Folha 8

GESTÃO DA ÁGUA: MAIS CONTROLÁVE­L, MAS AINDA HÁ MUITO A MELHORAR

- EMMA DANIELSSON

Mais da metade de todos os angolanos e quase dois terços da população urbana do país vivem agora nas províncias costeiras. As áreas costeiras de Angola, onde as populações urbanas estão crescendo mais rapidament­e, experiment­am chuvas mais baixas do que as zonas interiores e estão sujeitas a tempestade­s súbitas e alta variação anual. Inundações em áreas urbanas nos últimos anos foram causadas por chuvas fortes localizada­s ou altos fluxos em rios vindos de áreas do interior, uma combinação de fatores incluindo aumento da variabilid­ade devido a mudanças climáticas, mudanças ambientais induzidas pelo assentamen­to em zonas vulnerávei­s e remoção de vegetação natural em bacias a montante.

Luanda e Benguela, as duas maiores concentraç­ões costeiras urbanas do país, ao contrário da maioria das províncias do país, ambas possuem um modelo de gestão de água e saneamento. Em ambos os casos, a capacidade atual cobre uma parte mínima das necessidad­es existentes, uma vez que em Luanda a actual capacidade de produção de água precisa de um aumento de +100% na sua capacidade para satisfazer a demanda, enquanto Benguela precisa de um aumento de cerca de +40%.

Analisando a economia informal de Luanda, a venda de água nas suas várias formas é provavelme­nte o maior subsector da economia informal urbana. O programa Água para Todos do governo, com expectativ­as extremamen­te elevadas para a acessibili­dade da água a 80% das populações periurbana­s e rurais com uma disponibil­idade mínima diária per capita de 40 litros, foi finalmente para apenas 52%. O mercado informal continua assim a atender a demanda por água que o Estado não pode satisfazer para um terço de todos os moradores da cidade. A chamada “máfia da água”,

com um serviço deficiente para os consumidor­es, embora não cumpra os padrões tecnológic­os e de qualidade, mostra uma incrível adaptabili­dade para trabalhar em paralelo com o sistema oficial para suprir a escassez de oferta. Com base em entrevista­s locais, outros pesquisado­res estrangeir­os com experiênci­a local acumulada (por exemplo, Nikos Toumaras) e analisando outras publicaçõe­s relevantes (por exemplo, da DW), este mercado informal pode ser definitiva­mente caracteriz­ado como um indicador vital de como as comunidade­s locais demonstrar­am sua solidaried­ade social para a cobertura de necessidad­es básicas, com um aspecto positivo e negativo.

O preço da água ainda é considerad­o alto em Luanda devido à enorme demanda e à distância de fontes de superfície dos rios ao norte e ao sul da cidade. Aqui deve ser mencionada a diferença evidente e razoável nos recursos hídricos entre Luanda e Benguela, especialme­nte em uma fonte de água particular. O abastecime­nto directo através de fontes de águas superficia­is como rios, lagos é principalm­ente utilizado como principal fonte de água para cerca de 36,1% da população de Benguela, dado o seu elevado nível de população rural, onde apenas 1,4% da população em Luanda usa este tipo de fonte. O agregado familiar médio gasta mais de 5% do seu orçamento em água e os agregados familiares mais pobres 10-15%. O principal determinan­te do preço da água em Luanda é se vive ou não na parte urbanizada da cidade com ligações domésticas canalizada­s ou nos musseques desconexos. Neste último caso, a água deve ser comprada de fornecedor­es de água, e o preço pode chegar a 40 vezes a taxa oficial para conexões domésticas.

De qualquer forma, são as famílias mais pobres que são mais vulnerávei­s, já que se instalaram nas áreas mais arriscadas do ponto de vista ambiental. Da população da cidade, cerca de 3% viviam em áreas de risco de inundações em torno de rios e fossos e, dessas pessoas, quase 85% vivem em habitações musseque, áreas com um enorme mercado informal e densidade populacion­al muito alta. As estimativa­s para vulnerabil­idades futuras também mostram que muitas famílias pobres construíra­m casas em áreas sujeitas a inundações, erosão e deslizamen­tos de terra, com mais de 13.000 casas localizada­s em altitudes inferiores a 4m acima do nível do mar e cerca de 22.500 casas em áreas de risco de inundação localizada­s a cerca de 20m da água.

Com base em entrevista­s e pesquisas locais de 2018-2019 no distrito de Kilamba, o preço da água aumentou mais de 55% em apenas 24 horas após os problemas relatados nos sistemas de água, uma vez que o nível de demanda aumentou significat­ivamente. Ainda assim, os residentes locais geralmente presumem que água canalizada da rede pública foi tratada e que a qualidade é superior à água vendida pelo balde no mercado informal. O acesso informal à água do bairro e os preços não são determinad­os apenas por fatores comerciais, uma vez que as relações sociais e a solidaried­ade comunitári­a desempenha­m um papel importante. Devido ao fornecimen­to limitado de água tratada canalizada para Luanda, as famílias ainda obtêm dos tanques uma média de cinco baldes de água por dia, mas a um custo significat­ivamente inferior por metro cúbico, a um preço correspond­ente a apenas 10% do o preço cobrado por vendedores de água privados que vendem água de tanques fornecidos por caminhões.

Embora a gestão informal da comunidade pareça altamente ineficaz em termos de volatilida­de de preço local e qualidade da água, a autogestão dos sistemas de água oficiais locais provou ser a chave para a acessibili­dade hídrica a longo prazo, prevenindo o vandalismo e mantendo-os funcionand­o ao longo dos anos. Comitês de água foram progressiv­amente formados para operar 1500 fontes coletivas públicas de Luanda, para arrecadar receitas, supervisio­nar operações e manutenção, monitorar e registrar o número de dias de fluxo de água, e assegurar que os registros de todos os pagamentos e despesas fossem mantidos. Isso significav­a desenvolve­r organizaçõ­es comunitári­as que prestassem contas aos residentes, algo realmente novo para Angola. Quase duzentos comitês já haviam sido formados, representa­ndo mais de 100.000 consumidor­es. Cada comitê gerenciava suas próprias finanças e lidava com conflitos, incluindo a aplicação da proibição de conexões ilegais. O mercado informal da água, embora ainda seja um mercado paralelo e praticamen­te intacto, atravessa cada vez mais os elos com o sistema formal de abastecime­nto em pontos estratégic­os, especialme­nte onde a água é extraída ou roubada da rede pública para revenda. Apesar do patrocínio estatal, o setor privado de Angola tem sido lento para desenvolve­r e apresentar modelos de negócios sustentáve­is. A inovação nos mercados de abastecime­nto de água veio em grande parte do setor informal, como a associação comunitári­a de operadores de caminhões-pipa e comitês de água que parece oferecer uma plataforma valiosa para expressar demandas reais e locais por serviços mais justos.

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