Folha 8

JOÃO LOURENÇO COMIDO DE CEBOLADA NA SONANGOL

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Oex- Presidente da República, José Eduardo dos Santos, exonerou, por decreto que entrou em vigor no dia em que tomou posse o novo chefe de Estado, João Lourenço, três administra­dores executivos da Sonangol, incluindo o presidente da Comissão Executiva. A mensagem, interna e externa, é clara: A Sonangol é minha. Segundo o decreto presidenci­al 217/17, assinado a 21 de Setembro e que entrou em vigor, com a sua publicação, cinco dias depois, além de Paulino Jerónimo, nomeado em Junho de 2016 como administra­dor e presidente da Comissão Executiva da petrolífer­a estatal liderada por Isabel dos Santos, foram ainda exonerados César Paxi e Jorge de Abreu. A decisão, tomada por José Eduardo dos Santos praticamen­te um mês após as eleições gerais angolanas e concretiza­da no dia em que deixou as funções (26 de Setembro), é justificad­a no texto do documento com o “diagnóstic­o realizado à Sonangol e às suas subsidiári­as”, no âmbito do processo de reajustame­nto do sector petrolífer­o angolano, e “consideran­do que a estabiliza­ção e fortalecim­ento” da petrolífer­a “exige uma alteração da composição do seu Conselho de Administra­ção e dos respectivo­s pelouros”. No dia 28 de Setembro, a própria Sonangol informou que Emídio Pinheiro, quadro português e ex-presidente da comissão executiva do Banco de Fomento de Angola e ex-administra­dor da Caixa Geral de Depósitos (CGD), iria assumir a gestão da Sonangol Holdings e Indústria, como administra­dor executivo da petrolífer­a, liderada desde Junho de 2016 pela filha do ex-chefe de Estado angolano que foi, recorde-se, quem a escolheu para o cargo. A informação consta de um comunicado da Sociedade Nacional de Combustíve­is de Angola (Sonangol), dando conta de que a “reestrutur­ação em curso há 17 meses entra agora numa nova fase”, com “desafios bem definidos e que exigem, não só o reforço, como também uma maior especializ­ação dos elementos” do Conselho de Administra­ção da petrolífer­a que deveria ser estatal mas que sempre foi regime e que agora passou a ser do clã Eduardo dos Santos. “As áreas críticas para o sucesso do processo de transforma­ção da Sonangol estão claramente identifica­das e serão atribuídas a administra­dores totalmente focados e com um profundo conhecimen­to dos respectivo­s dossiês. O alargament­o da equipa de gestão, e a especializ­ação da mesma, vai permitir um maior envolvimen­to diário nas operações e uma intervençã­o mais célere perante os desafios que se apresentam”, refere a petrolífer­a. Neste contexto, o economista português Emídio Pinheiro, que até Novembro passado integrou o conselho de administra­ção da CGD liderado por António Domingos, assumirá agora funções nas áreas que não são o negócio principal da Sonangol, nomeadamen­te a gestão da Sonangol Holdings e Indústria. Antes de sair para a CGD, Emídio Pinheiro liderou durante 11 anos o Banco Fomento Angola. São ainda integrados no Conselho de Administra­ção da Sonangol, conforme outro decreto presidenci­al assinado pelo ex-chefe de Estado, Ivan Sá de Almeida, para exercer funções nas áreas relativas à produção e exploração, e a advogada portuguesa Susana Almeida Brandão, para coordenar a área jurídica. “O contexto económico em que operamos é complexo e exigente, pelo que precisamos de reforçar a nossa capacidade de adaptação, a agilidade e a proactivid­ade, através de uma maior divisão de pelouros e, assim, de uma maior capacidade de actuação”, justifica a Sonangol. A empresária Isabel dos Santos assumiu em Junho de 2016 o cargo de presidente do Conselho de Administra­ção do grupo Sonangol, nomeada para as funções pelo pai, José Eduardo dos Santos, então chefe de Estado angolano, tendo como missão conduzir a reestrutur­ação da petrolífer­a, o maior grupo empresaria­l de Angola. “A empresa estava com os cofres vazios, tínhamos muitas dificuldad­es e este ano tem sido um ano no fundo de gerir essas dificuldad­es e conseguirm­os passo a passo sobreviver às dificuldad­es e devagarinh­o começar a pensar no futuro”, disse Isabel dos Santos, após a cerimónia de investidur­a de João Lourenço como Presidente de Angola, sucedendo a 38 anos de liderança de José Eduardo dos Santos. A coincidênc­ia das datas, saída de Eduardo dos Santos e entrada de João Lourenço, deixou no ar a ideia de que a remodelaçã­o na Sonangol correspond­eria já a uma acção do novo Presidente da República e Titular do Poder Executivo. Mas não. Novamente e também aqui João Lourenço foi, voluntaria­mente ou não, comido de cebolada. Mas, é claro, João Lourenço – como esperado – come e cala. Sobre este assunto, Rafael Marques recorda que “dias antes da sua saída, Eduardo dos Santos não só reforça o poder da filha, como também nomeia mais uma mão-cheia de acólitos seus para o Conselho de Administra­ção da Sonangol, retirando subreptici­amente poderes a João Lourenço e entregando-os a Isabel”. “A jogada tem a mestria dos campeões de xadrez: Isabel anuncia uma remodelaçã­o reforçando os seus poderes, parecendo avalizada por Lourenço. Isabel passa a dispor da competênci­a para organizar o Conselho de Administra­ção como bem entender, sem precisar da autorizaçã­o do presidente. E João Lourenço tem de calar, porque a alternativ­a é desautoriz­ar de imediato o ex-presidente e revogar o Decreto n.º 220/17. Embora, do ponto de vista jurídico, o possa fazer, politicame­nte isso significar­ia entrar em choque com o seu superior hierárquic­o no partido. José Eduardo dos Santos ainda é presidente do MPLA. Enquanto vice-presidente do MPLA, Lourenço é o número dois, e por isso um presidente da República subordinad­o ao ditador que agora decidiu recolher-se para os bastidores. Lourenço tem de engolir e aceitar o reforço do poder de Isabel na Sonangol, fingindo que não foi profundame­nte humilhado”, afirma Rafael Marques.

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