TODOS (MAIS OU MENOS) JUNTOS
No âmbito do Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres de 2017, uma marcha juntou na capital angolana homens e mulheres de diferentes origens, desde as tradicionais zungueiras a políticos e activistas cívicos. “Mulher não é um saco de pancada”, “Maternidade não é um matadouro”, ou “Quero ser respeitada” foram algumas palavras de ordem dos manifestantes, que repudiaram a violência e a consequente “desagregação de famílias”. Sob o lema “Parem de matar as mulheres”, a marcha organizada pelo colectivo “Ondjango Feminista”, controlada de perto pelos efectivos da Polícia Nacional, percorreu algumas ruas da capital e terminou no Largo das Heroínas, no centro de Luanda, com discursos e testemunhos de casos de violência. A activista Cesaltina Cutaia, uma das coordenadoras do “Ondjango Feminista” (colectivo autónomo de activismo e edu- cação em prol dos direitos das mulheres angolanas), salientou os “índices elevados de violência contra a mulher” que o país regista. “Apesar de nós não termos estatísticas completas e sistemáticas, os números que nos chegam são muito grandes. Só no ano passado (2016) a média de casos de violência contra a mulher foi de 170 por dia e vários casos – às centenas – de violência sexual, que foram atendidos no Hospital Esperança”, disse. Cesaltina Cutaia demonstrou preocupação com a “crescente onda de violência”, agravada nos últimos meses em Luanda e não só, “sobretudo no âmbito da criminalidade que é seguida de rapto, violações e espancamentos e que culmina em morte”. “Porque a situação é preocupante, é revoltante e indigno. E como mulheres não nos sentimos seguras, daí que estejamos aqui a marchar para dizer ‘chega’ a todas as formas de violência que as mulheres sofrem”, sustentou. Testemunhos de mulheres vítimas de diferentes tipos de violência também foram apresentados, incluindo os de zungueiras. E violência por parte de quem? A vendedora ambulante Ana Elisabeth disse que este grupo é alvo de violência diária pelos agen- tes da fiscalização, devido à sua actividade. “Além dos fiscais, os policiais têm tido um comportamento desajustado. Batem nas senhoras e fazem disparos no ar, dão-nos corrida ao ponto de as senhoras, muitas delas, serem atropeladas”, afirmou. A vendedora ambulante recordou que estas zungueiras buscam o sustento para a família nas ruas, apelando às autoridades para criarem “locais apropriados para a venda dos respectivos negócios”. Feliciana Abel, de 20 anos, aproveitou o protesto para denunciar ter sido vítima de espancamento por desconhecidos, que a deixaram em coma durante um mês. “Era um desconhecido. Raptou-me, estava armado e naquele momento eu pensei que a minha vida atinha acabado. Começou a rasgar a minha roupa, a lutar comigo, bateu-me tanto que fiquei um mês em coma, levei uma surra tremenda e fiquei completamente descaracterizada”, recordou. Jovem artista, também conhecida como “Meduza”, Feliciana Abel explicou que deixou de cantar devido ao trauma que ainda carrega, pedindo justiça para o seu caso, até porque, referiu, o agressor continua livre. “Eu sou mulher, quero a minha liberdade, quero justiça e quero que a polícia encontre o homem que fez isso comigo. Somos livres, somos mulheres, temos os nossos direitos”, exortou. A organização “Ondjando Feminista” defende que o combate à violência contra as mulheres requer a adopção de acções e estratégias coordenadas por parte do Estado e dos seus órgãos, incluindo “leis que efectivamente protejam as mulheres em todos os espaços em que elas se encontram”. Dados de 2015 da Organização das Nações Unidas apontam para que 35% das mulheres em todo o mundo tenham sido alvo de violência doméstica ou sexual em algum momento das suas vidas.