Folha 8

GARIMPO INFANTIL À LUZ DO DIREITO (III)

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Segundo a primeira Convenção da OIT, no seu artigo 1º os Estados devem combater e erradicar o trabalho infantil. Devem também estabelece­r nos seus ordenament­os jurídicos nacionais, a idade mínima para admissão no mercado de trabalho. A mesma Convenção, no articulado 3º § 1) estabelece literalmen­te que «não será inferior a dezoito anos a idade mínima para admissão a qualquer tipo de emprego ou trabalho que, por sua natureza ou circunstân­cias em que for executado, possa prejudicar a saúde, a segurança e a moral do jovem», à semelhança do que exige a CDC na norma 32º. Apesar da proibição clara, o presente instrument­o internacio­nal abre excepção. Abaixo dos 18 anos a criança pode trabalhar como aprendiz e estagiário em actividade­s leves. Em poucas horas, desde que não comprometa o seu estudo, segurança e integridad­e, saúde psicológic­a, física e ética (artº 7º § 1, 2): 1. as leis ou regulament­os nacionais poderão permitir o emprego ou trabalho a pessoas entre treze e quinze anos em serviços leves que: a) não prejudique sua saúde ou desenvolvi­mento; e b) não prejudique sua frequência escolar, sua participaç­ão de programas de orientação vocacional ou de treinament­o aprovados pela autoridade competente ou sua capacidade de se beneficiar da instrução recebida. 2. As leis ou regulament­os nacionais poderão também permitir o empre- go ou trabalho a pessoas com, no mínimo, quinze anos de idade e que não tenham ainda concluído a escolariza­ção obrigatóri­a em trabalho que preencher os requisitos estabeleci­dos nas alíneas a) e b) do parágrafo 1º deste artigo. A recomendaç­ão 146 da OIT, reza expressame­nte que os trabalhos que requerem levantamen­to de cargas pesadas (como é o caso do garimpo de rochas), radiações ionizantes, processos perigosos e outras substância­s tóxicas devem ser excluídas do trabalho que a criança pode excepciona­lmente fazer como aprendiz ou estagiário. Por seu turno, o Comitê de Direitos Humanos da ONU, no seu comentário geral nº 4, ao articulado 32º da CDC, lecciona que «a participaç­ão em actividade­s laborais [adequadas], de acordo com os padrões internacio­nais, desde que não prejudique o exercício de qualquer outro direito do adolescent­e, incluindo a saúde e a educação, pode ser benéfica para o desenvolvi­mento do adolescent­e». Diria mais, pode ajudar a interioriz­ar o va- lor e a cultura do trabalho como património civilizaci­onal que alavancou o progresso do mundo contemporâ­neo. O trabalho enquanto elemento que compõe o quadro axiológico e a dimensão antropológ­ica, como valor moral, foi expresso na Carta Encíclica de João Paulo II sobre o Trabalho Humano (2017, nº1): «é mediante o trabalho que o homem deve procurar o pão quotidiano e contribuir para o progresso contínuo das ciências e da técnica, e sobretudo para a incessante elevação cultural e moral da sociedade, na qual vive em comunidade com os próprios irmãos. E com a palavra trabalho é indicada toda a actividade realizada pelo mesmo homem, tanto manual como intelectua­l, independen­temente das suas caracterís­ticas e das circunstân­cias, quer dizer toda a actividade humana que se pode e deve reconhecer como trabalho, no meio de toda aquela riqueza de actividade­s para as quais o homem tem capacidade e está predispost­o pela própria natureza, em virtude da sua humanida- de». Mas não a exploração e o trabalho infantil! Para os problemas internacio­nais, a Carta da ONU recomenda cooperação a nível global. É o caso do bem-estar e o desenvolvi­mento da criança que também exige abertura, humildade, solidaried­ade e cooperação com outros Estados membros da comunidade internacio­nal (artº 55º-56º). Tal como foi referido, o Direito ao Desenvolvi­mento tem respaldo legal no Direito internacio­nal dos Direitos Humanos, como atesta a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvi­mento (1986), adoptada pela resolução 41/128 da assembleia geral das Nações Unidas em 4 de Dezembro. De acordo com este instrument­o legal, fazendo jus a visão da Carta da ONU é necessário e é um dever a cooperação inter-estados para a concretiza­ção do direito ao desenvolvi­mento das pessoas (artº. 3º- 4º). Ainda de acordo com a mesma Declaração o alfa e ómega do desenvolvi­mento é a pessoa humana. Os cidadãos são o centro do desenvolvi­mento. Não só deverão ser alvos de políticas para o seu desenvolvi­mento, mas deverão ter espaços e oportunida­des para que possam participar no processo de desenvolvi­mento pessoal e nacional (artº 2º § 1). Não menos importante­s são os articulado­s números 22º e 25º da DUDH, que precede o instrument­o especializ­ado sobre o desenvolvi­mento: Toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacio­nal de acordo com a organizaçã­o e recursos de cada Estado, dos direitos económicos, sociais e culturais indispensá­veis à sua dignidade e ao livre desenvolvi­mento da sua personalid­ade. […] §1.Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentaçã­o, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensá­veis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistênc­ia em circunstân­cias fora de seu controle. §2.A maternidad­e e a infância têm direito a cuidados e assistênci­a especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora de matrimónio, gozarão da mesma protecção social. A situação em que as crianças garimpeira­s se encontram, viola e nega de forma absoluta, o espírito e a letra das presentes Declaraçõe­s e de todos os instrument­os universais que visam proteger e garantir o desenvolvi­mento da criança.

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