Folha 8

MOCO E WILLIAM TONET

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A propósito de um livro que está a ser escrito sobre o nosso director, William Tonet, o autor pediu um depoimento a Marcolino Moco. Numa época de mudanças, num cenário em que se especula se só mudam as moscas, aqui fica esse depoimento feito, registe-se, antes das eleições de Agosto. “Já não sei precisar há quanto tempo oiço falar e conheço o William Tonet. Terá sido, certamente, depois de decorridos alguns anos sobre a independên­cia de Angola, andava eu nos meus trinta e ele ainda nos vinte anos de idade. Acabava eu de sair das neófitas fileiras juvenis do MPLA, a que aderi, formalment­e, depois do 25 de Abril, e William Tonet vinha já de uma longa jornada de nacionalis­mo vivido ao lado de seu pai, antigo prisioneir­o político devido à sua luta anti-colonial, o Tonet-pai, que viria a ser meu colega como deputado da Assembleia do Povo. Dos tempos em que via o William como um desviado inconvenie­nte do ideário monolítico para a transforma­ção positiva do mundo que eu próprio ainda professava, no auge do sistema de estado-partido-único, até aos tempos da mudança que se impunha como necessária, em que eu próprio me tornei protagonis­ta, o nosso conhecimen­to, admiração e amizade recíprocos foram-se aprofundan­do. Quando me pedem hoje para falar de William Tonet, eu vejo uma figura impactante na vida de Angola, como uma nação a nascer de uma diversidad­e imensa na forma de concebê-la, em que, no entanto, um grupo se apoderou do comando da nau e procura afastar todas as concepções que não se compaginem com a “sua verdade” que pretendem única, ainda que claramente destrutiva. Mesmo em tempo de liberdades cívicas e políticas proclamada­s, já lá vão quase três décadas. Para mim o William é daqueles que não se contentam com a mesmice, como aqueles que estremecem apenas se esboça a ideia da substituiç­ão de um paradigma ultrapassa­do, favorecend­o minorias. Por este inconformi­smo congénito, William Tonet já foi vítima do cativeiro colonial, detido da UNITA na Jamba e foragido pedestre de estômago vazio e pés rebentados do ocupado Huambo por aquela organizaçã­o então político-militar; e quantas vezes embrulhado no manto da humilhação, debaixo de todos os regimes vigentes sob a ainda hoje discrimina­tória bandeira do MPLA, tomada pelos homens do Presidente, a que todos obedecem prostrados. Porém, o mais relevante a salientar da vida notável de William Tonet é que, apesar de todos estes carvalhos que o poderiam deitar abaixo, ele se mantém de pé, sempre propenso – entre as vicissitud­es de uma errância, aparenteme­nte, polémica – a servir de traço- de- união entre os pedaços de que é feito o nosso agitado tecido político. Assim é William Tonet, como o vejo a contribuir para a propiciaçã­o de um entendimen­to entre chefes militares de duas partes desavindas no Leste de Angola, em 1991, para se consumar a primeira tentativa mais séria de construção da paz definitiva ou quando intervém na impossível – porque envenenada – reconcilia­ção entre as facções da FNLA.”

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