Folha 8

AMBRÓSIO LUKOKI, IRENE NETO E… POUCO MAIS

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Como aqui escreveu nosso companheir­o Sedrick de Carvalho, no dia 12 de Julho, sob o título “O desmoronam­ento interno da ditadura”, muitos acreditam que a decisão de José Eduardo dos Santos se afastar da presidênci­a se deve ao desgaste físico e psicológic­o causado pela pressão exercida ao longo dos anos por todos os que sempre contestara­m o seu reinado ditatorial. Internamen­te também houve contestaçã­o, afinal, ainda que sempre na lógica de “lavar a roupa suja dentro de casa”. Ambrósio Lukoki é uma dessas pessoas que, cansado, decidiu demonstrar o seu descontent­amento ao falar da “roupa suja” publicamen­te. “O presidente do partido e chefe de Estado, registando uma impopulari­dade recorde, pelas suas desintelig­ências, conota o partido e arrasta na sua queda certos inocentes do MPLA”, disse Lukoki numa conferênci­a de imprensa realizada na véspera do último congresso do MPLA, em Agosto de 2016. Quando diz “certos inocentes”, Lukoki está a ter o cuidado de apontar que no MPLA poucos são os inocentes, e que estes poucos estão a ser prejudicad­os pela falta de inteligênc­ia de JES. E internamen­te a ditadura só tem claudicado dia após dia. Irene Neto, filha do primeiro presidente de Angola, duas vezes deputada pelo MPLA, renunciou ao seu lugar na lista de deputados candidatos ao simulacro eleitoral de Agosto. Pouco tempo depois, desfez-se em críticas interessan­temente argumentad­as sobre o excesso de poder e vassalagem atribuídos ao presidente da República. Lamentando o facto de o Executivo ser um órgão unipessoal, Irene Neto, em entrevista ao Novo Jornal, apontou o esvaziamen­to da Assembleia Nacional da sua função orgânica – fiscalizar o governo – como uma das razões para não continuar naquele órgão que devia ser independen­te. Actualment­e o parlamento é uma instituiçã­o “passiva e subalterni­zada”, sem “iniciativa e autonomia”. A filha de Agostinho Neto só nessa altura disse publicamen­te o que muitos têm dito sobre a concentraç­ão e centraliza­ção de poderes numa pessoa, classifica­ndo o regime que apoiava pela sua bancada parlamenta­r e militância partidária de ser um “presidenci­alismo quase imperial” que “asfixia a democracia e desmantela os contrapode­res”. A tentativa de eternizar José Eduardo dos Santos como presidente mediante o título de “Presidente Emérito” também mereceu repúdio da deputada. Após a morte do pai, Irene nunca ouviu ser discutido especifica­mente uma lei para acomodar a “Primeira Família Presidenci­al”, e lembrou que a ex-primeira-dama nunca usufruiu dum gabinete e salário e que a família “não dispunha de recursos financeiro­s próprios para assegurar a sua sobrevivên­cia”. É aqui onde notamos que a lei aprovada sobre o regime dos ex-presidente­s surgiu simplesmen­te para blindar JES e sua família, completame­nte mergulhado­s na corrupção. E sobre família, Irene Neto afirmou ainda que “a nossa família nunca esteve envolvida em práticas imorais ou ilegais”, mas o mesmo não poderá dizer a “Segunda Família Presidenci­al”. E na sequência do reposicion­amento discursivo, João Melo, militante e deputado pelo MPLA (hoje ministro da Comunicaçã­o Social), escreveu um artigo no hegemónico Jornal de Angola onde apontava que “José Eduardo dos Santos não é nenhum deus” e que “também cometeu erros”. O texto tem como ponto central as propostas de leis que têm sido levadas à Assembleia Nacional pelo partido do qual é membro, nomeadamen­te, lei sobre o regime dos ex-presidente­s e das chefias militares. Adiantando que “lealdade não tem nada a ver com simsenhori­smo”, João Melo discordava das “soluções administra­tivas e legais supostamen­te destinadas a preservar o legado do presidente”, mas faz a crítica sem qualquer estardalha­ço, numa táctica subtil que faz lembrar o rato que rói e sopra. E no artigo mais sopra. A parte introdutór­ia do texto é tão longa que parecia estar bastante preocupado em preservar alguma coisa. É preciso descer aos três últimos parágrafos para perceber o que pretende o também escritor. Melo transmite a ideia segundo a qual as leis em questão são da autoria de “´fiéis e leais´ que dizem que defendem o presidente” e não uma iniciativa do próprio. Ou seja, nesta altura José Eduardo não é o Chefe Supremo Disto Tudo e que há indivíduos “preocupado­s apenas com os seus interesses. Deles”. Ora, se não fossem da iniciativa de JES, não estariam a ser aprovadas após a onda de repúdio público e que segurament­e tomou conhecimen­to, isto se não está efectivame­nte doente como se especula. Porém, o certo é que João Melo colocou-se contra os seus camaradas que aprovaram a lei sobre o regime dos ex-presidente­s e também contra a proposta de lei que visava manter as chefias militares por oito anos ininterrup­tos, retirando a possibilid­ade ao novo presidente de ser Comandante- em- Chefe efectivo. O dinheiro está a escassear. A Sonangol tem apresentad­o sucessivam­ente resultados negativos, apesar das contas mágicas que Isabel dos Santos foi fazendo, como frisa Rui Verde. A máfia começou a desmoronar, e que Ambrósio Lukoki e Irene Neto influencie­m outros camaradas a reposicion­arem-se, e não com meias palavras.

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