DO INFORTÚNIO DE MILLION À “FEZADA” DE CHRISTIAN
Nesta senda, primou para alguns a ambição de ficar com 5 por cento, equivalente a 25 milhões de dólares dos 50 mil milhões do financiamento que o grupo de cidadãos expatriados, liderados pelo tailandês Raveeroj Richtchoneanan, dizia ter disponível para investir em Angola, segundo revelou a comunicação social, como foi o caso de um cidadão eritreu chamado Million Issac Haile, de 29 ano de idade, que se transformou em pesadelo. De acordo com a acusação do representante do Ministério Público junto da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, para ser aceite no grupo e participar nas reuniões com os representantes de diversas instituições angolanas, o cidadão Million desembolsou, para começar, a módica quantia de 23 milhões de Kwanzas. Pouca sorte, em vez de ganhar os 25 milhões de dólares - já veremos como e por quê - acabou envolvido numa situação que levou os peritos do Serviço de In- vestigação Criminal (SIC) a retirá-lo, devidamente algemado, do luxuoso quarto do hotel Epic Sana, para o “internar” numa cela da cadeia de Viana. A vontade de Million ganhar dinheiro em Angola, sem se importar com os meios, levou-o a prestar apoio à organização, tendo inclusive abandonado a sua residência para se instalar no hotel Epic Sana, a fim de ficar mais próximo dos seus novos parceiros. Segundo o procurador José Coelho, sem especificar o dia e mês em que tal encontro ocorreu, “o arguido Million Haile conheceu os tailandeses no bar do hotel Epic Sana, tendo sido abordado pelo arguido Manin Wanitchanon” o que lhe valeu, em suplemento, ter agora de responder pelo crime de exercício ilegal de funções públicas ou profissão titulada, porque, “enquanto esperava pela grande oportunidade que surgiu com os tailandeses, prestava serviço de contabilidade para algumas empresas de conterrâneos seus residentes no país sem estar inscrito na Ordem dos Contabilistas (de Angola)” As informações preliminares prestadas pelo SIC e divulgadas pela imprensa, aquando da detenção do grupo, apontavam Million Haile como uma das vítimas. Teria sido aliciado com 5 por cento das acções da sociedade comercial Centennial Energy-comércio e Prestação de Serviços, que estava em vias de legalização em Angola. Segundo Paulo Sérgio, jornalista do jornal “O País”, essa “empresa” “estaria encarregue pela aplicação de 50 mil milhões de dólares pagos por via de um cheque do Banco Central das Filipinas com o número 4518164, de 24 de Novembro último, isto sem esquecer que outro misterioso cheque de 99 biliões de dólares foi apreendido no hotel. Em troca dos 5 por cento, Million teria de investir, ao todo, 50 milhões de Kwanzas, uma vez que, alegavam os seus sócios tailandeses, tinham mobilizado montantes de vulto num carregamento de arroz proveniente da Ásia. Embora não lhe tenha sido apresentada documentação relacionada com essa operação, Million aceitou, entregando os referidos iniciais: 23 milhões de Kwanzas”. O então chefe do Departamento Central do SIC, superintendente- chefe Tomás Agostinho, revelou à imprensa, aquando da apresentação pública dos arguidos, que “o dinheiro foi entregue a eles. Há documentos que atestam a sua recepção e há contratos formalizados entre as partes. Portanto, só a partir dessa amostra podemos tirar ilações sobre o que provavelmente ocorreria, tendo em conta a quantidade de propostas em posse deles”. Por outro lado, contrariamente a Million Haile, que perdeu dinheiro, Christian Albano de Lemos, sub-chefe da Polícia Nacional, 49 anos, “amigo” do eritreu e companheiro de processo, esse sim, terá conseguido amealhar uma boa quantia financeira com o esquema. Tinha sido “contratado pela empresária Celeste de Brito para trabalhar simplesmente como tradutor e segurança dos dez cidadãos estrangeiros envolvidos no caso - que tinham chegado ao país no dia 27 de Novembro último - e acabou por se tornar num dos principais promotores, remunerado, de encontros destes com altos funcionários do Estado”. Com o afastamento de Celeste de Brito da relação, depois de essa empresária ter metido a boca no trombone e revelado a burla junto do porta-voz do MPLA, Norberto de Castro, Christian passou, alegadamente, a trabalhar para altas patentes das FAA, com o general José Arsénio Manuel, presidente da cooperativa de militares Njango Yetu, um dos três arguidos que respondem em liberdade provisória, que, entre outras alegadas mordomias,
“pagou o valor de 700 mil kwanzas da casa em que Christian vivia, bem como, durante esse período, pagou a renda, e passou a entregar-lhe outros valores monetários que não foram contabilizados. O arguido Christian, alegadamente, também recebia dinheiro do arguido Raveeroj Richtchoneanan, que serviria para facilitar os encontros deste com as autoridades angolanas”, descreve o procurador junto à Câmara Criminal do Tribunal Supremo. Além disso, enquanto trabalhou para a empresária Celeste de Brito, Christian participou em todas as actividades realizadas entre ela e os referidos cidadãos estrangeiros. Aproveitou-se dos contactos que possuía e interpelou o director do Serviço de Migração e Estrangeiro, comissário-chefe Gil Famoso da Silva, a fim de obter vistos de trabalho para os arguidos, mesmo não reunindo os requisitos necessários, tendo-os posteriormente levado a uma audiência nessa instituição. Sobre este mesmo assunto, segundo a acusação, contactou o então presidente do Conselho de Administração da extinta Agência para a Promoção de Investimento de Exportações de Angola (APIEX), Belarmino Van-Dúnem, que anuiu ao seu pedido e também os recebeu em audiência. “Foi igualmente por intermédio do arguido Christian de Lemos que o então comandante-geral da Polícia Nacional, Alfredo Mingas “Panda”, tomou conhecimento da existência dos tailandeses no dia 11 Dezembro”, diz a acusação. Outro oficial da Polícia que também manteve contacto com os tailandeses por intermédio do sub-chefe Christian foi o comissário-chefe José Alfredo Chingango, que, à semelhança de Panda, foi arrolado ao processo como declarante.