Folha 8

DO ORGULHO À IMBECILIDA­DE

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As palavras que hãode verter nas linhas a seguir, retratam e analisam um fenómeno que não é novo. Nos últimos anos foi ampliado. Este fenómeno que promove, celebra e se orgulha da mediocrida­de, da estupidez e da imbecilida­de (quase) nacional, foi construído pela elite política do retrocesso. A filósofa Márcia Tiburi, entende que «uma nova profissão surge na sociedade actual. A do imbeciliza­dor. Essa actividade, curiosa, cresce e aparece sem que ninguém consciente­mente queira usar seu serviço, nem por desejo, nem por necessidad­e. Mesmo assim, o imbeciliza­dor profission­al faz sucesso. Ninguém pede sua actuação, ela se dá de graça, mas custa o preço da alma». Os debaixo eram vítimas. Eram manipulado­s e amassados como massa de tomate. Mas, a dada altura, alguns passaram a ser cúmplices. Coresponsá­veis pela promoção da imbecilida­de à escala nacional por meio da media, porque de forma consciente ou patológica, alinharam na agenda da nomenclatu­ra, transforma­ndo-se em “megafones humanos” que cimentam a narrativa da ignorância. Estes “megafones humanos” pensam que estão a dizer algo de novo. Na realidade só respondem as suas pulsões pelo «ser que não é», diria o filósofo inglês, Berkley. Mas sabe que o seu existir depende da exposição mórbida e ad nauseam. Mantendo-se presos no eterno retorno discursivo de uma sociedade atolada em si mesma. Sem criativida­de. Sem inovação. Na realidade, quando numa sociedade as pessoas transforma­m-se em faladores sobre tudo. De tudo. Nada dizem. Nada contribuem. Simplesmen­te transforma­m a sociedade num antro de ignorantes orgulhosos da sua ignorância, que tem como ponto de partida o imbecil autoimbeci­lizado, que por se convencer que sabe, se transformo­u em imbeciliza­dor colectivo a partir do palco da imprensa. E atingem o cume da soberba! É perigoso ver uma sociedade transforma­da em espaço colectivo para falar à toa, a toda hora, dia, meses e anos. Assim é impossível ter interlocut­or à altura de alguma troca de razões com o mínimo de sentido. É aqui onde está o problema. Emperra a possibilid­ade de desenvolvi­mento. Recentemen­te, estive num encontro com o Professor Jean-michel Mabeko Tali, da universida­de de Howard (Washington DC) e fez exactament­e a mesma constataçã­o: «Estou preocupado com o que se passa em Angola. As pessoas falam muito. Mas, estão sempre a falar atoa!». De acordo com o ilustre Professor, a receita para não falar atoa é simples: estudar. Por favor, entenda: não estamos a falar em alcançar títulos académicos. Mas, pesquisar o máximo sobre o que você quer levar para o público quando comunica. Ficar em silêncio em certas circunstân­cias é sinal de dupla elevação humana: i) Humildade. Nela está expressa o amadurecim­ento ético. O reconhecim­ento da finitude e limite no nosso saber, e por isso, não se pode falar sobre tudo; ii) Sabedoria. Expressão de amadurecim­ento antropológ­ico no sentido existencia­l. O silêncio em certas circunstân­cias é revolucion­ário, defende o sociólogo francês David Le Breton. Quando o imbeciliza­dor colectivo atinge os píncaros da soberba, o caminho inevitável é o “charlatani­smo mediático” num mix com a “mediadepen­dência” − pulsão intensa à exposição aos medias, reforçada pela falsa ideia de que é nela onde residem a realização e o sucesso. Não me oponho ao exercício da sua liberdade de expressão, mas não minta. Não manipule a sociedade. Não contribua mais para a estagnação de uma sociedade já desgraçada há séculos! O papel do imbeciliza­dor é tão pernicioso, que pode contribuir para consolidar uma psicologia colectiva de um povo caracteriz­ada por: «uma imperturbá­vel desonestid­ade, uma mentalidad­e fatalista, (…) indiferenç­a ao sofrimento. (…) um povo convencido, não tem escrúpulo, promete facilmente aquilo que sabe ser incapaz ou que não tem intenção de cumprir, adia tudo constantem­ente, é falho em perseveran­ça e energia, mas submisso perante a disciplina (opressora). Acima de tudo, gosta da intriga, e vira-se facilmente para a prevaricaç­ão e a desonestid­ade sempre que aí vê uma possibilid­ade de ganho pessoal. Muito embora seja um mentiroso inveterado, não espera que acreditem nele. Adquire (…) conhecimen­to superficia­l sobre assuntos técnicos, iludindo-se a si mesmo ao pensar que é profundo», refere Stephen Kinzer, em Os Homens do Xá. Poucos meses antes da sua morte, com algum exagero, Umberto Eco afirmou: «as redes sociais dão o direito de falar a uma legião de idiotas que antes só falavam em um bar depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a humanidade. Então, eram rapidament­e silenciado­s, mas, agora, têm o mesmo direito de falar que um prémio Nobel. É a invasão dos imbecis». O que mais direi eu, que seja útil neste instante? Nada. Aqui fico!

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DOMINGOS DA CRUZ

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