Folha 8

4 DE FEVEREIRO, 27 DE MAIO, FOME, FARELO, PORCOS E MPLA

- TEXTO DE ORLANDO CASTRO

Dizia o antigo ministro dos Antigos Combatente­s e Veteranos da Pátria… do MPLA, Kundi Paihama, que a história de Angola é rica em exemplos e actos indeléveis de heroísmo e valentia protagoniz­ados por milhares de patriotas angolanos, de Cabinda ao Cunene, e pelo sacrifício dos melhores filhos desta pátria. Sim, é o mesmo Kundi Paihama que disse: “Durmo bem, como bem e o que restar no meu prato dou aos meus cães e não aos pobres”. E por que não vai para os pobres?, perguntam vocês, eu também, tal como os milhões que todos os dias passam fome. Não vai porque não há pobres em Angola. E se não há pobres, mas há cães… Sim, é o mesmo Kundi Paihama que afirmou: “Eu semanalmen­te mando um avião para as minhas fazendas buscar duas cabeças de gado; uma para mim e filhos e outra para os cães”. Quanto aos angolanos, aos outros angolanos, citando de novo Kundi Paihama, que comam farelo porque “os porcos também comem e não morrem”. Ao falar então no acto central do 51º aniversári­o do início da luta armada de libertação nacional, em representa­ção do então “querido líder” José Eduardo dos Santos, Kundi Paihama disse que “é graças a este heroísmo que celebramos hoje o início da luta armada de libertação nacional contra o regime colonial português e comemoramo-lo sob o lema “Honremos a memória dos nossos heróis preservand­o a paz e democracia”. De acordo com o então ministro do farelo, foi a partir da inspiração e coragem e determinaç­ão desta acção que se considerou que a via armada era a única solução para derrubar o regime colonial, generaliza­ndo-se aos poucos em todo o território nacional, gerando um amplo movimento de libertação nacional. Não sei se foi a partir dessa inspiração que o MPLA também resolveu matar milhares e milhares de outros angolanos. Provavelme­nte foi. O MPLA nunca aceitou substituir a razão da força pela força da razão. Num outro massacre em Luanda, perpetrado pelas forças militares e de defesa civil do MPLA, visando o aniquilame­nto da UNITA e de cidadãos Ovimbundus e Bakongos, foram mortos mais de 50 mil angolanos, entre os quais o vice-presidente da UNITA Jeremias Kalandula Chitunda, o secretário-geral Adolosi Paulo Mango Alicerces, o representa­nte na CCPM, Elias Salupeto Pena, e o chefe dos Serviços Administra­tivos em Luanda, Eliseu Sapitango Chimbili. No massacre do Pica-pau, a 4 de Junho de 1975, perto de 300 crianças e jovens, na maioria órfãos, foram assassinad­os e os seus corpos mutilados pelo MPLA, no Comité de Paz da UNITA em Luanda. No massacre da Ponte do rio Kwanza, no dia 12 de Julho de 1975, 700 militantes da UNITA foram barbaramen­te assassinad­os pelo MPLA, perto do Dondo (Província do Kwanza Norte), perante a passividad­e das forças militares portuguesa­s que garantiam a sua protecção. Mais, muito mais, de 40.000 angolanos foram torturados e assassinad­os pelo MPLA em todo o país, depois dos acontecime­ntos de 27 de Maio de 1977, acusados de serem apoiantes de Nito Alves ou opositores ao regime. Entre 1978 e 1986, centenas de angolanos foram fuzilados publicamen­te pelo MPLA, nas praças e estádios das cidades de Angola, uma prática iniciada no dia 3 de Dezembro de 1978 na Praça da Revolução no Lobito, com o fuzilament­o de 5 patriotas e que teve o

seu auge a 25 de Agosto de 1980, com o fuzilament­o de 15 angolanos no Campo da Revolução em L No dia 29 de Setembro de 1991, o MPLA assassinou em Malange o secretário Provincial da UNITA naquela Província, Lourenço Pedro Makanga, a que se seguiram muitos outros na mesma cidade. Nos dias 22 e 23 de Janeiro de 1993, o MPLA desencadeo­u em Luanda a perseguiçã­o aos cidadãos angolanos Bakongos, tendo assassinat­o perto de 300 civis. Em Junho de 1994, a aviação do MPLA bombardeou e destruiu a Escola de Waku Kungo (Província do Kwanza Sul), tendo morto mais de 150 crianças e professore­s. Entre Janeiro de 1993 e Novembro de 1994, a aviação do MPLA bombardeou indiscrimi­nadamente a cidade do Huambo, a Missão Evangélica do Kaluquembe e a Missão Católica do Kuvango, tendo morto mais de 3.000 civis. Entre Abril de 1997 e Outubro de 1998, na extensão da Administra­ção ao abrigo do protocolo de Lusaka, o MPLA assassinou mais de 1.200 responsáve­is e dirigentes dos órgãos de Base da UNITA em todo o país. Por alguma razão, no dia 24 de Fevereiro de 2002 alguém disse: “sekulu wafa, kalye wendi k’ondalatu! v’ukanoli o café k’imbo lyamale!” (morreu o mais velho, agora ireis apanhar café em terras do norte como contratado­s.) Sekulu esse que também dizia: «Ise okufa, etombo livala» (Prefiro antes a morte, do que a escravatur­a). Não sei se ter memória é, nos tempos que correm, uma qualidade. Creio que não. Alguém disse que quem estiver sempre a falar do passado deve perder um olho. No entanto, acrescento­u que quem o esquecer deve perder os dois… Em 2018, dados governamen­tais davam conta que Angola tinha uma taxa de desnutriçã­o crónica na ordem dos 38 por cento, com metade das províncias do país em situação de “extrema gravidade de desnutriçã­o”, onde se destacava o Bié, com 51%. As províncias do Bié com 51%, Cuanza Sul com 49%, Cuanza Norte com 45% e o Huambo com 44% foram apontadas pela chefe do Programa Nacional de Nutrição, Maria Futi Tati, como as que apresentav­am maiores indicadore­s de desnutriçã­o. “São cerca de nove províncias que estão em situação de extrema gravidade de desnutriçã­o, sete províncias em situação de prevalênci­a elevada e duas províncias em situação de prevalênci­a média”, apontou Maria Futi Tati, em Junho de 2018. Um recente relatório da Organizaçã­o das Nações Unidas para a Alimentaçã­o e Agricultur­a (FAO) indicava que, em Angola, 23,9% da população passa fome. No relatório de 2018, a FAO refere que cerca de 821 milhões de pessoas no mundo passam fome, o que se traduz num aumento quando comparado com os dados de há dez anos. Em Angola, segundo a FAO, “23,9% da população passa fome”, o que equivale a que “6,9 milhões de angolanos não tenham acesso mínimo a alimentos”. Reparou Presidente João Lourenço? São, pelo menos, 6,9 milhões.

 ??  ?? ANTIGO MINISTRO DOS ANTIGOS COMBATENTE­S E VETERANOS DA PÁTRIA… DO MPLA, KUNDI PAIHAMA
ANTIGO MINISTRO DOS ANTIGOS COMBATENTE­S E VETERANOS DA PÁTRIA… DO MPLA, KUNDI PAIHAMA
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EX-VICE-PRESIDENTE DA UNITA JEREMIAS KALANDULA CHITUNDA
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