Folha 8

JOÃO MELO QUER SER GOEBBELS

- TEXTO DE ORLANDO CASTRO

Em resposta à posição transmitid­a pela empresária Isabel dos Santos, o ministro da propaganda do Governo de João Lourenço, uma espécie africaniza­da do ministro da Informação do Iraque, Mohammed Saeed Al-sahhaf, de seu nome João Melo, defende que “a área da Saúde está melhor” do que na altura do anterior governo. Baixaram a ordem superior para ele dizer isso e ele, submisso como no tempo de José Eduardo dos Santos, cumpriu. Assim, sorridente enquanto se olhava ao espelho e lhe perguntava se há ministro mais categoriza­do do que ele, João Melo afirmou que os que estão “furiosos” com a ministra da Saúde, que pretende reverter a privatizaç­ão de uma empresa feita no anterior governo, “são os que ganharam em negociatas como a da Angomédica”. Convenhamo­s, importa reconhecer, que em matéria de negociatas, se João Melo não é o perito dos peritos anda muito perto. Fala de cátedra e com conhecimen­tos de causas. A posição foi assumida pelo ministro da propaganda João Melo numa mensagem na sua conta na rede Twitter, numa aparente (só aparente porque todos os sipaios atiram a pedra e escondem a… pata) resposta a Isabel dos Santos, filha do ex-presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, que escrevera na mesma rede, que a ministra da Saúde, Sílvia Lu- tucuta, está a ser “alvo de muitas críticas” pelo “silêncio” que tem mantido face às reivindica­ções da classe médica em Angola. “A área da Saúde está melhor do que na altura em que o novo governo [do Presidente João Lourenço] assumiu [o poder, em Setembro de 2017]. Só não vê quem não quer. Aqueles que ganharam com as negociatas como a da privatizaç­ão da Angomédica [que o governo actual pretende reverter] estão furiosos com a ministra. Os problemas ainda são muitos, mas são resolúveis”, escreveu o nosso Mohammed Saeed Al-sahhaf ou, como também é conhecido, Paul Joseph Goebbels. “Ministra da Saúde de Angola, Sílvia Lutucuta, alvo de muitas críticas, continua no silêncio e não se pronunciou até agora em relação às manifestaç­ões dos médicos e às condições precárias de trabalho, bem como reivindica­ções dos mesmos para sua demissão”, escreveu, por seu lado, na segunda-feira, Isa- bel dos Santos. Em causa estão declaraçõe­s de Sílvia Lutucuta proferidas sábado, durante uma visita a várias instituiçõ­es de saúde na província de Luanda, em que acompanhou o Presidente João Lourenço, e em que anunciou que vai accionar os mecanismos legais para reverter a privatizaç­ão da empresa de fabrico de medicament­os Angomédica, adquirida pela Fundação Eduardo dos Santos (FESA) em 2014, em “contornos pouco claros”. O anúncio foi feito em plena Central de Compras de Medicament­os e Meios Técnicos (CECOMA), em cujo edifício funcionava a Angomédica, e pela qual paga uma renda mensal de 3,5 milhões de kwanzas (cerca de dez mil euros) à SAINVEST, subsidiári­a da FESA, excluindo os custos de energia, água e manutenção do edifício. A ministra da Saúde, porém, não explicou as razões que a levaram a afirmar haver contornos “pouco claros” na priva- tização da Angomédica. Não explicou porque a ordem superior nada dizia sobre isso. E, em matéria de MPLA, ninguém pode dar um passo não autorizado. Em 2005, disse Sílvia Lutucuta, o Ministério da Saúde assinou um contrato de exploração da Angomédica com a SAINVEST, em que esta última se comprometi­a a pagar ao departamen­to governamen­tal 5% da produção total. “Continuamo­s a achar que a Angomédica ainda pertence ao Estado, é património do Estado e vamos trabalhar no sentido de averiguar e passar esta unidade para património do Estado [Ministério da Saúde]”, disse a ministra, indicando, porém, que a fábrica “faz muita falta ao país”. Sílvia Lutucuta lembrou que, antes de 2005, a Angomédica funcionava em pleno e fabricava medicament­os essenciais, constituin­do então “uma mais-valia” para a economia angolana e para o próprio sector da Saúde. No mesmo dia em que a ministra efectuou as visitas, mais de uma centena de médicos angolanos marchou em Luanda para exigir melhores condições de trabalho, pedindo aos governante­s que “experiment­em” fazer as consultas médicas nos hospitais públicos de Angola, e não no estrangeir­o, admitindo a possibilid­ade de avançar para nova greve enquanto exigem a colocação de 1.500 colegas que se encontram no desemprego. Na ocasião, o presidente do Sindicato dos Médicos de Angola, Adriano Ma- nuel, lamentou o silêncio da tutela, a quem manifestou disponibil­idade para o diálogo, salientand­o que os profission­ais de saúde vão aguardar até 2 de Março para que o governo se pronuncie. Caso contrário, disse, o sindicato reunirá nesse mesmo dia e analisará a possibilid­ade de novas formas de luta, não pondo de lado a realização de nova greve, à semelhança da paralisaçã­o de três dias realizada em Novembro de 2018. Ainda no sábado, e ao longo dos vários momentos de uma visita que se prolongou por toda a manhã, a ministra da Saúde angolana nunca fez qualquer referência directa à acção de protesto dos médicos. No dia 19.02, também o Presidente de Angola reafirmou, igualmente através das suas contas no Facebook, Instagram e Twitter, que o sector da Saúde constitui uma prioridade do executivo e que “não descansará enquanto continuar a haver mortes por doenças evitáveis”. A posição de João Lourenço surge após as visitas realizadas no dia 16.02 ao CECOMA e aos hospitais Geral de Luanda e Josina Machel, onde se inteirou das dificuldad­es e dos projectos em curso, não tendo falado à imprensa. Também o chefe de Estado indicou que as visitas de sábado lhe permitiram reforçar a ideia de que a luta por um sistema de Saúde mais humanizado é “um desafio de todos (…) da família, escola, universida­de, das igrejas e até do próprio hospital”.

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MINISTRO DA COMUNICAÇíO SOCIAL, JOÃO MELO

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