ALBERTO OLIVEIRA PINTO RECEBE O GALARDÃO DO PRÉMIO SAGRADA ESPERANÇA
O historiador angolano, Alberto Oliveira Pinto, recebe finalmente o galardão do prémio Sagrada Esperança 2016, a 1 de Novembro de 2017, em cerimónia a realizar-se no Memorial António Agostinho Neto, em Luanda.
OJúri do Prémio Literário Sagrada Esperança 2016 - promovido pelo Instituto Nacional das Indústrias Culturais (INIC), pelo Banco Caixa Angola e pela Fundação Dr. António Agostinho Neto (FAAN) – atribuiu ao livro de ensaios Imaginários da História Cultural de Angola, a distinção do prémio, quer pelo valor memorável da obra como do recurso estilístico da mesma. Tal como em 1998, quando o autor venceu pela primeira vez este prémio com o romance histórico Mazanga, Alberto Oliveira Pinto mostrou-se profundamente regozijado com a distinção, e orgulhoso em receber mais uma vez um prémio evocativo, quer dessa obra maior da literatura angolana que é Sagrada Esperança, quer da memória do seu autor, o primeiro Chefe de Estado de Angola, Dr. António Agostinho Neto. Impõe-se-me uma explicação acerca do que o autor designa por “história cultural” e sobre como é que, a seu ver, este conceito pode ser amplamente útil aos estudiosos e interessados pela história de Angola. Interroguemo-nos, em primeiro lugar, sobre o que significa “cultura”. Qualquer dicionário contemporâneo da língua portuguesa define sempre o substantivo cultura em três acepções. A primeira, a clássica, derivada do latim colere, parte da ideia da domesticação da Natureza pelo Homem, pois corresponde ao acto ou efeito de cultivar a terra (ou o mar, ou o ar). Abrange a agricultura, mas também o pastoreio ou a pesca. Por se reportar às actividades de subsistência das sociedades humanas, envolveu sempre uma relação com a transcendência, uma tutela sagrada das divindades ou dos espíritos dos antepas- sados. Daí o aparecimento do substantivo culto para designar o acto social de veneração das entidades tutelares. A segunda acepção de cultura surge na Europa dos séculos XV e XVI, com o chamado Humanismo Renascentista, quando Deus, ao contrário do que sucedia na Idade Média, deixa de estar no centro do mundo para dar lugar ao Homem. Este era agora visto como ser racional, pensante e consciente e por isso não lhe bastava cultivar a “matéria” ou aquilo que a escolástica designava por natura. O Homem tinha que culti- var a própria “mente”. Cultura tornava-se, portanto, sinónimo de educação e de erudição. E culto deixava de ser apenas um substantivo para se tornar também um adjectivo, utilizado em ambos os géneros. Culto(a) era agora aquele(a) que teve o privilégio de estudar ou de ler muito, por contraposição ao(à) inculto(a), que permanecia próximo(a) da natureza e de um estádio de selvajaria. Esta perspectiva cartesiana – termo que deriva do nome do filósofo, físico e matemático francês René Descartes (1596-1650) - de cultura atravessou os séculos, alimentando inúmeros debates, como os das hierarquizações das culturas ou os das contraposições entre culturas e contraculturas. E perdura nos dias de hoje, não só na linguagem corrente, mas sobretudo no que diz respeito às chamadas políticas culturais. A terceira acepção de cultura, a antropológica ou etnográfica, introduzida pelo antropólogo britânico Edward Burnett Tylor (18321917), aparece na viragem do século XIX para o século XX e atribui à cultura o significado de um conjunto de conhecimentos e comportamentos - técnicos, económicos, rituais, religiosos, sociais, entre outros, transmitidos de geração em geração – que caracterizam uma determinada sociedade humana. Também este sentido de cultura, nascido associado ao darwinismo e ao evolucionismo, se mantém actual, havendo sofrido múltiplas metamorfoses, porquanto em diversas ocasiões se confundiu desordenadamente – ainda que não inocentemente – com conceitos tão díspares quanto raça e racismo ou nação e nacionalismo. Tal como a segunda, esta terceira acepção de cultura legitimou o colonialismo português em Angola e foi útil ao retrato que o discurso colonial traçou dos povos angolanos, nomeadamente no que diz respeito às perspectivações exóticas e à chamada folk culture (cultura popular). Neste último aspecto, o da folk culture (cultura popular), esta acepção antropológica de cultura apresentou a particularidade de, mercê do pensamento romântico oitocentista, ter sido apropriada, inevitavelmente, pela generalidade dos discursos nacionalistas e/ ou independentistas dos séculos XIX e XX. E o(s) nacionalismo(s) independentista(s) angolano(s) não poderia(m) fugir à regra.