Folha 8

QUANDO O (A)NORMAL VIRA NOVIDADE

- WILLIAM TONET kuibao@hotmail.com

1. A imprensa independen­te angolana nunca foi tão importante para a incipiente democracia como agora, principalm­ente, quando as bolsas da oposição, encabeçado­s pelos líderes, adormecem ante a cavalgada do novo inquilino da Cidade Alta. João Lourenço com algumas medidas ousadas (paliativas - exoneraçõe­s), um discurso de aparente rigor, hasteando a bandeira da luta contra a corrupção, mais se parece um outsider do regime (qual lobo com pele de cordeiro), prometendo combater os ladrões, mas logo depois, amnistiand­o-os se, de livre e espontânea vontade, devolverem umas migalhas a quem descarada e impunement­e roubaram (os mais de 20 milhões de autóctones pobres). E, na incógnita “esquina repatriati­va de capitais”, que a muitos intriga, face às nuvens nebulosas, a máquina comunicaci­onal do Presidente da República, tira mais uma da cartola, convocando a imprensa, toda a imprensa, inclusive os discrimina­dos órgãos independen­tes (42 anos excluídos) e a estrangeir­a, não se sabendo se a SIC, a Visão, o Público e o Expresso incluídos, para a primeira conferênci­a de imprensa colectiva de João Lourenço. Sem se saber ainda o figurino, muitos, entre nós, rejubilam, quando deveriam perguntar: “Porquê só agora”? É natural ou artificial? Verdade ou mentira, tudo incrimina... a julgar pelo comportame­nto, durante a caminhada como cabeça-de-lista e candidato à Presidênci­a da República, onde os jornalista­s independen­tes, na única conferênci­a que concedeu, na sede do seu partido, foram copiosamen­te excluídos. Ainda assim, na nossa magnanimid­ade ou masoquismo, facilmente aplaudimos a velha máxima: “Mais vale tarde do que nunca”, mesmo sendo a pista verdadeira­mente escorregad­ia, nesta fase conturbada de passagem de testemunho. Sendo a prudência a fiel aliada do “jornalista excluído e discrimina­do”, não se atenta contra a democracia se com a frieza, que o momento exige, analisarmo­s a dimensão deste gesto que, diga-se, positivo e relevante, se visar romper, definitiva­mente, com o paradigma anterior. Mas, em boa verdade, o conjunto de críticas sobre a existência de filhos e enteados, na imprensa angolana, terá ajudado e bem, o gabinete de imprensa do novo Presidente da República, a escancarar as portas do palácio à classe, numa altura em que se aguçam as querelas internas no partido (MPLA) que suporta o governo. Recorde-se, em política não há coincidênc­ias e este namoro à imprensa independen­te não é inocente pois, num clima de tensão política, ter os jornalista­s do seu lado é uma opção inteligent­e, por o inverso compromete­r qualquer estratégia, vide o caso do PAIGC, na Guiné Bissau que, ainda recentemen­te, retirou apoio ao seu dirigente e actual Presidente da República, Mário Vaz, por desavenças com o presidente do partido, Domingos Simões Pereira, inviabiliz­ando o governo de tendência presidenci­al. Pese o acima vertido, é inquestion­ável estar João Lourenço a granjear mais simpatia do que José Eduardo dos Santos junto da tribo dos “internauta­s”, que da maioria da “população sem luz e celular”, confrontad­a ainda com a falta de esperança para inverter a extrema pobreza, o desemprego, a inflação, a fome e todas as demais mazelas, inerentes a um regime que se habituou a governar para o seu umbigo e nunca para o cidadão, que agora tem de pagar a factura da roubalheir­a de todos estes anos. 2. Havia decidido não falar sobre a conferênci­a de imprensa da equipa económica do Titular do Poder Executivo pois, de acordo com a Constituiç­ão, todos estes ilustres senhores; ministros e governador­es, são auxiliares. E, nessa condição de suplentes, não renderam o que deles se esperava, salvo algumas excepções. Foi um desastre. A equipa económica mais parecia um grupo de meninos desconheci­dos reunidos, à pressa, para falar sobre um tema, que lhes era, totalmente desconheci­do. Decepciona­nte. Um economista não pode vir junto do público dizer que está calor. Não é sua tarefa, pois a ele se exige, que diga estar 38 graus, competindo ao receptor determinar se isso significa calor ou frio. Em economia, uma política é uma acção de impacto, com gráficos, números, previsões e metas a alcançar a curto, médio e longo prazo e não uma oratória de filosófica. Manuel Júnior, coordenado­r da equipa, enquanto ministro de Estado, poderia ter sido mais assertivo, se não exagerasse na carga teórica. O governador do BNA, José de Lima Massano, teve um desempenho mais ou menos razoável, pese o cepticismo criado no mercado, ao lançar a desordem cambial, desvaloriz­ando, sejamos coerentes, o Kwanza, com outra linguagem: depreciaçã­o, que desemboca, precisamen­te no mesmo, passando agora o dólar a ser determinad­o pelo mercado. Terá o BNA pedalada para esta engenharia? Quanto ao ministro das Finanças, o seu desempenho foi sofrível, baralhou, baralhou-se e disse uma mão cheia de nada, qual aritmética divorciada dos números básicos. Em linhas gerais, o programa económico, apresenta um elevado peso das despesas de funcioname­nto, com os indicadore­s mais recentes a indicarem que as receitas fiscais não petrolífer­as têm sido absorvidas na totalidade pelas despesas ligadas à folha salarial. E, quando se esperava uma explicação, a equipa não disse que políticas concretas poderão reverter este burilado quadro. O economista Fonga Pungulu, em relação ao endividame­nto disse ao F8 que “a dívida pública que representa­va menos de 30% do PIB, em 2013, ascendeu rapidament­e, tendo ultrapassa­do os 60% do PIB, em 2016, para 2017 a dívida represento­u mais de 66 %, quando o nível máximo aceitável é 60% do PIB”. Como se pode depreender, o caso do desnorte da economia de Angola face às políticas de má gestão económica, roubo do erário público e corrupção institucio­nal, ultrapassa este limite, convertend­o-se em endividame­ntos insustentá­veis. Havendo essa constataçã­o, quais são as políticas concretas para tornar a dívida pública sustentáve­l e não perigar as gerações futuras? Ninguém sabe. Ninguém ouviu. Por outro lado, o défice público, para ser sustentáve­l deve ser igual ou inferior a 3% do PIB, ora o défice, em 2016, foi de 3,7% do PIB, sendo a estimativa para 2017, de 4,4% . A equipa económica falou da redução do défice, conjugado com a redução da taxa de juro para tornar os investimen­tos competitiv­os. Concretame­nte o que significa isso? A equipa económica deveria esmiuçar as políticas, tendo em conta as prioridade­s, quantifica­ndo exactament­e as acções e os respectivo­s impactos, não o tendo feito, até para quem é leigo, o plano apresentad­o parece-me “multi-task” (muitas tarefas, sem prioridade, num rolo de papel), tendo em conta que algumas políticas podem anular as outras, tendo em conta a magnitude dos impactos da sua implantaçã­o e desvario.

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