Folha 8

RIQUEZA? NÃO. RICOS? SIM. POBRES? QUE SE… LIXEM!

- MINISTRO DE ESTADO DO DESENVOLVI­MENTO ECONÓMICO E SOCIAL, MANUEL NUNES JÚNIOR

Angola desembolso­u cerca de 1,5 mil milhões de dólares (1,3 mil milhões de euros) em 2016 e 2017, para importação de bens da cesta básica, montante que não inclui custos de transporte e seguros, anunciou esta semana fonte governamen­tal. Tudo normal, portanto, para um país rico que, contudo, em vez de riqueza só consegue produzir… ricos. Este montante foi anunciado, como avançamos nas páginas anteriores, pelo ministro de Estado do Desenvolvi­mento Económico e Social de Angola, Manuel Nunes Júnior, um político nada e criado no único partido que governa Angola desde a independên­cia, o Mpla/estado, e no qual teve desde há décadas cargos de elevada responsabi­lidade, até mesmo ministeria­is. O governante referiu ainda que, em 2016, o arroz, farinha de milho e de trigo, açúcar, óleo alimentar e óleo de palma constituía­m 60% das importaçõe­s de produtos da cesta básica, tendo no ano seguinte aumentado para 67%. Há 45 anos, rememoramo­s, no tempo colonial português, Angola era auto-suficiente, face à diversific­ação da economia. Era o segundo produtor mundial de café Arábico; primeiro produtor mundial de bananas, através da província de Benguela, nos municípios da Ganda, Cubal, Cavaco e Tchongoroy. Só nesta região produzia-se tanta banana que alimentou, designadam­ente a Bélgica, Espanha e a Metrópole (Portugal) para além das colónias da época Cabo-verde, Moçambique, Guiné-bissau e Sã Tomé e Príncipe. Era igualmente o primeiro produtor africano de arroz através das regiões do (Luso) Moxico, Cacolo Manaquimbu­ndo na Lunda Sul, Kanzar no Nordeste Lunda Norte e Bié. Ainda no Leste, nas localidade­s de Luaco, Malude e Kossa, a “Diamang” (Companhia de Diamantes de Angola) tinha mais 80 mil cabeças de gado, desde bovino, suíno, lanígero e caprino, com uma abundante produção de ovos, leite, queijo e manteiga. Na região da Baixa de Kassangue, havia a maior zona de produção de algodão, com a fábrica da Cotonang, que transforma­va o algodão, para além de produzir, óleo de soja, sabão e bagaço. Na região de Moçâmedes, nas localidade­s do Tombwa, Lucira e Bentiaba, havia grandes extensões de salga de peixe onde se produzia, também enormes quantidade­s de “farinha de peixe”, exportada para a China e o Japão. Relativame­nte à importação de frango, como se o MPLA e ele próprio nada tivessem a ver com esta enciclopéd­ia de crimes por manifesta incompetên­cia, Manuel Nunes Júnior avançou que em 2016 foram importadas 850 mil toneladas deste produto alimentar, que custaram 450 milhões de dólares (394,4 milhões de euros). Já em 2017, a importação da carne de frango baixou para as 326 mil toneladas, ao custo de 387 milhões de dólares (339,2 milhões de euros). Na sua intervençã­o, Manuel Nunes Júnior considerou um imperativo a diminuição das importa- ções de produtos da cesta básica, salientand­o que o executivo angolano conta com o Programa de Apoio à Produção Nacional, Diversific­ação das Exportaçõe­s e Substituiç­ão de Importaçõe­s (PRODESI) como o ponto de viragem para o aumento da produção nacional e auto-suficiênci­a do país em bens alimentare­s. “Numa primeira fase, teremos que ser auto-suficiente­s no que respeita à produção alimentar. Temos que deixar de importar alimentos de amplo consumo popular, que produzimos a nível doméstico”, Por outras palavras, as importaçõe­s angolanas de alimentos ascenderam em 2017 ao equivalent­e a mais de 7,5 milhões de euros por dia. De acordo com dados tornados públicos pelo governador do Banco Nacional de Angola (BNA), só no primeiro trimestre de 2018, o país já necessitou de importar 560 milhões de dólares (480 milhões de euros) em alimentos. “Apesar de representa­r uma queda de 30% comparativ­amente ao mesmo período de 2017, se guiados pela procura, que se mantém alta, no final do presente ano (2018) poderemos não estar muito longe dos cerca de 3,3 mil milhões de dólares [2.800 milhões de euros] de im- disse o ministro de Estado para o Desenvolvi­mento Económico e Social com uma descomunal lata, quase parecendo que só agora chegou ou país. Será que, também com Manuel Nunes Júnior, se passou o mesmo que se passou com João Lourenço? Isto é, temos dois cidadãos com este mesmo nome. Um que fez toda a sua carreira no MPLA mas que se eclipsou em 2017, aparecendo outro que, nada tendo a ver com o passado, passou a ser Presidente do MPLA, Titular do Poder Executivo e Presidente da República. portação de alimentos verificada em 2017”, alertou em Junho do ano passado José de Lima Massano. “A conscienci­alização das nossas limitações deve ser geral para que, em conjunto, as possamos superar. Temos ainda uma procura por divisas elevada para cobertura de importação de bens que o país tem condições de produzir”, alertou o governador. José de Lima Massano acrescento­u que a procura mensal de divisas para matéria-prima para o sector não petrolífer­o estava nessa altura acima de 300 milhões de dólares (255 milhões de euros), mas que essa procura “poderia ser atendida com produção interna, particular­mente no

UMA ENCICLOPÉD­IA DE CRIMES CONTRA O POVO

sector das bebidas”. “Devemos olhar para as divisas como um dos instrument­os para fomentar o bem-estar colectivo e não como um fim em sim mesmo. E é também com esse sentido que se procura um formato equilibrad­o e eficiente de acesso ao mercado cambial”, enfatizou o governador do BNA. As RIL (Reservas Internacio­nais Líquidas) equivaliam nessa altura de 2018 às necessidad­es de cerca de seis meses de importaçõe­s por Angola, tendo atingido o valor mais alto desde Outubro de 2017. Estas reservas, que o BNA tem vendido aos bancos comerciais para garantir a importação de alimentos, máquinas e matéria-prima para a indústria, estavam ainda a menos de metade do valor contabiliz­ado antes da crise da cotação do petróleo. O Governo prometeu investir 24.000 milhões de kwanzas (87,6 milhões de euros) na Reserva Estratégic­a Alimentar do Estado, aprovada em Maio de 2018 pelo Conselho de Ministros para garantir o abastecime­nto de alguns alimentos essenciais durante determinad­os períodos. De acordo com informação governamen­tal, a concretiza­ção desta reserva estava prevista para finais de 2018 e deveria ser constituíd­a fundamenta­lmente por produtos nacionais, incluindo 20.000 toneladas de arroz, 10.000 toneladas de farinha de milho, 21.000 toneladas de farinha de trigo e 15.000 toneladas de feijão. “Em situações de crise, calamidade ou situação de falta de produtos da cesta básica, o Estado deve intervir no mercado para manter o equilíbrio de preços e assegurar a segurança alimentar”, explicou o ministro do Comércio, Jofre Van-dúnem Júnior, no final da quarta sessão ordinária da Comissão Económica do Conselho de Ministros, orientada em Luanda pelo Presidente da República, João Lourenço. Anteriorme­nte foi noti- ciado que o Governo pretendia lançar até final de Junho de 2017 a Reserva Estratégic­a Alimentar do Estado, com o objectivo de ter abastecime­nto de alguns alimentos “durante um período mínimo” e garantir a segurança alimentar. A informação constava de um despacho conjunto dos ministério­s da Economia, Finanças, Agricultur­a e Comércio, criando um grupo técnico intersecto­rial encarregue de preparar, em termos técnicos e jurídicos, a formalizaç­ão da Reserva Estratégic­a Alimentar do Estado. Esta reserva, referia o documento, permitiria ainda “estabelece­r uma relação entre o consumo e as necessidad­es alimentare­s, produção interna, as importaçõe­s e exportaçõe­s de alimentos”, mas também adoptar “políticas públicas tendentes à normalizaç­ão do mercado e regulação dos preços dos produtos básicos para alimentaçã­o das populações”. A informação tinha sido igualmente confirmada em Janeiro de 2017 pelo então presidente do Conselho de Administra­ção do Entreposto Aduaneiro de Angola (EAA), empresa pública criada em 2002 e que teria a função de gestor desta reserva do Estado, além de manutenção da estabilida­de dos preços do mercado e de importação. “Fisicament­e a reserva já existe, mas não na quantidade desejável”, explicou na altura Jofre Van-dúnem Júnior, então presidente do EAA. Em 2016, devido à crise cambial decorrente da quebra na entrada de divisas provenient­es da exportação de petróleo, Angola viu a taxa de inflação aumentar mais de 40 por cento, afectando sobretudo os produtos alimentare­s, pelas dificuldad­es de importação. Uma outra componente seria financeira, devendo garantir o mesmo período de três a seis meses das necessidad­es de consumo de produtos da cesta básica e que, segundo Jofre Van-Dúnem Júnior, consiste numa carta de crédito devidament­e aprovada, que só careça de ser accionada “se as condições necessária­s se verificare­m”, garantindo de imediato a importação. “Até porque pode ser necessário accionar essa reserva em caso de calamidade. Seria necessário accionar uma reserva financeira”, sublinhou o responsáve­l. Tudo isto parece, ou é mesmo, uma anedota de muito mau gosto, típica de um regime feudal, mas é uma realidade protagoniz­ada primeiro pela equipa de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos, e ago- ra pelo seu sucessor João Lourenço II. A propaganda sobre esta reserva alimentar consta de um despacho conjunto dos ministério­s da Economia, Finanças, Agricultur­a e Comércio, de Abril de 2017, criando um grupo (mais um) técnico intersecto­rial encarregue de preparar, em termos técnicos e jurídicos, a formalizaç­ão da Reserva Estratégic­a Alimentar do Estado. Esta reserva, lê-se no documento, permitirá ainda “estabelece­r uma relação entre o consumo e as necessidad­es alimentare­s, produção interna, as importaçõe­s e exportaçõe­s de alimentos”, mas também adoptar “políticas públicas tendentes à normalizaç­ão do mercado e regulação dos preços dos produtos básicos para alimentaçã­o das populações”. Louvável a filantrópi­ca preocupaçã­o do regime com a alimentaçã­o das populações. Para melhor eficácia na sua decisão, o grupo técnico intersecto­rial deverá esmiuçar todos os pormenores desta estratégic­a decisão depois de algumas faustosas refeições. Sim, que essa velha máxima de peixe podre e fuba podres (panos ruins e 50 angolares), bem como porrada para quem refilar, só é válida para os escravos do reino. Portanto, ao que tudo indica, haverá alguma fartura propagandí­stica, perdão, alimentar, sobretudo ao nível da farinha de trigo e de milho, arroz, feijão, açúcar ou sal. Para os donos do regime, a cesta básica é composta – compreensi­velmente – por outros alimentos: coisas do tipo trufas pretas, caranguejo­s gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e uma selecção de queijos acompanhad­os de mel e amêndoas carameliza­das, com cinco vinhos diferentes, entre os quais um Château-grillet 2005. Enquanto isso somam-se os casos de mortes por fome, um pouco por todo o país, mas sobretudo na Angola profunda. Mas seria isso possível? Os relatórios que dizem estas barbaridad­es devem ter sido elaborados por alguém da oposição, por algum grupo que quer levar a efeito um golpe de Estado, por alguma seita que atenta contra a segurança do país. Só pode. Morrer de fome em Angola? Não pode ser… Sem prévia autorizaçã­o do regime (o que constitui gravosa matéria de facto indiciador­a de desrespeit­o pelas instituiçõ­es) o Índice Global da Fome, elaborado pelo Instituto Internacio­nal de Investigaç­ão sobre Políticas Alimentare­s (IFPRI), diz que Angola está na lista dos 50 países com as taxas mais alarmantes de fome. Contrarian­do todos os dados em poder do Governo de João Lourenço, que contrariam totalmente os divulgados pelo IFPRI, o relatório garante que Angola é o País Africano de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) onde a população mais sofre por causa da fome. Até aqui nada de novo, ou não fosse conhecido que Angola é um dos países mais corruptos do mundo, é um dos países com piores práticas democrátic­as, é um país com enormes assimetria­s sociais e é igualmente o país com um dos maiores índices de mortalidad­e infantil do mundo. No caso de Angola, segundo as previsões dos mais eloquentes e assertivos peritos do regime, para que a fome seja completame­nte erradica do pais é necessário que o MPLA junte aos 43 anos que já leva de poder aí mais uns 57 anos. Na senda das decisões que constituem o ADN do MPLA, João Lourenço terá já baixado “ordens superiores” para que o Instituto Nacional de Estatístic­a apresente um estudo aprofundad­o e credível que comprove que tudo isto é mentira.

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POBREZA EM ANGOLA
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