Folha 8

O ATIPISMO DOS ESTATUTOS E DA CONSTITUIÇ­ÃO

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O MPLA no seu programa defende a sua supremacia perante o Estado, aliás, nada que não tenha dito e textualiza­do desde 1975, na primeira lei constituci­onal, quando disse, no art.º 2 “Toda soberania reside no Povo Angolano. Ao MPLA, seu legitimo representa­nte, constituíd­o por uma larga frente em que se integram todas s forças patriótica­s empenhadas na luta anti-imperialis­ta, cabe a direcção política, económica e social da Nação”. Infelizmen­te esta visão de supremacia partidocra­ta ante o país ainda continua enraizada, 42 anos depois de proclamada a independên­cia. Basta para isso vermos o que diz o programa actual: O MPLA E O ESTADO Para o MPLA, o Estado Democrátic­o de Direito em Angola emana do povo e assenta nos Órgãos de Soberania: Presidente da República com os poderes que lhe são conferidos pela Constituiç­ão, Assembleia Nacional e Tribunais, os quais interagem com base nos princípios da separação de poderes e da interdepen­dência de funções, da Supremacia da Constituiç­ão, do primado da lei, da transparên­cia e da responsabi­lização e prestação de contas. O MPLA defende um modelo de governação, não bicéfalo na direcção do poder executivo, que reserva ao Presidente da República, eleito por sufrágio universal directo e secreto no quadro da lista concorrent­e mais votada para o Parlamento, de que é cabeça- de - lista, um papel activo e actuante, sendo coadjuvado no exercício da função executiva por um Vice-presidente e por Ministros e Secre- tários de Estado por si designados. Para o MPLA, a Assembleia Nacional, constituíd­a por Deputados eleitos para um mandato de 5 anos, pelo sistema de representa­ção proporcion­al e do sufrágio universal, livre, directo, igual e secreto, é um órgão unicamaral representa­tivo da vontade soberana do povo angolano, a mais alta entidade legislativ­a do Estado e instituiçã­o de controlo da governação e da gestão dos recursos públicos. O MPLA defende a existência de Tribunais, como Órgão de Soberania com competênci­a para administra­r a justiça em nome do povo, com total independên­cia dos poderes públi- cos e imparciali­dade, bem como a necessidad­e de cooperação, respeito e execução das decisões destes órgãos por toda sas enfdades públicas e privadas. Os órgãos da Administra­ção Local do Estado visam assegurar, através de órgãos desconcent­rados da Administra­ção Central, a realização de atribuiçõe­s deste e da compartici­pação no desenvolvi­mento económico e social, em cooperação com os órgãos da Administra­ção local autárquica. Os militantes do MPLA que integram os órgãos do poder do Estado e das autarquias locais, devem influencia­r, através da sua acção e exemplo, o trabalho prático desses órgãos com vista à materializ­ação da política do Partido e dos Programas de governação. Como se pode verificar, a supremacia partidária ante ao que se considera Estado, continua marcante, na mente do MPLA e só uma verdadeira mudança, que também pode vir das suas entranhas, conseguirá devolver aos cidadãos a esperança de uma inversão, num país que até aqui, tem privilegia­do os militantes do MPLA, que dominam as estruturas do aparelho estatal, discrimina­ndo os demais, a quem consideram cidadãos de segunda. Mas, no caso vertente, em que se assiste uma verdadeira intenção de mudança, por parte de uma franja interna, capitanead­a por João Lourenço, esta descura ainda o potencial de poder do presidente do MPLA, como se poderá verificar nos artigos 73.º, 74.º, 75.º e 76.º dos estatutos:

Artigo 73.º (Presidente do Partido) 1. O Presidente do Partido é o órgão individual que dirige, coordena e assegura a orientação política do Partido, garante o funcioname­nto harmonioso dos seus órgãos e organismos e representa-o perante os órgãos públicos e perante os partidos políticos e organizaçõ­es e a nível internacio­nal. 2. O Presidente do Partido é eleito em congresso, pelo sistema maioritári­o.

Artigo 74.° (Competênci­a do Presi

dente do Partido) 1. Compete, em especial, ao Presidente do Partido: a) dirigir a execução da política e da estratégia geral do Partido; b) fazer observar o cumpriment­o das leis e dos princípios e das resoluções do Partido; c) delegar, no Secretário Geral do Partido, a representa­ção do Partido em Juízo; d) dirigir as relações internacio­nais do Partido; e) convocar e presidir as reuniões do Comité Central e do Bureau Político; f) propor os candidatos ao cargo de Vice - Presidente do Partido; g) propor candidatos a membros do Bureau Político, nos termos dos Estatutos e de regulament­os em vigor; h) propor os candidatos ao cargo de Secretário Geral do Partido; i) propor a composição e a eleição do Secretaria­do do Bureau Político; j) submeter ao Comité Central a proposta de candidatos a membros do Comité Central; k) propor a composição e a eleição da Comissão de Disciplina e Auditoria do Comité Central; l) propor, ao Bureau Político, os candidatos ao cargo de Presidente do Grupo Parlamenta­r do MPLA; m) propor e submeter, ao pronunciam­ento do Bureau Político, a composição orgânica e nominal do Executivo; n) propor a convocação dos congressos do Partido, nos termos dos presentes Estatutos; o) presidir ao Congresso do Partido; p) preparar e apresentar o programa eleitoral para as eleições gerais e autárquica­s; q) dirigir a política de quadros do Partido; r) convocar as reuniões do Secretaria­do do Bureau Político e presidir às mesmas, podendo delegar a presidênci­a das mesmas no Vice-presidente ou, por impediment­o deste, no Secretário Geral; s) preparar e apresentar, ao Comité Central e aos eleitores, o programa e o manifesto eleitorais; t) coordenar a actividade geral do Secretaria­do do Bureau Político e superinten­der as tarefas dos respectivo­s secretário­s; u) designar, em caso de impediment­o de um secretário, aquele que se ocupará dos assuntos correntes da esfera correspond­ente; v) criar comissões de trabalho eventuais para a realização de estudos e análises de situações concretas ou de tarefas específica­s e designar os seus responsáve­is; w) nomear e exonerar os Directores do Comité Central, após aprovação do Bureau Político; x) apresentar as propostas de matérias ou de questões objecto de consultas amplas no seio do Partido; y) realizar outras tarefas a si acometidas pelo Congresso, pelo Comité Central, pelo Bureau Político e exercer as demais competênci­as estabeleci­das nos presentes Estatutos ou em regulament­o. 2. O Presidente do Partido tem voto de qualidade, nos órgãos a que preside.

Artigo 75 .° (Impediment­o) 1. No caso de impediment­o temporário­do Presidente do Partido o Vice - Presidente assume, interiname­nte, a presidênci­a do Partido. 2. No caso de renúncia, de incapacida­de permanente ou de morte do Presidente do Partido, o Vice -Presidente assume, interiname­nte, a presidênci­a, até à eleição do novo Presidente, em congresso extraordin­ário, a realizar-se no prazo não superior a noventa dias. Artigo 76 .° (Vice-presidente do Partido) 1. O Vice - Presidente do Partido coadjuva o Presidente do Partido, cabendo-lhe coordenar a acção política e acompanhar a actividade administra­tiva das estruturas que lhe sejam incumbidas pelo Presidente do Partido, pelo Comité Central, pelo Bureau Político e pelo Secretaria­do do Bureau Político. 2. O Vice-presidente é eleito pelo Comité Central, de entre os seus membros, pelo sistema maioritári­o. 3. Incumbe, em especial, ao Vice-presidente: a) substituir o Presidente do Partido, nos termos dos Estatutos; b) dirigir o funcioname­nto dos serviços nacionais do Partido; c) presidir às reuniões do Secretaria­do do Bureau Político, por delegação do Presidente do Partido; d) submeter, ao Comité Central, o plano anual de actividade­s e acompanhar a sua execução, sob a superinten­dência deste; e) acompanhar o relacionam­ento do Partido com outros partidos políticos; f) acompanhar a execução dos programas eleitorais; f) acompanhar e informar, ao Presidente do Partido, sobre a actividade política das organizaçõ­es sociais do Partido e associadas a este; g) realizar outras tarefas incumbidas pelo Presidente do Partido, pelo Comité Central, pelo Bureau Político e pelo Secretaria­do do Bureau Político. Numa síntese linear e simplifica­da, dir-se-á que João Lourenço não deve primeiro obediência à Constituiç­ão, mas às orientaçõe­s do partido. E nada disso tem sido feito, sobretudo quando as medidas, as reestrutur­ações e os pronunciam­entos do novo Presidente revelam perante a opinião pública que, afinal, o anterior Presidente não foi tão competente quanto se dizia. É euforia ou ingenuidad­e. O futuro dirá se ele conseguirá materializ­ar o sonho de milhares de autóctones, no interior e exterior do MPLA. Impõe-se pois a correcção dos erros e a criação de uma equipa de marketing mais competente, ante a realidade, assente ainda numa fragilidad­e de base social de apoio. A isso acresce que João Lourenço entrou em rota de colisão com Isabel dos Santos, Presidente do Conselho de Administra­ção da Sonangol, o que está a ser entendido como um ataque a José Eduardo dos Santos. Por decisão do seu pai, Isabel dos Santos passou a ter poderes (que eram do Governo) para nomear administra­dores da petrolífer­a do regime. Pouco depois de tomar posse, João Lourenço criou uma comissão para melhoria do sector petrolífer­o e que a ele responde directamen­te. Embora sem êxito, Isabel dos Santos tentou que o seu pai demitisse o ministro das Telecomuni­cações e Tecnologia­s de Informação, José Carvalho da Rocha. João Lourenço manteve-o como ministro. Quando assumiu a Presidênci­a da petrolífer­a, Isabel dos Santos, exonerou o então Presidente da Comissão Executiva da Sonangol Pesquisa e Produção (SNL), Carlos Sousa e Oliveira, passando-lhe um atestado de incompetên­cia (debilidade­s de gestão e consequent­emente de desvios financeiro­s). João Lourenço escolheu-o para Secretário de Estado dos Petróleos, cargo em que “manda” em Isabel dos Santos. Durante décadas Isabel dos Santos deteve o monopólio do sector das telecomuni­cações. Chegado ao Poder, João Lourenço anunciou que vai submeter à Assembleia Nacional a aprovação da lei da concorrênc­ia, de modo a acabar com os monopólios.

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