Folha 8

ZACARIAS KAMUENHO E O MPLA

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Os angolanos já assimilara­m que só um povo informado consegue ser livre. Vai daí, alguns passaram do oito para o oitenta, esquecendo que a liberdade de uns termina onde começa a dos outros. Tal como fez, em 2001, o então secretário para as relações exteriores do MPLA, Paulo Teixeira Jorge, ao dizer que o Governo português, não deveria permitir que “portuguese­s de ocasião” interferis­sem nos assuntos internos de Angola, catalogam agora de “angolanos de ocasião” todos os que dizem algo que seja diferente da verdade oficial. Na altura, Paulo Teixeira Jorge (falecido em 26 de Junho de 2010) ainda não tinha ouvido falar de democracia. Não sabia o que era e, por isso, julgava-se no direito de dar palpites sobre um Estado de Direito, algo que não se podia dizer (ainda não se pode) a propósito de Angola. “Existe o princípio universal da não ingerência nos assuntos internos (de outro Estado) e eu creio que Portugal, através dos órgãos competente­s, poderia recomendar a esses ditos portuguese­s (elementos afectos à UNITA que vivem em Portugal) para não se meterem nos assuntos internos (de Angola)”, afirmou Paulo Teixeira Jorge, referindo-se ao facto do relatório do então mecanismo de fiscalizaç­ão das sanções contra a UNITA apresentar Portugal como a principal base de apoio do movimento de Jonas Savimbi na Europa. E, a fazer fé no muito que se vai lendo, as teses de Paulo Teixeira Jorge fizeram escola. Portugal hoje, como em 2001, convirá que todos o entendam de uma vez por todas, é uma nação livre. Coisa que não existe em Angola. Seja como for, todos aqueles que catalogam os angolanos em duas classes, os de primeira (afectos ao MPLA) e de segunda (afectos aos outros partidos), devem perceber que angolano não é sinónimo de cor ou de filiação partidária. “… Eles são portuguese­s de ocasião, fundamenta­lmente são angolanos que se tornaram portuguese­s depois da evolução da situa- ção em Angola”, afirmou na altura Paulo Teixeira Jorge, para quem o Governo português também deveria “chamar a atenção” dos elementos da Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC) que se encontrava­m em Portugal. Paulo Teixeira Jorge também disse que Angola deveria “rever as relações bilaterais” com Portugal na sequência das conclusões do relatório do mecanismo de fiscalizaç­ão das sanções contra a UNITA. Na altura, importa recordá-lo, nas declaraçõe­s que prestou à Rádio Nacional de Angola, Paulo Teixeira Jorge também criticou as posições que a Igreja Católica tinha tomado no âmbito do processo de paz, consideran­do que “num Estado laico, a Igreja não pode permitir-se interferir nos assuntos do Governo”. Ontem, tal como hoje. Ninguém pode interferir com a lei da selva imposta pelo MPLA. Portugal interfere com Angola, a Igreja interfere com o Governo. Na altura, referindo-se ao facto do presidente da Conferênci­a Episcopal de Angola e S. Tomé (CEAST), D. Zacarias Kamuenho, ter defendido a necessidad­e de um cessar-fogo bilateral para acabar com a guerra, Paulo Teixeira Jorge afirmou que “D. Zacarias Kamuenho devia preocupar-se com os problemas da Igreja, que não são poucos, já que o resto não era da sua competênci­a”. Mais palavras para quê? É por estas e por outras, é por este e por outros, que os angolanos continuam a vegetar, enquanto os dirigentes vivem, continuam a viver, à grande. Até um dia.

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