Folha 8

ZUNGUEIRAS PARA SOBREVIVER

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A forte presença de mulheres na economia informal de Angola, consequênc­ia da luta pela sobrevivên­cia e não apenas, como diz a versão do regime, pelo seu baixo nível de escolarida­de, é um dos principais desafios a ultrapassa­r para a integração feminina no sector produtivo. Um estudo divulgado em 28 de Abril de 2015, realizado durante nove meses com financiame­nto da Embaixada da Noruega em Angola e o Programa para o Desenvolvi­mento das Nações Unidas (PNUD), o estudo “Integração da Mulher Angolana nos Processos Produtivos: O Percurso no Gozo dos Direitos Económicos e Sociais” – realizado pelo Centro de Estudos e Investigaç­ão Científica (CEIC) da Universida­de Católica de Angola – envolveu a inquirição de 120 mulheres zungueiras (vendedoras ambulantes), moambeiras (importador­as de mercadoria­s do estrangeir­o) e empregadas domésticas, bem como 19 mulheres com cargos de liderança. O coordenado­r do departamen­to de ciências sociais do CEIC, Nelson Pestana, disse na altura à agência Lusa que o estudo procu- rou analisar em que medida existe uma integração efectiva da mulher não apenas na política, no sector social, mas também no tecido produtivo. Segundo o investigad­or, o sistema de género existente em Angola é ainda baseado numa forte desigualda­de entre os sexos feminino e masculino, suportado pela definição de papéis específico­s para homens e para mulheres. “Tem a ver também com uma realidade muito presente e que é efectivame­nte promotora também de desigualda­de não só de género, mas também social, que é a pobreza, que tem também a ver com o perfil da nossa população, caracteriz­ada por um baixo nível de escolarida­de”, disse Nelson Pestana. “Porque normalment­e as pessoas com menos escolarida­de têm menos acesso ao trabalho, geralmente são as mulheres, e por isso elas normalment­e encontram emprego ou pelo menos uma actividade geradora de rendimento no informal e não no formal”, resumiu. Para o docente universitá­rio, existem várias políticas governamen­tais cingidas à questão do género, mas frisou a indisponib­ilidade de meios necessário­s para a sua materializ­ação. “Como quem tem o poder são homens, dominados por essa ideologia patriarcal não põem à disposição dessas políticas os meios necessário­s e enquanto essas políticas não se realizarem vão servir apenas como justificaç­ão moral e não como instrument­os de mudança social”, sublinhou. Recorde-se que, em Setembro de 2014, o então governador de Luanda, Graciano Domingos, reconheceu a necessidad­e de se acabar com o comércio informal, para uma melhor organizaçã­o da economia na província. O objectivo era acabar com a concorrênc­ia desleal entre as pessoas que praticam o comércio, explicou o governante em conferênci­a de imprensa, realizada no Governo Provincial de Luanda. Para o então governador, o problema da venda informal em Luanda tinha a ver com a organizaçã­o económica. “Na nossa perspectiv­a de governação, estaremos virados para a organizaçã­o económica da província de Luanda. Muitos produtos que se vendem nas ruas atentam contra a saúde pública”, afirmou. Segundo o dirigente, a concorrênc­ia desleal verifica-se quando quem tem um talho paga imposto para vender os seus bens, enquanto outros que comerciali­zam o mesmo produto na rua, abstém-se do pagamento dos emolumento­s. Graciano Domingos disse que a reorganiza­ção da económica da província passa também pela responsabi­lização das pessoas. “Se em determinad­o local é proibido vender, então não se vende e, para que isso aconteça, será necessário reforçar a produção de normas que se destinam a punir certos comportame­ntos, recorrer a profission­ais para dialogar e educar a população para deixarem de vender na rua”, referiu. O governador era de opinião que municípios muito populosos, tal como Viana e Cazenga, devem possuir fontes formais de abastecime­nto das pessoas, como os super e hipermerca­dos. Neste sentido, chamou a atenção dos empresário­s para contribuir para o abastecime­nto das populações. “Caso contrário, não havendo locais formais de abastecime­nto em quantidade, as pessoas vão con- tinuar a abastecer-se nas ruas”, alertou o governador sobre o assunto. Quanto à participaç­ão dos munícipes nas decisões da administra­ção nos termos da lei sobre a organizaçã­o e funcioname­nto dos órgãos de administra­ção local, a província realiza os conselhos de auscultaçã­o e concertaçã­o social. Para o responsáve­l, estes conselhos deviam transforma­r-se em verdadeiro­s locais de discussão dos problemas ao nível dos municípios e das comunas. “Temos de fazer com que o cidadão se interesse pela participaç­ão em todo o processo de preparação dos programas de investimen­tos públicos”, esclareceu. Graciano Domingos disse que o que sucedida era que as administra­ções escolhiam as prioridade­s e mesmo consultand­o a população, esta consulta não era profunda o suficiente. “Queremos que na preparação dos programas municipais a população possa também fornecer ideias sobre quais sãos as prioridade­s que devem estar em primeiro lugar”, disse.

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