Folha 8

EU NÃO VOTO EM JOÃO LOURENÇO

- Fonte: observador.pt JOSÉ MILHAZES

Acreditar na justiça social em Angola é o mesmo que acreditar no “conto de fadas” sobre a Isabelinha, que começou a vida a vender ovos e hoje é a mulher mais rica de África. Desde há uns tempos para cá que recebo com grande regularida­de na minha caixa de correio electrónic­o propaganda do MPLA para votar no seu candidato a Presidente de Angola: João Lourenço. Não sei qual será a razão destes esforços da propaganda do MPLA para conquistar o meu voto para o seu candidato no escrutínio de 23 de Agosto, pois não fui, nem sou cidadão angolano, nem conheço antepassad­os meus que por aí tenham passado. O que me liga a esse país lusófono são alguns amigos e os livros que escrevi sobre as relações entre a União Soviética/rússia e sobre o “golpe de Nito Alves”. Mas porque a máquina propagandí­stica do MPLA tanto insiste, eu respondo que, mesmo que tivesse direito a voto em Angola, João Lourenço não seria de longe o meu favorito, não obstante as grandes promessas que faz. O panfleto electrónic­o do MPLA apresenta dez razões para votar no seu candidato, mas todas elas são falsas e não lembrariam sequer ao diabo citá-las. A primeira reza que “O MPLA é o partido de todos os angolanos”, o que aconteceu durante muito tempo à custa de uma guerra civil cruel e do apoio externo. Hoje, se quisermos assistir a eleições livres, deverão haver angolanos que não se revejam nessa palavra de ordem, com “forte cheiro” a marxismo-leninismo. Vamos aceitar como verdadeira a segunda razão: “O MPLA é o partido histórico e vitorioso”. Não se pode negar que essa força política combateu contra o colonialis­mo português, venceu na guerra civil contra a UNITA e irá vencer as eleições porque se trata de um escrutínio que ficará longe das razões prometidas a seguir. No ponto 5 do dito panfleto, afirma-se que “O MPLA é o partido da governação moderna e transparen­te”, o que é desmentido por factos e números. De que transparên­cia se pode falar num dos países mais corruptos do mundo, onde a “gasosa” é uma “instituiçã­o nacional”? De que transparên­cia se pode falar num país onde se proíbe a transmissã­o de algumas televisões portuguesa­s só porque os dirigentes do MPLA não gostam das notícias? Dizer que “O MPLA é o Partido do desenvolvi­mento económico e social” e “o Partido da cidadania e da justiça social” nem sequer é tentar “esconder o Sol com uma peneira”, mas recorrer à demagogia mais barata. De que desenvolvi­mento económico e social se pode falar quando apenas uma pequena elite vive “à grande e à francesa” e a maioria do povo vive na pior das misérias? Ou será que a maioria dos angolanos já têm meios para comprar propriedad­es e vistos gold em Portugal? Acreditar na justiça social em Angola é o mesmo que acreditar no “conto de fa- das” sobre a Isabelinha, que começou a vida a vender ovos e hoje é a mulher mais rica de África. Quanto à cidadania, vejo-a entre aqueles angolanos que lutam contra o poder absoluto e a repressão do MPLA, por eleições verdadeira­mente transparen­tes e democrátic­as: Luaty Beirão e outros companheir­os seus, forças políticas da oposição que participam nas eleições para mudar o país mesmo em condições desiguais. Por isso, também não acredito que “O MPLA é o partido do futuro previsível e seguro” e que é “O Partido do candidato certo, na hora certa, para o voto certo”. A não ser que o general João Lourenço, que estudou na Academia Político-Militar Lenine de Moscovo, seja mais competente e dialogante do que aquele que o nomeou para seu sucessor, o Presidente José Eduardo dos Santos, que também estudou na União Soviética. Talvez a história da derrocada deste país, cuja subsistênc­ia se devia à exportação de gás e petróleo, tenha ensinado alguma coisa ao candidato do MPLA. Dito isto, quero sublinhar que o destino está nas mãos dos angolanos e só a eles compete eleger os seus futuros dirigentes. Escrevi este texto apenas porque fui convidado a votar em João Lourenço e, não podendo fazê-lo pelas razões acima apresentad­as, decidi manifestar a minha opinião. P.S. Poderão acusar-me de eu estar a imiscuir-me nos assuntos internos de Angola e recomendar-me a olhar para o meu país. Esse argumento está gasto.

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