para todos os futuros ex-presidentes da República. À medida que se consolide a nossa democracia, os candidatos à Presidência da República tornar-se-ão cada vez mais jovens e ficarão menos mandatos consecutivos no poder. Significa que se hoje se inscreve um critério vitalício em alguma alínea, isto se deve a idade que o nosso actual Presidente da República possui. Mas imaginemos um futuro com uma democracia dinâmica em que se cumpram apenas dois mandatos, teremos ex-presidentes da República ainda jovens, podendo continuar a trabalhar. Não faz assim sentido que eles recebam 90% do vencimento do último ano do mandato de forma vitalícia. Em Espanha, por exemplo, essa pensão mensal vitalícia é apenas reservada a pessoas com mais de 65 anos de idade, na ordem dos 60%. 5. No Artigo 4º: (Pensão por funções de PrimeiraDama). Em termos comparativos, à primeira Primeira-dama era atribuída mensalmente uma pensão equivalente ao salário de um membro do Governo e um subsídio irrisório, entre 2mil e 2mil e 500 dólares, anualmente, para despesas diversas, incluindo férias. No caso actual, sabemos que as finanças não serão problema para os futuros ex-pr e ex-primeira-dama. Será justo beneficiarem ainda assim destas regalias? Ninguém pode dizer que a família presidencial actual é pobre, podendo, por essa razão, atender às suas necessidades pessoais e políticas com a dignidade e o decoro que correspondam às altas funções exercidas. O mesmo não se poderá dizer da família do primeiro Presidente da República em que nem o seu cônjuge nem os seus descendentes alguma vez beneficiaram de lugares em administrações na banca, na mineração ou de qualquer outro recurso do país pelo qual tanto se bateu e conseguiu levar à independência, de forma vitoriosa. Estas generosas benesses, serviriam para evitar que ex -Presidentes da República (em idade relativamente jovem) caíssem em tentações de ir trabalhar para empresas privadas, tendo de respeitar uma cláusula de incompatibilidade durante 5 anos após a cessação de funções. 6. Sobre o Artigo 12º (Deveres do PR e do Vice-pr após cessação de funções): impõe-se um limite de 5 anos até poderem exercer cargos em entidades privadas mas não se esclarecem as incompatibilidades seguintes, se as houver: a) Entre o auferimento de uma pensão vitalícia e o exercício de um cargo público, a participação em conselhos de administração de empresas públicas ou privadas, ou o desempenho de cargos públicos. 7. Não existe um manual de instruções para abandonar o poder mas a psicologia política da sucessão das lideranças recomenda contentar tanto os ex-dirigentes quanto não onerar as finanças públicas. Essa remuneração dos ex-presidentes da República, os meios pessoais colocados à sua disposição, a dotação para o seu escritório e as suas memórias, devem ser publicadas anualmente e constar do OGE. Haverá prestação de contas sobre estas dotações de forma transparente ou será um exercício opaco em função de um tratamento diferenciado? 8. Dúvidas adicionais: a) Renúncia e revogação dos direitos e prerrogativas dos ex-presidentes: os direitos e prerrogativas reconhecidos pela presente lei serão revogáveis, total ou parcialmente, por resolução do Plenário da Assembleia Nacional, adoptado por maioria dos seus membros, sempre que se considere que já não concorrem as condições de honorabilidade necessárias à pessoa de um ex -Presidente? Ou serão intocáveis numa blindagem constitucional? b) Insígnias de Presidente da República emérito: os presidentes eméritos terão algum símbolo, bandeira, estandarte, distintivo? c) Transporte aéreo: o Presidente da República emérito terá direito ao transporte aéreo gratuito na companhia aérea estatal de bandeira ou terá outro tipo de avião? Esperemos que esta lei venha ajudar a que os futuros antigos Presidentes da República se possam adaptar, sem desenvolver o síndrome dos ex-presidentes que é de se considerarem imprescindíveis. Que acresçam em vez de retirar valor ao país, sempre com sentido de Estado e com os novos poderes que surgirem.”