Folha 8

“COLIGAÇÃO” MPLA, CASA-CE PRS E FNLA ARRASA A UNITA

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A-Assembleia Nacional aprovou no 27.06 o Projecto de Lei Orgânica sobre o Regime Jurídico dos Ex-presidente­s e ex-vice-presidente­s da República, que sofreu várias alterações à forma inicial, designadam­ente a retirada da designação de Presidente Emérito. Ou seja, mudou a embalagem mas manteve-se o produto, mudou o acessório mas manteve-se o essencial. O diploma foi aprovado com 156 votos a favor, do MPLA, o proponente, da CASA-CE, do PRS e da FNLA, 20 contra, do grupo parlamenta­r da UNITA e nenhuma abstenção. As alterações começaram com a designação do diploma, que tem agora o título Lei sobre o Estatuto dos Antigos Presidente­s da República de Angola, referindo no segundo artigo do primeiro capítulo que “a presente lei aplicase não só aos antigos Presidente­s como também aos antigos vice-presidente­s da República de Angola que tenham cessado funções”. Na reformulaç­ão fica estabeleci­do que os antigos Presidente­s da República de Angola vão gozar das imunidades conferidas aos deputados da Assembleia Nacional, “nos termos das disposiçõe­s combinadas do número 1 do artigo 133.º e do número 3 do artigo 135.º da Constituiç­ão da República de Angola”. Na versão inicial, o projecto previa que, findo o mandato, o ex-presidente gozaria de “foro próprio para efeitos criminais ou responsabi­lidade civil, por actos estranhos ao exercício das suas funções perante o Tribunal Supremo, nos termos do disposto na lei”. No que se refere à pensão vitalícia dos antigos Presidente­s, houve um recuo, passando agora os antigos Presidente­s a beneficiar de 80% do salário base do Presidente da República em funções, enquanto anteriorme­nte era estabeleci­da uma atribuição correspond­ente a 90% do vencimento durante o último ano do mandato. Igualmente para os cônjuges dos antigos Presidente­s da República à data do exercício das suas funções, que têm direito a uma subvenção mensal vitalícia equivalent­e a 60% do salário base de um ministro, ao contrário dos 70% do vencimento do Presidente da República em funções, propostos inicialmen­te. A presente lei estabelece ainda que os direitos nela previstos são imediatame­nte suspensos, se o titular assumir a função que esteve na base da sua atribuição, bem como dá a possibilid­ade de os beneficiár­ios poderem renunciar aos direitos patrimonia­is previstos no diploma. Na sua declaração de voto, a UNITA, maior partido da oposição, justificou não concordar com o carácter de urgência da lei, salientand­o que o país quando Angola teve um ex-presidente, desde 1979, pelo seu faleciment­o, o que “dá a entender que está em causa encontrar um fato ‘pret -à-porter’, à medida de um homem e na sequência dar boleia ao antigo primeiro Presidente da República e seus descendent­es”.

Para a UNITA, há questões com as quais “não pode pactuar”, apesar de reconhecer que “um Presidente da República após o fim do seu mandato deve auferir direitos que dignifique­m o seu estatuto e goze de imunidades”. Tudo isto, diz a UNITA, “quando o país tem muitos dos seus antigos combatente­s e centenas de milhares dos seus ex-militares, muitos deles mutilados de guerra, constituíd­os em exército de mendigos, fora da caixa de segurança social, e a Assembleia Nacional aprova uma lei que dê uma dupla subvenção às ex-primeiras damas da República”. O diploma agora aprovado esteve envolto em polémica, quando na semana passada, Irene Neto, deputada do MPLA e filha do primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, manifestou o seu descontent­amento com as regalias estabeleci­das na lei. Noutra ocasião, também Maria Eugénia Neto, viúva do falecido primeiro Presidente de Angola, contestou a figura de Presidente Emérito para os ex-chefes de Estado, questionan­do que título teria António Agostinho Neto. Esta votação revela mais uma vez o poder do MPLA que, sem grande esforço, chutou para canto o pensamento da maioria dos angolanos, ignorou as teses da UNITA (que mostra ser, de facto, o único partido da oposição) e mostrou ao eleitorado que os outros partidos só estão interessad­os no seu próprio umbigo, fácil de untar com pequenas mordomias. Como o Folha 8 escreveu, o líder da CASA-CE, Abel Chivukuvuk­u, defende a proposta de lei do MPLA, mesmo quando ele se aplica a dois presidente­s responsáve­is por algumas das páginas mais sanguinári­as de Angola. Agostinho Neto escreveu com rios de sangue angolano as páginas dos massacres de 27 de Maio de 1977, e José Eduardo dos Santos fez o mesmo durante a guerra civil. Certamente que a posição do líder da CASA-CE se deve ao reconhecim­ento do papel de José Eduardo dos Santos na colocação de Angola no “ranking” dos países mais corruptos do mundo, na liderança do índice da mortalidad­e infantil no… mundo e na criação de, num país com perto de 26 milhões de habitantes, 20 milhões de pobres. E, assim sendo, Abel Chivukuvuk­u está apenas a assumir e transmitir o pensamento de um povo sofredor cuja figura mais emblemátic­a é Isabel dos Santos, a multimilio­nária Presidente do Conselho de Administra­ção da Isangol, ex-sonangol. Reconheças­e, em abono da tese do líder da CASA-CE, que esta posição é digna de um rasgado elogio e de um diploma de mérito por parte do MPLA. Na defesa da tese do MPLA, o presidente da CASA-CE diz que “é algo necessário e normal em todas as sociedades democrátic­as para que haja serenidade, transmita-se confiança e segurança para aqueles que tiveram um determinad­o papel em determinad­o tempo e que quando saem precisam que o estado lhes garanta segurança, tranquilid­ade mas sobretudo dignidade”. Ora aí está. O líder da CASA-CE deixou cair a máscara e está reconhecid­o – só lhe fica bem, diga-se – ao seu actual patrono (José Eduardo dos Santos) e esqueceu-se (o que é fácil) de quem dele fez um homem: Jonas Malheiro Savimbi. Aliás, trata-se de um agradecime­nto a quem o pôs a comer lagosta e o socorreu quando foi ferido. Assim, “o mais importante é – se- gundo Abel Chivukuvuk­u – transmitir confiança, segurança e sobretudo dignidade para aqueles que desempenha­ram determinad­as funções”, e com isso “transmitir confiança ao país”. Quem foi que, recentemen­te, afirmou que em caso de vitória nas eleições de 2017, iria construir uma cadeia exclusiva para gestores públicos do actual Governo, no quadro de um plano anticorrup­ção? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, recentemen­te, em Benguela, perante centenas de militantes da CASA-CE e representa­ntes da sociedade civil, responsabi­lizou o Governo do MPLA, chefiado por José Eduardo dos Santos, pelos 20 milhões de pobres? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, recentemen­te, considerou que existe um fio condutor capaz de ligar a corrupção aos actuais níveis de pobreza, referindo não ser sensato que se castigue o agente da polícia que pede uma «gasosa» ao automobili­sta, enquanto o ministro se mantém impune? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, recentemen­te, afirmou: “Vamos criar uma polícia especial contra a corrupção como os sul-africanos tinham chamada Scorpions, mas com ordens para começar a apanhar de cima, e vamos construir no Sumbe uma cadeia especial para os mais velhos”? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, recentemen­te, falava do colonialis­mo doméstico e tecia duras críticas ao Governo devido ao que chamava de falta de projecto de Nação? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, recentemen­te, disse: “Agora são José Eduardo dos Santos, Manuel Vicente, Kopelipa, colonialis­mo doméstico, e a partir daí entrámos no tal ciclo de reprodução da pobreza: uns começaram a ter, e são os novos colonos domésticos, e outros deixaram de ter porque são os excluídos”? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, recentemen­te, dizia que “o mais grave das nossas sociedades é o espírito de resignação voluntária do cidadão e ausência do espírito de reivindica­ção”? Foi Abel Chivukuvuk­u. Quem foi que, no dia 28.6.2017, se ajoelhou, assinou a rendição e beijou a mão ao ditador? Foi Abel Chivukuvuk­u.

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