Folha 8

VIOLÊNCIA JUDICIAL

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O poder judicial em Angola não é independen­te. E o problema não reside apenas no facto de os juízes serem nomeados pelo presidente da República, mas sobretudo pela falta de independên­cia de consciênci­a. Nota-se o efeito da educação que é usada como forma de manutenção do status quo. Acima referimos a chacina causada pela Febre Amarela, e agora importa frisar que o ministro da Saúde na ocasião não sofreu quaisquer punição nem sequer investigaç­ão pelo desvio de milhões de dólares – há quem diga que ter sido afastado do cargo seja o castigo, pelo que discordo. Foram indiciados uns funcionári­os de baixo escalão, e assim foi encerrado o caso. O juiz que teve a tarefa de condenar-nos, contra todas as evidências de que em momento algum tentamos fazer um golpe de Estado e que inclusive tínhamos já contactos com a NATO para atacar o país, tam- bém não foi responsabi­lizado judicialme­nte. Ou seja, fomos violentado­s judicialme­nte e não há responsabi­lização por esta violência. Pela violência física e psicológic­a também não. Pelo contrário, são homenagead­os. Por ex.: quase a totalidade dos agentes envolvidos na prisão dos 17 presos políticos foram graduados e nomeados para cargos de chefias ao nível da investigaç­ão criminal. O procurador que teve a tarefa de preparar o processo foi promovido para procurador-geral adjunto da República directamen­te pelo presidente da República. Assim chegamos ao ponto fulcral desta abordagem: a violência institucio­nal em Angola. O presidente da República, enquanto instituiçã­o, é o principal promotor da violência no país, e recompensa quem assim procede. Da morte de Jonas Savimbi às actuais mortes e detenções, a mão institucio­nal está presente. Quando, nas vestes de presidente do MPLA, José Eduardo dos Santos relembra a chacina protagoniz­ada pelo próprio partido em Maio de 1977, avisou-nos que não teria dificuldad­es em reeditar a matança. Ameaçou no dia 2 de Julho de 2015. Na altura estava numa das várias celas solitárias por onde passei, e quando ouvi o longínquo som do noticiário saído dum televisor algures na caserna do bloco B da cadeia Calomboloc­a, aí tive a certeza de que não sairia tão cedo, se não fosse morto, tal como aconteceu exactament­e em 1977 depois dum discurso onde Agostinho Neto dizia que não podiam perder tempo com julgamento­s. Portanto, a frase Roma locuta, causa finita – tradução literal: tendo falado Roma, acabou a questão – seria perfeitame­nte o lema do governo angolano, como escreveu Filipe Luís na revista Visão, edição n.º 1273. Actualment­e fala- se em crise financeira como a razão para o estado calamitoso em que o país se encontra, mas Angola vive várias crises, e há muito tempo, e a económica apenas veio destapar todas elas para quem não as via por estarem cegados pelo brilho do petróleo e diamantes. Não há guerra em Angola, mas também não há paz!

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