NO INÍCIO ERA O VERBO EO VERBO SE FEZ VERBO (II)
De acordo com o sociólogo, historiador, antropólogo e filósofo Edgar Morin, é um erro analisarmos e tentarmos compreender a realidade, seja de que natureza for, desde uma perspectiva unívoca e autoreferente. Há um exemplo curioso que contribui para a compreensão desta perspectiva, a que Morin chama pensamento complexo: este ano (2017), o prémio nobel da economia foi Richard Thaler, por explicar a realidade económica com base em fundamentos da Psicologia. Quem diria! — Economia comportamental. Isto significa que é insustentável e inadequado tentar escolher uma perspectiva para compreensão dos fenómenos. A personalidade enquanto objecto de análise, inicialmente era identificada com a Psicologia, hoje deixou de ser refém desta área do conhecimento. Por isso, ela é objecto da Pedagogia, da Ética/ Moral, da Antropologia, da Biologia e da Sociologia. Todas estas ciências se ocupam também do aborto. A elas soma-se a Bioética e a Medicina. A compreensão mínima da realidade que Angola está a viver na era da sucessão presidencial, pressupõe análises ponderadas. Tal ponderação passa por olhar vários ângulos e perspectivas da realidade. Não estou a dizer que a análise à luz do pensamento complexo e holográmica são infalíveis. Simplesmente parece-me ser o método mais adequando de compreensão da realidade nos nossos tempos. Não estamos a defender a verdade total. Adorno diria que «a totalidade é a não verdade». Os hologramas, segundo o projecto Ciência Viva «são registos de objectos que quando iluminados de forma conveniente permitem a observação dos objectos que lhe deram origem. […] os hologramas registam também a fase da radiação luminosa proveniente do objecto. Nesta fase está contida a informação sobre a posição relativa de cada ponto do objecto iluminado, permitindo reconstruir uma imagem com informação tridimensional.» A introdução da dimensão hologramática no método pensamento complexo é uma escolha analógica. E alerta-nos para evitarmos análise total e absolutamente especializadas como caminho seguro em busca da verdade. Claro, verdade provisória, questionável, falível e efémera. É mister evitar simplificação e simplismo bacoco. Sobre o holograma como parte constitutitva do Pensamento Complexo, como método de compreensão e análise da realidade, a obra, Introdução ao Pensamento Complexo vai mais longe, dizendo que num holograma, o ponto mais pequeno da imagem do holograma contém a quase-totalidade da informação do objecto representado. Não apenas a parte está no todo, mas o todo está na parte. O princípio hologramático está presente no mundo sociológico a par doutros mundos. A ideia do holograma ultrapassa, quer o reducionismo que só vê as partes quer o holismo que só vê o todo. É um pouco a ideia formulada por Pascal: «Não posso conceber o todo sem conceber as partes e não posso conceber as partes sem conceber o todo». Se não perder de vista que o homem é produto do seu meio e do seu percurso histórico, facilmente poderemos compreender Lourenço na lógica do Pensamento Complexo. E daqui resultará uma inferência mais ou menos segura sobre o que dele se espera. Disto nos alertou involuntariamente Dino Matross, em entrevista concedida ao jornal Sol (01.10.17): «João Lourenço não faz nada sozinho e sem a direção do partido». Do ponto de vista essencialista, Dino alertou aos que estão a cantar hossana nas alturas, que o regime, o sistema é o todo. Lourenço é somente a parte. Ou seja, é um produto e fragmento do sistema com o qual não estabeleceu ruptura. A parte subordina-se ao todo. A parte partilha a mesma natureza do todo! «Os modos simplificadores do conhecimento mutilam mais do que exprimem as realidades ou os fenómenos que relatam, se se tornar evidente que produzem mais confusão que esclarecimento.», afirma Morin (2008: 7). O estágio em que as ferramentas de análise se encontram, é tão avançado que a minha inquietação é: porque na realidade angolana não os usamos? Parece que a mesma velocidade vertiginosa com que os outros povos usam os recursos científicos com vocação universal (mesmo que seja possível adaptá-los), tal velocidade no nosso contexto, também se verifica, mas, para propagar «o erro, a ignorância, a cegueira» (2008:13). Ensaio sobre a cegueira nacional Oh! Meu povo povo, Porque o teu desejo de morrer é tão intenso quanto a ganância? Porque amas profundamente a opressão? Porque vês a solução naquele que é parte da crise e criador da crise? A tua intelligentsia colectiva esfumou-se tão profundamente. Ao ponto de esperar colectar mamões num pomar de gindungo, Oh! meu povo… Porque deixaste de sonhar? Porque assassinaste a utopia? Porque mergulhaste na sabichonice? E no amor ao nada, mesmo que seja só o verbo. Oh! Como você se embala, só com o verbo!