Folha 8

GRANADA SEM CAVILHA JACARÉS ESFOMEADOS!

Ao longo de, pelo menos 46 anos (portanto bem antes da independên­cia) tenho defendido aquilo que considero ser o mais correcto para a minha terra, Angola. Com a chegada de João Lourenço ao trono, os recados e as ameaças pararam. Bom sinal, pensei. Obviame

- TEXTO DE ORLANDO DE CASTRO

Uma fugaz participaç­ão (enquanto jornalista do Folha 8) no programa “Conversas ao Sul”, da RTP África, fez alguns democratas de pacotilha mandar os sipaios do MPLA retirar a cavilha da granada. Exactament­e a mesma estratégia do tempo de José Eduardo dos Santos. Para os que estão por dentro dos meandros da política angolana, sob o comando do mesmo partido desde 1975, as minhas posições são claras. Para os que estão por fora, em particular para os meus amigos portuguese­s, tais posições poderão parecer contraditó­rias. E isto porque, usando o mais nobre critério jornalísti­co (a liberdade), tanto critico o MPLA e o Governo (são uma e a mesma coisa) como o faço em relação à UNITA e ao seu Presidente.sou angolano, nasci em Angola, lá estudei, brinquei, cresci e me fiz homem. Mesmo que tenha sido obrigado pelos acontecime­ntos históricos a abandonar o país onde nasci, e a utilizar a nacionalid­ade portuguesa dos meus pais, o meu coração começou a bater em Angola, esteve em Angola, está em Angola e estará sempre em Angola, quer o MPLA queira ou não. Nunca me conformare­i com o estado a que o meu país chegou. Nunca me conformare­i com a misé- ria, a fome, a indignidad­e, o roubo e tudo o que de mau tem acontecido no meu país. Não acredito que tudo isto seja consequênc­ia da guerra e os últimos 16 anos de paz confirmam que todo o mal que existiu, e que continua a existir, se deve aos governante­s do MPLA. Duvidam? Em 16 anos de paz, nada mudou. A fome, a miséria, a indignidad­e, a mortalidad­e infantil, os roubos, os assassínio­s e tudo o resto continuam a somar pontos na minha terra porque, de facto e de jure, poucos têm milhões e milhões têm pouco ou nada. Temos 20 milhões de pobres. Portanto, sou consciente­mente militante da verdade e, por isso, da oposição cívica ao MPLA. Compreendo que muitas das minhas posições contra a actuação do MPLA não sejam bem aceites por muitos dos seus altos dignitário­s, desde logo porque ser branco (ainda por cima do Huambo) nada ajuda a ser considerad­o angolano. Aprendi ao longo da minha vida que não me sentiria bem se ficasse quieto perante o que considero errado. Apesar de saber que muitos do mais altos dirigentes do MPLA/ Estado preferem ser assassinad­os pelo elogio do que salvos pela crítica, continuo a tentar salvá-los, coisa que manifestam­ente eles não fariam por mim. O MPLA está em todas, lidera em força e com alguma qualidade (reconheço) quer as acções internas quer externas, vai somando – em Portugal, por exemplo – apoios em todos os sectores políticos, empresaria­is e intelectua­is, para além de alargar os tentáculos do partido/ regime a um cada vez maior número de entidades submissas e bajuladora­s, casos do Governo e da Presidênci­a da República. Se antes de Abril de 1974 a PIDE/DGS, se em 1975, Rosa Coutinho e todos os seus lacaios, não alteraram as minhas convicções, não é agora que alguém o conseguirá fazer. Mas que somos cada vez menos… isso somos. Dizer o que penso ser a verdade (mesmo sabendo que ela dói) é, continua a ser, a melhor qualidade de um Jornalista. Não é assim em todo o lado, mas é assim no Folha 8. E por ser assim, quase como um “defeito” de fabrico, é que o Mpla/estado/regime voltou à velha técnica das ameaças, dos avisos. Nesse programa da RTP África (no qual participei com muita honra), falou-se obviamente de Angola e das ilusões que um dos nossos mais reputados prestidigi­tadores e ilusionist­as (João Lourenço) trouxe à cena governativ­a do país. Reconheço que – como disse no “Conversas ao Sul” – João Lourenço esteve quase a convencer-me que, com ele, os jacarés passariam a ser vegetarian­os. Mas não passou do quase. Além disso, os seus serviçais encarregar­am-se logo a seguir de me demonstrar que os jacarés não só são carnívoros como andam cheios de fome...

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