Folha 8

SABUJICE TAMBÉM UNIVERSAL

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“O corolário desta criadagem sabuja é a nota de duas linhas (envergonha­da mas diligente) publicada pelo Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, congratula­ndo João Lourenço por uma vitória que, roubo à parte, nem sequer foi ainda formalment­e anunciada. A minha vergonha como cidadão português não pode hoje comparar-se ao justificad­o orgulho cívico do povo angolano”, afirmou na devida altura, em declaraçõe­s ao Folha, João Paulo Batalha, presidente da Associação Cívica Transparên­cia e Integridad­e. Como se sabe e como, aliás, já aqui foi escrito, Marcelo Rebelo de Sousa é o político português mais habilitado (a par do primeiro-ministro António Costa) para não só cimentar como também alargar as relações de bajulação e servilismo com o regime de Angola. Marcelo sabe que – do ponto de vista oficial – Angola (ainda) é o MPLA, e que o MPLA (ainda) é Angola. Portanto… Siga a fanfarra. Angola é um dos países lusófonos com a maior taxa de mortalidad­e infantil e materna e de gravidez na adolescênc­ia, segundo as Nações Unidas. Mas o que é que isso importa a Marcelo Rebelo de Sousa? Importante é realçar que “o juízo universal” coloca João Lourenço (como antes colocara José Eduardo dos Santos) como um estadista de renome universal. Aliás, muitos dos angolanos (70% da população vive na miséria) que raramente sabem o que é uma refeição, poderão certamente alimentar-se com esse calórico cardápio do “juízo universal”. No âmbito do “juízo universal”, Portugal continua de cócoras. E se esteve nessa posição em relação à Guiné Equatorial, é mais do que justo que também esteja relativame­nte à Angola do MPLA. Custa a crer, mas é verdade que, no contexto do “juízo universal”, os políticos portuguese­s (com excepção dos do Bloco de Esquerda) já nem esforço fazem (tal é a habituação) para procurar legitimar o que se passa de mais errado com as autoridade­s angolanas, as tais que estão no poder desde 1975. Recorde-se que, por exemplo, mesmo antes do advento do “juízo universal”, já o general Bento dos Santos Kangamba, igualmente sobrinho de Eduardo dos Santos e intelectua­l de elevada craveira canina, elogiou a eleição nominal (coisa que em Angola nunca existiu) de Marcelo Rebelo de Sousa, apelando ao seu papel como “mediador” nas relações entre os dois países. “Neste momento não temos que ter dirigentes com muito fogo-deartifíci­o entre os dois países e sim com calma e paciência para ultrapassa­rmos os problemas. Portugal não pode ser o país onde se criam problemas a Angola, mas onde se resolvem os problemas de Angola, espero esse papel de mediador dele”, disse o general num português que, compreensi­velmente, teve de ser traduzido para… português, embora deixe a quilómetro­s o portu- guês “falado” por esse paradigma da lusofonia que se chama Guiné Equatorial. Naquilo que agora se poderá chamar de “juízo (pré) universal”, Bento dos Santos Kangamba destacou também a “política muito madura” em Portugal, que “beneficia a democracia” do país, tendo em conta as eleições que deram a vitória a Marcelo Rebelo de Sousa. “Seria um muito bom sinal. Não tem como os portuguese­s estarem contra Angola, não tem como os angolanos estarem contra os portuguese­s. Nós estamos condenados a viver juntos, a estar juntos, é a mesma língua, vivemos juntos, sãs as mesmas famílias, os nomes são iguais”, recordou o general. No dia 27 de Novembro de 2015, o secretário­geral do MPLA, Julião Mateus Paulo “Dino Matrosse”, disse em entrevista/recado/encomenda à agência Lusa, esperar que o novo Governo socialista português “mantenha relações boas” entre os dois estados. Já era uma antevisão premonitór­ia do “juízo universal” agora celebrizad­o por Marcelo Rebelo de Sousa. O dirigente angolano falava à margem da reunião anual da Internacio­nal Socialista, em Luanda, encontro em que a comitiva portuguesa do PS foi aplaudida pelos restantes representa­ntes da IS. “As nossas relações entre povos, estados, não podem ser perturbada­s, seja qual for a situação. Seja quem vier, quem estiver lá em Portugal a dirigir, nós teremos sempre as melhores relações com o Estado, Governo ou com o povo português”, afirmou Julião Mateus Paulo “Dino Matrosse”. O secretário-geral do MPLA, partido no poder em Angola desde 1975, sublinhou na altura que as relações com o PS “nunca foram más”, apesar da acção de algumas “alas”, mas algo que “já pertence ao passado”. “Nós não damos muita importânci­a àquilo que dizem contra nós. O que nós queremos é que quem estiver em Portugal tenha e mantenha relações boas com Angola. Existem relações entre nós, até quase familiares”, insistiu o então dirigente do MPLA.

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PRESIDENTE DE ANGOLA, JOÃO LOURENÇO

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