DECLARAÇÃODEBENS
Imaginemos (imaginar ainda não é crime, mas pode dar prisão – basta João Lourenço dizer) que o Estado angolano é uma entidade de bem. Assim sendo, acreditamos no Procurador-geral da República, Hélder Pitta Gróz, quando ele afirmou, em Janeiro, que o Presidente João Lourenço tinha sido o primeiro a apresentar a sua declaração de bens. Como então se disse, e nós aplaudimos, era uma forma de dar o exemplo aos membros do seu Executivo e, também, a outras individualidades e até mesmo aos milhões de angolanos que nem sabem o que significa ter bens. A Declaração de Bens é (ou deveria ser) apresentada em envelope fecha- do e lacrado, até 30 dias após a tomada de posse ou início de funções, junto da entidade que exerce poder de direcção, de superintendência ou de tutela, que a remete, no prazo de oito dias úteis, ao Procurador-geral da República. Hélder Pitta Gróz explicou na altura (Janeiro, recorde-se) que a PGR estava a ter uma louvável (dizemos nós) pedagogia para mostrar a todos aquele a quem a decisão é aplicada que nesse âmbito cabem rendimentos, títulos, acções ou qualquer outra espécie de bens e valores, localizados no país ou no estrangeiro. A declaração de bens é obrigatória (se bem que esta questão da obrigatoriedade é muito discu- tível e talvez inconstitucional para alguns) para os titulares de cargos políticos providos por eleição ou nomeação, magistrados judiciais e do Ministério Público, gestores e responsáveis da administração central e local do Estado. Em teoria (o que já não é mau), os gestores de património público afectos às Forças Armadas Angolanas e Polícia Nacional, os gestores responsáveis dos institutos públicos, dos fundos e fundações públicas e empresas públicas também estão sujeitos à apresentação da declaração. Também os deputados devem declarar o seu património. A Declaração é (isto é como quem diz!) actualizada a cada dois anos e em caso de incumprimento prevê a punição com pena de demissão ou destituição, sem prejuízo de outras sanções previstas por lei. E assim se chegou ao final de Março. Ora então, a PGR afirma que vai fazer o levantamento geral de todas as pessoas que estão sujeitas a fazer a declaração de bens, à luz da Lei da Probidade Pública, para se saber quem está em falta para – diz o vice-pgr, Mota Liz – começar a desencadear os procedimentos de responsabilização. Portanto, e porque mais uma vez as pessoas nomeadas ou reconduzidas por João Lourenço estão algo esquecidas, Mota Liz defendeu em Março a criação de mecanismos para fiscalizar e respon- sabilizar as entidades sujeitas a apresentação de declaração de rendimentos e por qualquer razão não o façam. Mota Liz garante que a PGR vai ter espaço suficiente, capacidade e recursos humanos para verificar, caso a caso, quem fez a declaração de bens e quem não fez. Isso permite concluir que todos são sérios… mas uns são mais sérios do que outros. “A declaração de bens não é um fim próprio, é um meio instrumental para a garantia da probidade. Outras acções e programas para garantir a probidade, para assegurar e combater a impunidade e garantia da transparência vão continuar a ser desenvolvidas”, disse o magistrado.
E disse muito bem. Veremos se daqui a alguns meses não teremos a repetição deste mesmo filme. ( E por falar em probidade. “A Lei da Probidade Pública reflecte a vontade e o esforço do Estado angolano em moralizar o exercício das funções públicas e combater a corrupção”. Isto foi dito, publicamente, em Novembro de 2011. Não, não foi José Eduardo dos Santos quem disse, nem Isabel dos Santos. Foi dito exactamente pelo então magistrado do Ministério Público, Luís de Assunção Pedro da Mota Liz, hoje vice- procurador- geral da República por escolha de João Lourenço.) O vice- procurador- geral da República disse que – afinal – há muitas entidades ( certamente por estarem ocupadas na defesa dos direitos dos nossos 20 milhões de pobres) que ainda não fizeram a declaração de bens. Benevolente, Mota Liz acredita que tal possa ter acontecido porque se calhar ignoram as consequências que podem advir do desrespeito da lei. Se calhar é isso. São todos impolutos cidadãos, não se prevendo por isso que desrespeitem a lei de forma consciente… Muitos dos deputados questionam a eficácia do modelo de declaração de bens. Primeiramente era em envelope fechado e lacrado. Agora não. Existem três modelos, o fechado, semi-aberto e um aberto. Isto porque, explicou Mota Liz, o modelo fechado, utilizado em Angola, tem uma eficácia reduzida e a PGR vai continuar a dialogar com os deputados e a sociedade para avaliar a necessidade de alguma alteração da lei.