QUEM NA REALIDADE MANDA?
E, aqui, a porca torce o rabo, principalmente, se atendermos ter sido o despacho presidencial exarado no dia 19 de Junho, mas já no dia 27 do mesmo mês, Manuel Vicente se encontrava no país, onde procedeu à centésima (ou será milésima), reinauguração da Barragem de Kambambe. E o que assistimos, foi à presença dos dois vice-presidentes, agora, “de jure”, numa mesma actividade. Daí as perguntas: a) Qual a razão objectiva de um despacho para uma vacatura de tão pouco tempo, cujo titular não tem funções executivas? b) Se na qualidade de auxiliar, segundo o art.º 131.º CRA (Constituição da República de Angola), foram-lhe atribuídas, apenas a coordenação de pelouros sociais (Promoção da Mulher; Juventude e Desportos; Cultura; Antigos Combatentes e Veteranos de Guerra), não tendo nenhum grande dossier, sob sua alçada, este despacho, não esconde outros propósitos? A resposta (à luz do poder presidencial absoluto) é óbvia: Manuel Hélder Vieira Dias Júnior é, há muito, o putativo Presidente da República, na sombra e, o real vicePresidente, cabendo a imagem decorativa, do título, a Manuel Vicente, o homem que na Sonangol ajudou de forma hercúlea a família de Eduardo dos Santos a tornar-se muito mais do que milionária. Isso porque se o actual Presidente da República tiver de viajar, de novo, para o Reino de Espanha, em Barcelona, onde faz, regularmente, controlo clínico, teremos na condução do país de forma efectiva, Manuel Helder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, como Titular do Poder Executivo e Manuel Vicente, quando deveria ser catapultado (na ausência do Presidente deveria ser o Vice a assumir o car- go), continuará ao arrepio do art.º 132.º CRA, como vice-presidente. Ademais, a evocação, no despacho presidencial, da alínea d) do artigo 120.º e do n.º 5 do artigo 125.º , ambos da CRA (Constituição da República de Angola) é um atestado de menoridade à maioria dos angolanos, porquanto, em nenhum momento estes conferem a discricionariedade do Presidente da República indicar, aleatoriamente, um vice presidente, como agora o fez. Mas vamos à interpretação da al.ª d) do art.º 120.º (Competência como titular do Poder Executivo) COMPETE AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA, ENQUANTO TITULAR DO PODER EXECUTIVO “dirigir os serviços e a actividade da administração directa do Estado, civil e militar, superintender a administração indirecta e exercer a tutela sobre a administração autónoma”. Ora, como se vê, este artigo não dá latitude, nem competência ao Presidente da República, sub-reptícia que seja, de nomear ou indicar algum membro do órgão governativo, para substituir o vice-presidente e ou o presidente. Assim sendo, estamos (mais uma vez) diante de uma séria e grosseira violação a Constituição, logo, o Despacho Presidencial, está ferido de ilegalidade. Isso porque, “dirigir os serviços e a actividade da administração directa do Estado civil e militar”, não se pode confundir com nomeação de um militar, no caso, general, por ser chefe da Casa de Segurança da Presidência da República. Mas o despacho diz socorrer-se ainda de outro articulado, o n.º 5 do art.º 125.º CRA (FORMA DOS ACTOS) “Revestem a forma de despacho presidencial os actos administrativos do Presidente da República”. Também aqui nem a interpretação mais rasca de um aprendiz de direito, pode levá-lo a aferir legitimidade no Despacho Presidencial 147/17 de 19 de Junho, ao nomear interinamente Manuel Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa”, que poderá perdurar nessa condição e coabitar com Manuel Vicente. O acto administrativo cujas entranhas repousa no Código Civil, em vigor, não confere latitude cega ao agente público, no caso Presidente da República, de agir em colisão com a lei e a Constituição, sob pena do acto ser nulo ou anulável, por andar em sentido contrário à aplicação da norma. Será normal com tantos juristas e constitucionalistas no seu gabinete, José Eduardo dos Santos cometer este tipo de inconstitucionalidade? Seguramente, não! Mas urge saber, se, na realidade, não existem já grupos “marginais”, à sucessão, a proceder, clandestinamente, à transferência dos grandes dossiers do Estado, aproveitando-se do estado de saúde do presidente da República, para desvirtuar os órgãos do Estado, dificultando qualquer transferência ou transição pacífica do poder.