Folha 8

AS LIÇÕES DE MO IBRAHIM

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A Fundação Mo Ibrahim distingue, ou critica, a boa governação em África. O magnata britânico de origem sudanesa continua a dizer as verdades, mesmo quando o mundo (sobretudo os governos africanos) olha para o lado e assobia. Ele, ao contrário de outros, sabe que a verdade dói mas cura. Mo Ibrahim responsabi­liza as “falhas monumentai­s dos líderes africanos após as independên­cias”, explicando sem meias palavras (coisa cada vez mais rara) que, “quando nasceram os primeiros Estados africanos independen­tes, nos anos 50 do século passado, África estava melhor em termos económicos”. Mo Ibrahim também diz que os interesses da Europa, por exemplo, apenas podem ser duravelmen­te garantidos pela democracia e não pelo apoio aos di-

tadores. Um recado claro – mas não escutado – que assenta plenamente no que se se passa há quase 43 anos em Angola. “Se a Europa quer garantir a longo prazo os seus interesses, ela tem todo interesse em se aproximar dos povos africanos. Pensar que a conivência com os ditadores seria benéfica é um grande erro”, diz Mo Ibrahim. Este empresário, que fez fortuna na telefonia celular ao criar o operador CELTEL que se tornou depois ZAÏN, já há muito que qualificou de “vergonhoso e um golpe à dignidade” a contínua dependênci­a de África em relação ao ocidente, tendo em conta os “recursos impression­antes” que abundam no continente. “Não se justificam a fome, a ignorância e a doença

que assolam África”, diz Mo Ibrahim, para quem a solução terá de passar obrigatori­amente por “bons líderes, boas instituiçõ­es e boa governação”, sem os quais “não haverá Estado de Direito, não haverá desenvolvi­mento”. Por isso, recorda, “havia uma África na qual o Estado era o único proprietár­io dos meios de informação, na qual a única televisão pertencia ao poder, na qual toda a informação era controlada. Esta África já não existe”. Por isso, “o que aconteceu na Tunísia e no Egipto nunca teria sido possível sem as tecnologia­s de informação e comunicaçã­o. Apesar dos esforços colossais, os Governos destes dois países não conseguira­m impedir a circulação das informaçõe­s. Nesta nova África, o povo é o úni-

co soberano e os nossos amigos europeus devem persuadir-se disso”. Comparando o posicionam­ento europeu com o norte-americano, Mo Ibrahim entende que “os americanos escolhem geralmente muito claramente a democracia e a luta contra a corrupção na sua relação com os Estados africanos. Seria bom que os nossos amigos Europeus fizessem o mesmo”. Em relação às posições da Europa, recorde-se que Margaret Thatcher, que em Maio de 1979 se tornou a primeira mulher a dirigir um governo britânico, proibiu nesse ano o seu enviado especial à então Rodésia de se encontrar com Robert Mugabe. E fê-lo para defender a democracia? Para lutar contra as ditaduras?

Não. O argumento, repare-se, era o de que “não se discute com terrorista­s antes de serem primeiros-ministros”. “Não. Por favor, não se reúna com os dirigentes da ‘Frente Patriótica’. Nunca falei com terrorista­s antes deles se tornarem primeiros-ministros”, escreveu – e sublinhou várias vezes – numa carta do Foreign Office de 25 de Maio de 1979 em que o então ministro dos Negócios Estrangeir­os, Lord Peter Carrington, sugeria um tal encontro. Ou seja, quando se chega a primeiro-ministro, ou presidente da República, deixa-se de ser automatica­mente terrorista. Não está mal. É verdade que sempre assim foi e que sempre assim será. Angola que o diga.

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