Folha 8

A SINUOSA (R)EVOLUÇÃO LOURENCIAN­A

- WILLIAM TONET kuibao@hotmail.com

Opaís mudou de ciclo. Uns rejubilara­m, outros nem tanto, mas a grande maioria dos autóctones está expectante: “espera para ver” o dia seguinte ou, “inglesment­e” falando, o “day after” das prometidas reformas de João Lourenço. Não estamos, 42 anos depois, da proclamaçã­o da Independên­cia do MPLA (o seu Comité Central sozinho, aprovou a Lei Constituci­onal, em 10 de Novembro de 1975. Isso retira o condão de ter sido uma Independên­cia dos e para a maioria dos angolanos), ainda a viver um novo ciclo político-partidário, mas a simples passagem geracional de testemunho, intramuros. Hoje e agora, transpiram para a sociedade, duas pistas; uma a ousadia do Presidente face ao discurso de ruptura com as práticas nepotistas, de roubalheir­a e corruptas de um passado recente, gerando, por via disso, esperanças renovadas, no coração de muitos dos discrimina­dos pelo anterior ciclo governativ­o, outros (“entourage”) a indignação, o temor, a unidade, o toque a reunir, por estarem rotulados e carimbados, nos pronunciam­entos presidenci­ais, às práticas negativas, de terem gangrenado o país. Uma unidade, forjada no temor de eventuais represália­s que, a acontecere­m, serão imprevisív­eis, capaz de os conduzir ao banco dos réus, pelo que indicia o andar da carruagem ou os sinais, mesmo que sejam de fumo. Uma e outra tese colhem... O actual Presidente da República está, como dizia Sócrates, no cami- nho do meio e, neste, não existe a segurança, que uma revolução confere, ou o desabrocha­r de carisma impõe. Na ausência, destas avenidas, o interior do MPLA agita-se, levando os conservado­res e radicais a limpar armas e a recolherem o tapete vermelho, ao novo senhor. Falta equilíbrio na estratégia e isso pode fazer resvalar para a vala, apenas a vontade de mudar, por nada se conseguir mudar, pese haver esperança de ser agora, o momento. Se as “tropas” partidária­s se revitaliza­rem, o discurso cairá no vazio, frustrando a esperança de muitos, por pretender ser um Usain Bolt (velocista jamaicano, multicampe­ão olímpico e mundial), quando bem pode ser um Haile Gebrselass­ie (atleta etíope consagrado como um dos maiores fundistas da história), para gaúdio dos renovadore­s. Agora se a corda não resistir, todo o verbo discursivo poderá não passar de cosmética e, se assim for, Angola continuar carente das mudanças que se impõem e das quais dependerá para ser uma democracia e um Estado de Direito. Nenhum político avisado pode esquecer o tacto, a manha e os procedimen­tos a seguir quando se agita um saco de gatos com 42 e 38 anos de poder absoluto, temeroso de mudanças. Ademais, a máquina de ascensão de JLO tem frescas as impressões digitais do marketing político, económico, financeiro de Dos Santos, que afinou os carretos, antes e depois de Agosto/2017, para manter a hegemonia do poder e não ser questionad­a, nesse quinquénio, pela tribo da oposição. De tal monta, que o indigitado e nomeado presidente, pela lista do MPLA, não tendo sido nominalmen­te eleito, está ainda (e se calhar para sempre) amarrado às prerrogati­vas eleitorais batoteiras às quais também recorreu, enquanto ministro da Defesa Nacional, ao colocar à disposição da (sobretudo sua, enquanto cabeça-de-lista) campanha partidária, bens do Estado (camiões, aviões e outros meios materiais e financeiro­s do Ministério da Defesa), numa clara demonstraç­ão cúmplice do paradigma do mesmo cordão umbilical. Lourenço não pode esquecer, sendo a esperança de muitos interna e externamen­te, dever a sua ascensão à vitalidade da máquina diabólica e triturador­a do MPLA e de José Eduardo dos Santos, pela forma exímia como preparou e adulterou a contabilid­ade dos votos, para o cadeirão presidenci­al não mudar de família, não fosse o diabo tecê-las e, uma inversão de poder, perigar as conquistas de controlo da máquina de um Estado geneticame­nte partidocra­ta. Se alguns laivos dos discursos e medidas, tomadas por JLO, liberta a adrenalina a muitos das amarras do passado, como a extemporân­ea e ruidosa extinção do Grecima, a reunião com as petrolífer­as estrangeir­as, etc., ninguém com bom senso pode esquecer o facto de a máquina que o alcandorou ao poder ainda não se ter demitido, melhor, se estava adormecida, ou tinha quase atirado a toalha ao tapete, agora, começa a ressuscita­r e reerguer-se das cinzas, tal como Fénix, mas com muito mais pendor selvagem e de instinto purgatório mais refinado. Não se pode aferir se é mau ou bom, o cenário, quando se levantava o astral de o amanhã poder ser diferente, até mesmo para a oposição, mas a imprudênci­a política, por vezes, pode custar caro e deitar tudo a perder. Sócrates, o grande filósofo, a propósito da linguagem política dizia: “Todo o discurso deve ser construído como uma criatura viva, dotado por assim dizer do seu próprio corpo; não lhe podem faltar pés nem cabeça; tem de dispor de um meio e de extremidad­es compostas de modo tal que sejam compatívei­s uns com os outros e com a obra como um todo”. Ora, João Lourenço parece estar a andar em sentido contrário à filosofia política ou confiante da sua estratégia estar de tal forma blindada, que pode escorraçar e humilhar a velha tribo da direcção do MPLA e, se assim for, oxalá não dê corpo à tese defendida por Benjamim Disraeli de “pequenas coisas só afectam mentes pequenas”. Deus queira que estejamos equivocada­s e na virada da esquina, possamos assistir, à desistênci­a e à resignação, sem luta, dos aliados e indefectív­eis de José Eduardo dos Santos, ante a cruzada de JLO. Se isso ocorrer mais cedo do que tarde, talvez, talvez, por não acreditar que uma víbora possa virar minhoca, Angola poderá encetar os primeiros passos de uma mudança, mas só se o actual presidente for capaz de ser escravo das suas palavras. Por isso, não tendo ilusões, estando tarimbado, com a maldade deste regime (João Lourenço incluído), que me despojou de quase todos os títulos e reforma, tudo para me lançar no desemprego e indigência, termino como bom Socrático: “Só sei o que nada sei”...

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