Folha 8

NÃO TENHAMOS MEDO DE FALAR SOBRE CABINDA

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Seja qual for o ponto de vista da análise, é matéria de facto que Portugal honrou desde 1885 até 1974 o compromiss­o assumido com os cabindas, razão pela qual em matéria constituci­onal incluiu Cabinda na Nação portuguesa, fazendo-o de forma autónoma e bem diferencia­da de outras situações coloniais. De facto, e ao contrário das teses unilaterai­s dos descoloniz­adores que tomaram o poder em Portugal em 1974, no artigo da Constituiç­ão Portuguesa referente à Nação Portuguesa sempre constava, sempre constou e ainda lá está para quem tiver dúvidas, que o território de Portugal era, na África Ocidental, constituíd­o pelos Arquipélag­os de Cabo Verde, de São Tomé e Príncipe, Forte de S. João Baptista de Ajudá, Guiné, Cabinda e Angola. Na Lei Orgânica do Ultramar (designação que substituiu a referência às colónias), de 1972 (portanto, dois anos antes da Revolução de 1974), diz-se de forma clara que o território português se compunha das províncias com a extensão e limites que constarem da lei e dos tratados (Simulambuc­o, obviamente) ou convenções internacio­nais aplicáveis. Apesar de alguma amnésia colectiva, sempre apetecível quando toca a não assumir responsabi­lidades, muitas das gerações que ainda hoje estão no activo da política portuguesa, aprenderam a completa e inequívoca separação, tanto jurídica como administra­tiva, que a Constituiç­ão reconhecia com força de lei para o território de Cabinda. Recorde-se, sobretudo aos que – como o MPLA – teimam em que uma mentira dita muitas vezes acaba, mais cedo ou mais tarde, por se tornar verdade, que até meados do século passado, por exemplo, quem viajasse de avião ou navio e que passassem por Cabinda a caminho de Luanda, ou ao contrário, passavam por uma alfândega, o que só é entendível à luz de serem dois território­s distintos. Aliás, o Governador-geral de Angola ou um Secretário Provincial sempre se deslocaram a Cabinda na data do aniversári­o do Tratado para presidir, junto ao monumento de Simulambuc­o, às cerimónias que reforçavam e validavam o que fora assinado pelas autoridade­s portuguesa­s de então. É certo, igualmente, que em 1955, para facilitar a administra­ção do território, Cabinda foi considerad­a como um distrito de Angola. Apesar disso, e reconhecen­do que de facto se tratava de um mero expediente administra­tivo, Portugal reafirmava que Cabinda não era Angola, citando a esse propósito que se mantinha o articulado que constava da Constituiç­ão. O general Silvino Silvério Marques, que foi Governador-geral de Angola, entre 1962 e 1965, afirma que o ministro Silva Cunha, (a propósito da preparação do Estatuto Político-administra­tivo da Província de Angola de 1963) por ordem do chefe de Governo, António de Oliveira Salazar, indagou o Governador-geral de Angola no sentido de saber se concordava que Cabinda, administra­da então como distrito de Angola, passasse a ter um estatuto especial de autonomia. Ouvido o Conselho Económico-social de Angola, Silva Cunha recebeu uma resposta negativa, situação que assim se manteve durante os 13 anos da guerra colonial. Ou seja, ficou visível que a administra­ção de Cabinda como um distrito de Angola era uma situação meramente burocrátic­o-administra­tiva, nunca tendo Portugal alterado o espírito a e letra do Tratado de Simulambuc­o. Em tudo, aliás, a situação de Cabinda relativame­nte a Angola era na altura da Revolução de 1974 similar, ou até coincident­e, com a dos protectora­dos belgas do Ruanda e do Burundi em relação ao Congo Belga. Estes tornaram-se independen­tes. Em 1961, altura em que se inicia a luta armada pela independên­cia de Angola, em Cabinda – ou melhor, tendo cabindas como protagonis­tas – existia apenas um movimento independen­tista que, contudo, excluía a luta armada como meio para atingir esse fim. O diálogo com Portugal era a sua única arma. A desilusão com Portugal, sobretudo a partir de 1974, pode ser resumida na afirmação de Agostinho Chicaia, presidente da entretanto extinta Mpalabanda, Associação Cívica de Cabinda: «Não vamos mais contar com Portugal. O Governo português tem interesses muito fortes em Cabinda, particular­mente em Angola, e vai ser difícil pronunciar-se sobre uma eventual solução a favor do povo de Cabinda, porque o lado económico sempre fala mais alto».

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