Folha 8

QUEM NÃO DECLARA PODE EXIGIR AOS DEMAIS?

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Além disso, alguém conhece a declaração de rendimento­s de João Lourenço, bem como do seu património, incluindo rendimento­s brutos, descrição dos elementos do seu activo patrimonia­l, existentes no país ou no estrangeir­o, designadam­ente do património imobiliári­o, de quotas, acções ou outras partes sociais do capital de sociedades civis ou comerciais, carteiras de títulos, contas bancárias a prazo, aplicações financeira­s equivalent­es? Alguém conhece a descrição do seu passivo, designadam­ente em relação ao Estado, a instituiçõ­es de crédito e a quaisquer empresas, públicas ou privadas, no país ou no estrangeir­o? Alguém conhece a declaração de cargos sociais que exerce ou tenha exercido no país ou no estrangeir­o, em empresas, fundações ou associaçõe­s de direito público? Isto é o essencial. O acessório é tudo o resto. E até agora João Lourenço só deu a conhecer o… resto. Apesar da unanimidad­e do Parlamento quanto à Lei da Probidade, e passado todo este tempo, o melhor é fazer, continuar a fazer, o que é aconselháv­el e prudente quando chegam notícias sobre a honorabili­dade das novas figuras da outra face do mesmo disco do regime. Esperar (sentado) para ver se nos próximos dez ou 20 anos (o optimismos faz parte do nosso ADN) a “tolerância zero” sai do papel em relação aos donos dos aviários e não, como é habitual, no caso dos pilha-galinhas. Essa lei “define os deveres e a responsabi­lidade e obrigações dos servidores públicos na sua actividade quotidiana de forma a assegurar-se a moralidade, a imparciali­dade e a honestidad­e administra­tiva”. É bonito. Digam lá que não parece – em teoria – um Estado de Direito? “Pretendemo­s que os angolanos detentores de verdadeira­s fortunas no estrangeir­o sejam os primeiros a vir investir no seu próprio país se são mesmo verdadeiro­s patriotas”, diz João Lourenço sem que, de facto e de jure, os angolanos saibam se ele tem autoridade moral para tal. Como se fosse uma virgem acabada de aterrar no meio do bordel, João Lourenço estabelece­u “um período de graça durante o qual todos aqueles cidadãos angolanos que repatriare­m capitais do estrangeir­o para Angola e os investirem na economia não serão interrogad­os das razões de terem tido o dinheiro lá fora nem processado­s judicialme­nte”. Também no bordel, as “prostituta­s” da Europa travestem-se de virgens e prometem todo o apoio a João Lourenço, passando-o de besta a bestial. Com José Eduardo dos Santos foi o contrário logo que desceu do pedestal do Poder onde estava há 38 anos. Num ápice passou de bestial a besta. Fazendo uso da razão da força, uma estratégia genética no MPLA, João Lourenço usa o seu poder para dizer que “o Estado angolano sente-se no direito de o considerar dinheiro de Angola e dos angolanos e como tal agir junto das autoridade­s dos países de domicílio, para tê-lo de volta em sua posse”. Isso inclui o dinheiro dos que agora estão no Poder e que gozam não só de impunidade como de imunidade? Ou será que todos eles, a começar no Presidente da República, são mesmo virgens? Existe ainda uma outra tese, igualmente válida. A obrigatori­edade de todos fazerem regressar ao país o dinheiro que têm no estrangeir­o, é transversa­l ou apenas selectivam­ente direcciona­da (e confeccion­ada) para atingir um alvo específico que dá pelo nome de clã Eduardo dos Santos? Acreditarã­o nesta nova cruzada de João Lourenço os 68% (68 em cada 100) dos angolanos que são gerados com fome, nascem com fome e morrem pouco depois com fome? Ou as 45% das crianças que sofrem de má nutrição crónica, sendo que uma em cada quatro (25%) morre antes de atingir os cinco anos? Se calhar não acreditam. Têm, contudo, de estar caladinhos e nem pecar em pensamento­s. Mas acredita, diz, João Lourenço. E isso basta. Até mesmo a oposição partidária está a fazer contas… ao que tem fora do país. Acreditarã­o nesta nova cruzada de João Lourenço todos aqueles que sabem, até mesmo os que dentro do MPLA batem palmas, às segundas, quartas e sextas ao Presidente do partido e às terças, quintas e sá- bados ao vice-presidente, que em Angola a dependênci­a sócio-económica a favores, privilégio­s e bens, ou seja, o cabritismo, continuará a ser o método utilizado pelo MPLA para amordaçar os angolanos? Acreditarã­o nesta nova cruzada de João Lourenço todos os que sabem que o acesso à boa educação, aos condomínio­s, ao capital accionista dos bancos e das seguradora­s, aos grandes negócios, às licitações dos blocos petrolífer­os, está limitado a um grupo muito restrito de famílias escolhidas pelo MPLA? Também não interessa se acreditam ou não. O importante é que João Lourenço recebe os encómios dos países acocorados perante o petróleo angolano, que preferem negociar com um regime corrupto mas que diz combater a corrupção do que, eventualme­nte, com um que tenha uma base democrátic­a. Se calhar, pensam baixinhos os angolanos que usam a cabeça e não a barriga para analisar o seu país, para a cruzada de João Lourenço ser verdadeira seria preciso que o poder judicial fosse independen­te e que o Presidente da República não fosse – como acontece à luz da Constituiç­ão – o “cabeça-de-lista” (ou seja o deputado colocado no primeiro lugar da lista), eleito pelo circulo nacional nas eleições para a Assembleia Nacional. Se calhar seria preciso que não fosse o Presidente a nomear o Vice-presidente, todos os juízes do Tribunal Constituci­onal, todos os juízes do Supremo Tribunal, todos os juízes do Tribunal de Contas, o Procurador-geral da Republica, o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas e os Chefes do Estado-maior dos diversos ramos destas. Se calhar seria preciso que Angola fosse um Estado de Direito, coisa que manifestam­ente (ainda) não é.

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