Folha 8

IGREJA IRÁ DAR VOZ A QUEM A NÃO TEM?

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Em 2011 o MPLA celebrou um acordo com a Igreja Católica para que esta o apoiasse na campanha eleitoral de 2012. Pelo andar da missa tudo leva a crer que, em 2017, esse acordo continuou válido. Terá Igreja Católica tentado agradar ao “seu” deus (José Eduardo dos Santos/mpla) e ao nosso “diabo” (João Lourenço/ MPLA)? Da parte do partido no poder agenciou o acordo de 2011 Manuel Vicente, na então condição de PCA da Sonangol a mando de Eduardo dos Santos, ao passo que da parte da Igreja estiveram alguns bispos do regime, Dom Damião Franklim e a Filomeno Vieira Dias de Cabinda, com orientaçõe­s do militante cardeal Alexandre do Nascimento. Que a hierarquia da Igreja Católica de Angola continuará a querer agradar ao Poder, aviltando os seus mais sublimes fundamen- tos de luta pela verdade e do espírito de missão, que deveria ser o de dar voz a quem a não tem, não é novidade. Recorde-se também que no final de 2011, D. José Manuel Imbamba disse que os padres que teimavam em defender os interesses dos cabindas não foram afastados por razões políticas, mas por questões disciplina­res, nomeadamen­te por não manterem uma boa relação pastoral com o bispo D. Filomeno Vieira Dias. D. José Manuel Imbamba sabia que estava a mentir. Foi grave. Ou estava calado ou, se para tanto tivesse coragem, falaria das pressões do regime angolano sobre os prelados que – tal como aprendeu o arcebispo de Saurimo – apenas querem dar voz a quem a não tem. Aliás, o mesmo se passou com D. Filomeno Vieira Dias que só de vez em quando, raramente, qua- se nunca, se ia lembrando do “rebanho” que tinha a seu cargo como bispo de Cabinda. Quando instado a comentar as detenções no estrangeir­o de activistas dos direitos humanos de Cabinda, a mando do regime de Luanda ou – quem sabe? – de qualquer força extraterre­stre, como a de Agostinho Chicaia, o prelado católico não quis (pudera!) desagradar aos donos do poder em Angola e refugiou-se no argumento de que não comentava um caso que tinha ocorrido fora do país. Consta, contudo, que D. Filomeno Viera Dias se mostrou preocupado com aquilo que chamou de incapacida­de de diálogo entre as pessoas. Pois é. Todos que ousem pensar de forma diferente do MPLA são culpados até prova em contrário. Antes, a 3 de Maio de 2010, D. Filomeno Vieira Dias dissera que a liber- dade de informar e de ser informado é um direito fundamenta­l que não deve ser subalterni­zado. “A liberdade de imprensa é um direito ligado às liberdades fundamenta­is do homem”, sublinhou na altura o prelado, falando a propósito do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, proclamado pela UNESCO em 1993. É um direito mas, note-se, apenas nos Estados de Direito, coisa que Angola não é de facto, embora de jure o queira parecer. Aliás, nenhum Estado de Direito viola os direitos humanos de forma tão soez e execrável como faz o regime angolano. “Quando celebramos esse dia, devemos olhar para o seguinte: que é uma grande responsabi­lidade informar e informar sempre com verdade,” destacou D. Filomeno Vieira Dias, certamente pedindo de imediato perdão a Deus por ele próprio não con- tar a verdade toda. E se uma das principais tarefas dos Jornalista­s é dar voz a quem a não tem, também a Igreja Católica tem a mesma missão devendo, aliás, ser ela a dar o exemplo. O que não acontece. Frei João Domingos, por exemplo, afirmou numa homilia em Setembro de 2009, em Angola, que Jesus viveu ao lado do seu povo, encarnando todo o seu sofrimento e dor. E acrescento­u que os nossos políticos e governante­s só estão preocupado­s com os seus interesses, das suas famílias e dos seus mais próximos. “Não nos podemos calar mesmo que nos custe a vida”, disse Frei João Domingos, acrescenta­ndo “que muitos governante­s que têm grandes carros, numerosas amantes, muita riqueza roubada ao povo, são aparenteme­nte reluzentes mas estão podres por dentro”.

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