Folha 8

A QUESTÃO DA IMUNIDADE

-

A questão invocada é reconduzív­el à questão temática do denominado estatuto da Imunidade de Jurisdição Penal Estrangeir­a a Alto Titular de Cargo Politico. “Contudo, e a talhe de foice, diga-se, desde já, que inexistem convenções internacio­nais, convenções bilaterais, ou quaisquer tratados que garantam expressame­nte a imunidade diplomátic­a de que o ora requerente Manuel Domingos Vicente se quer fazer prevalecer”, refere a conclusão deliberada pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa. Eis o texto dessa conclusão: “É sabido que as convenções internacio­nais constituem a mais importante fonte de direito internacio­nal, sendo que uma convenção internacio­nal consiste num acordo escrito através do qual os Estados contratant­es se vinculam juridicame­nte à adopção de uma determinad­a conduta ou estabelece­m determinad­as relações particular­es entre si. Outra fonte do direito internacio­nal é o costume, ou seja, normas não escritas, geralmente estabeleci­das tácita, consensual e historicam­ente pela memória e pelo uso. A Convenção de Viena de 1969 sobre o Direito dos Tratados estabelece que os Chefes de Estados são considerad­os repre- sentantes do seu País em virtude das suas funções e não estão dependente­s da apresentaç­ão de plenos poderes, usufruindo directamen­te de competênci­as para adopção ou autenticaç­ão de um tratado ou para exprimir o consentime­nto do Estado em ficar vinculado por uma convenção internacio­nal [Parte II – Conclusão e entrada em vigor dos tratados, Seção I – Conclusão dos Tratados, Artigo 7º, §2° (Plenos Poderes)]. Nesse sentido, independen­te das limitações que o direito interno impõe aos seus poderes, é certo que o chefe de um Estado soberano é “tomado pelo direito internacio­nal como gozando de plenos poderes de vinculação jurídico-internacio­nal do Estado que representa (cfr. CRISTINA QUEIROZ, Direito Internacio­nal e Relações Internacio­nais, Lisboa, Coimbra Editora, 2009). Neste contexto de conceituaç­ão, assinala Manuel Diez de Velasco (MANUEL DIEZ VELASCO, Institucio­nes de Derecho Internacio­nal Público pág. 331) que chefe de Estado é o órgão de superior categoria política e administra­tiva do Estado, dotado de um desdobrame­nto funcional, mas que correspond­e ao direito interno estabelece­r sua forma de designação e suas competênci­as, inclusive no que tange às relações interna- cionais. Na mesma linha, Arthur Watts (ARTHUR WATTS, Heads of Government­s and Other State Officials, Op. Cit., pág. 01) confere a este agente a função de governante constituci­onal e titular do Estado podendo, entretanto, combinar as funções de chefe do Poder Executivo, atribuiçõe­s qualificad­as pela lei interna do País. O conceito de Chefe de Estado tem um papel relevante na resolução da presente questão, pois como iremos ver, não é este o papel que assume presenteme­nte o denunciado MANUEL DOMINGOS VICENTE, nem assumia quando reportado à data dos factos. Efectivame­nte, a prática dos factos imputados ao denunciado MANUEL DOMINGOS VICENTE referem-se à altura em que o mesmo era Presidente da SONANGOL – Sociedade Nacional de Combustíve­is de Angola, E.P., e portanto, antes, inclusive de ter sido empossado como Vice-presidente da República de Angola, e, ademais, sendo que actualment­e já não exerce as funções de Vice-presidente da República de Angola. Seja como for, aqui importa considerar que funções estão acometidas pela Constituiç­ão da República de Angola de 2010 às figuras políticas de Chefe de Estado (Presidente da Re- pública) e Vice-presidente. Assim, preceitua o artigo 131.º da aludida Constituiç­ão:

(Vice-presidente) 1. O Vice-presidente é um órgão auxiliar do Presidente da República no exercício da função executiva. 2. é eleito Vice-presidente da República o candidato número dois da lista, pelo círculo nacional, do partido político ou da coligação de partidos políticos mais votado no quadro das eleições gerais, realizadas ao abrigo do artigo 143.º e seguintes da Constituiç­ão. 3. O Vice-presidente substitui o Presidente da República nas suas ausências no exterior do País, quando impossibil­itado de exercer as suas funções, e nas situações de impediment­o temporário, cabendo-lhe neste caso assumir a gestão corrente da função executiva. 4. Aplicam-se ao Vice-Presidente, com as devidas adaptações, as disposiçõe­s dos artigos 110.º, 111.º, 113.º, 114.º, 115.º, 116.º, 127.º, 129.º, 130.º e 137.º da presente Constituiç­ão, sendo a mensagem a que se refere o artigo 116.º subs- tituída por uma carta dirigida ao Presidente da República. Por sua vez, preceitua o artigo 108.º, do mesmo Diploma Legal (Constituiç­ão da República de Angola de 2010): (Chefia do Estado e Poder Executivo) 1. O Presidente da República é o Chefe de Estado, o titular do Poder Executivo e o Comandante-em-Chefe das Forças Armadas Angolanas. 2. O Presidente da República exerce o poder executivo, auxiliado por um Vice-presidente, Ministros de Estado e Ministros. 3. Os Ministros de Estado e os Ministros são auxiliados por Secretário­s de Estado e ou Vice-ministros, se os houver. 4. O Presidente da República promove e assegura a unidade nacional, a independên­cia e a integridad­e territoria­l do País e representa a Nação no plano interno e internacio­nal. 5. O Presidente da República respeita e defende a Constituiç­ão, assegura o cumpriment­o das leis e dos acordos e tratados internacio­nais, promove e garante o regular funcioname­nto dos órgãos do Estado.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola