O CARNAVAL DEIXOU DE SER DO POVO
A maior manifestação cultural de Angola acontece nos dias 2, 3 e 5 de Março de 2019. Neste momento enquanto os grupos carnavalescos aprimoraram as coreografias no meio da folia, gáudio e animação tecemos uma breve análise do simbolismo do carnaval.
Aem-se verificado, a cada ano que passa, a despersonalização do carnaval angolano associada à sua praticabilidade elitizada por parte de quem define políticas culturais. Portanto, é factual que tal associação tem fragmentado, o discurso popular de ser, a maior manifestação cultural do povo angolano. Nota-se, claramente, que a génese do carnaval angolano tem sido adulterada, em parte, pela visão mercantil e, sobretudo, pelo discurso vago de inovação. Inovar não é, necessariamente, copiar o carnaval erótico do Brasil nem a sua nudez. Muito menos privatiza-lo. O carnaval é o povo. O carnaval é a combinação dos modus vivendi do nosso povo. Entendamos que, o carnaval angolano, não deve ser circunscrito à ideia mórbida da fixabilidade e da exclusão da expressividade. Queiramos ou não, o carnaval é indubitavelmente inerente a natureza do povo. Daí que o conjunto de manifestações culturais estendem-se às expressões de unidade nacional na diversidade cultural. A sua institucionalização deve ter em conta as diferentes sensibilidades culturais. Infelizmente, aos poucos, o carnaval angolano deixou de ser do povo; a festa da arbitrariedade das linguagens culturais. Contudo, atendendo as conjunturas e dinâmicas socioculturais, não se pretende uma abordagem conservadora sobre o carnaval angolano. Mas que não se confunda a privatização e institucionalização do carnaval angolano. Por exemplo, hoje, o carnaval só acontece na marginal de Luanda. Em alguns pontos do país passou a ser cada vez mais insignificante. Na província do Cunene, nem de forma privatizada nem institucionalizada, quase que não existe. Sonho com o dia em que o carnaval voltará a ser nas ruas do país; cada um ao seu jeito; ao seu estilo; à sua expressão cultural. É fundamental que o carnaval seja do povo para e com o povo; que o povo apresente suas coreografias sem se importar com as câmeras; que os prémios não nos dividam como povo; que o carnaval não seja tratado como mera mercadoria; que exponhamos abertamente as nossas indumentárias longe dos ideais de os panos de fumos. O carnaval deixou de ser do povo por várias razões. Elenquemos três: 1) a partir do momento da sua mercantilização; 2) a partir da falta de operacionalização cultural; 3) deixou de ser do povo à medida que já não constitui hábito exposicional e desfile estético nas ruas do país. Alguns viajados e iluminados, forçosamente, privatizaram o carnaval. Impuseram teoremas que desagregam valores e submetem os seus faze- dores às lamúrias e cantos de lamentos às portas do Ministério da Cultura. A inovação é necessária à medida que acrescenta valências significativas sem, necessariamente, amputar ou anular a participação activa do povo no carnaval. Em forma de síntese, o estado actual do carnaval angolano precisa, certamente, de todas as forças vivas para que não continue a ser uma manifestação coerciva. Outrossim, o carnaval não é um discurso político, é a festa cultural de um [nosso] povo. Sinto saudades dos tempos em que o carnaval era nosso [POVO]. *Coordenador do Movimento Cultural do Cunene