NEGOCIAR A PAZ? QUE TIPO DE PAZ?
Nem todo mundo que usa a palavra “paz” quer a paz com liberdade e justiça. A submissão à opressão cruel e aquiescência passiva a «ditaduras eleitorais» cruéis que cometeram atrocidades em centenas de milhares de pessoas não é a verdadeira paz. Hitler muitas vezes pediu paz, com o que ele queria dizer submissão à sua vontade. A paz das tiranias é muitas vezes nada mais que a paz da prisão ou do sepulcro. A paz da fome. Paz da miséria. Paz da corrupção. Paz de todas as provações e da negação absoluta da dignidade humana. Há outros perigos. Os negociadores bem-intencionados, às vezes confundem os objectivos das negociações e o processo de negociação em si. Além disso, negociadores democráticos ou especialistas em negociação, estrangeiros aceites para ajudar nas negociações podem num único golpe fornecer às ditaduras, a legitimidade interna e internacional que havia sido negado anteriormente devido à sua tomada do Estado, violações à lei, dos direitos humanos e brutalidades variadas. Sem aquela legitimidade desesperadamente necessária, as ditaduras não podem continuar a governar indefinidamente. Expoentes da paz não devem lhes dar legitimidade. Não preciso argumentar muito porque os angolanos sabem o que significa a paz que mata mais do que o furacão. Paz em que os homens não têm vontade porque toda vontade se dilui na vontade universal da tirania. Manter a esperança real em alta. Sim, nós podemos! É racional e humano esmorecer por causa da travessia no deserto para o qual a ditadura lançou-nos há décadas. Mas existem razões reais e fundadas para ter esperança no nascimento e construção de uma outra civilização assente na dignidade da mulher e do homem todo e todo homem e mulher. Ditaduras não são permanentes. As pessoas que vivem sob ditaduras não precisam permanecer fracas, e os ditadores não precisam ser autorizados a permanecer fortes por tempo indeterminado. Aristóteles observou há muito tempo que “[. . .] a oligarquia e a tirania têm vida mais curta do que qualquer outra Constituição. [. . .] Todas juntas, as tiranias não duraram muito tempo.” As ditaduras modernas também são vulneráveis. Seus pontos fracos podem ser agravados e o poder pode ser desintegrado. A história recente, mostra a vulnerabilidade das ditaduras e revela que elas podem se desintegrar em curto espaço de tempo: enquanto dez anos 1980‐ 1990 foram necessários para derrubar a ditadura comunista na Polónia; na Alemanha Oriental e na Tchecoslováquia em 1989 ela ocorreu dentro de semanas. Em El Salvador e na Guatemala em 1944, as lutas contra os ditadores militares brutais entrincheirados exigiram cerca de duas semanas cada. O poderoso regime militar do Xá do Irão foi solapado em alguns meses. A ditadura de Marcos nas Filipinas caiu diante do poder do povo dentro de algumas semanas em 1986: o governo dos Estados Unidos abandonou rapidamente o presidente Marcos quando a força da oposição tornou-se operante. O golpe da linha dura tentado na União Soviética em Agosto de 1991 foi bloqueado em dias pelo desafio político. Depois disso, muitas nações dominadas por longo tempo, em poucos dias, semanas, meses recuperaram suas independências. O antigo preconceito de que meios violentos sempre funcionam rapidamente e meios não violentos exigem mais tempo claramente não é válido. Embora muito tempo possa ser necessário para a evolução da situação e da sociedade subjacentes, a luta efectiva contra uma ditadura, por vezes, ocorre de forma relativamente rápida através de luta não-violenta.
Excerto do meu livro, «Ferramentas para destruir o ditador». 2015, p.2930.