O DESAIRE DO PROCESSO DE REPATRIAMENTO DE CAPITAIS E A DESCRENÇA EM QUEM NOS GOVERNA
Cinco anos após o início da Operação Lava Jacto, o Brasil ainda não conseguiu repatriar 700 milhões de dólares que se encontram em bancos suíços. Noutro caso, segundo a Tv Band Internacional, decorreram já 12 anos e não conseguiram também a devolução de uma enorme fortuna usurpada por Paulo Maluf, o maior trambiqueiro que passou pela Prefeitura de S. Paulo. Bom! E o Brasil é uma grande e influente nação. Em comparação, como se fosse possível, estamos muitos furos abaixo. Alguém acredita que o dinheiro levado supostamente de forma ilegal de Angola, cuja pertença se atribui ao Estado angolano, será mesmo repatriado ( a curto ou médio prazo)? Eu não! Nem com a entrada em cena de eventuais caçadores de fortunas, como se aventou por aí, porque a questão, para além de jurídica e financeira, passa, obrigatoriamente, pela concertacão, que infelizmente faltou em prol da defesa do interesse público.
É que, mesmo o acto de ‘ devolução voluntária de uma fortuna constituída de forma não justificada, até prova em contrário, do ponto de vista jurídico, constitui matéria de admissão ( voluntária) de prática de um crime, que os acusados, em primeira instância, não pretendem (nem vão) assumir. E, provavelmente por isso, há dificuldade em justificar quanto é que, efectivamente, já foi repatriado, de forma voluntária ou coerciva, e quem o fez. Tenho sérias dúvidas que, apesar da sua boa intenção, quem agora comanda o poder executivo, ainda que reeleito em 2022, venha a saborear esta eventual vitória.
Mas, o tempo dirá se tenho ou não razão. Enquanto isso, para o futuro, aplica- se bem aqui o argumento de sustentação do seguinte adágio, que exalta a esperteza e audácia de um campônio, que apertado por dificuldades, espetou um ‘ ki
lape’ e ludibriou o rei, prometendo em troca, a sua vida, se num ano não conseguisse que o seu macaco falasse. A justificação para tão ousada trapaça do campônio, foi simples: “Num ano, ou morre o rei, ou morre o macaco ou eu morro”.
Quem fez o ensino primário no meu tempo, saberá ao que me refiro. Por isso, embora seja quase certa a reeleição de JLO (não sabemos se também manterá a mesma filosofia de utilização de dinheiro e meios públicos para financiar a sua campanha e a do seu partido), até 2022 muita água ainda rolará por debaixo dessa ponte. Portanto, o tempo, neste caso do repatriamento de capitais, beneficia quem foi acusado de se lambuzar “no pote de mel” e desgasta quem se assumiu como promotor e condutor dessa cruzada, que apesar da sua aparência justa, hoje não deixa dúvidas que pela forma como foi concebida e está a ser conduzida, não produziu os resultados perspectivados. Ficou patente que faltou astúcia ou a matreirice política, que faltou justiça, porque assistimos ao tratamento diferenciado e a protecção de uns tantos, enquanto que, noutros casos, se partiu para excessos, passando por cima da Lei e subordinando instituições do poder judicial que devem ter exercício independente. O propósito foi atingir a imagem dos visados e enviar para fora, a mensagem mediatizada de algumas medidas do combate à corrupção. Terá mesmo resultado? Sinceramente, não acredito.
A prevalência da arrogância tem sido prejudicial ao processo, porque falou mais alto que a inteligência e a justeza de critérios, de princípios e algum sentido de Estado. Sem interferência, bastava deixar que a Sector da Justiça, apesar da sua falência no anterior ‘ regime’, fizesse o seu trabalho. Agora, o sentimento que fica patente é que o ‘ sambapito’ com que fomos brindados, começa a ter um certo sabor a amargo, afectando o interesse nacional ( ou as eventuais boas intenções da nova governação) e a estabilidade do Estado. E para agravar, quem está a comandar o nosso Titanic mantém- se renitente, embora não seja surdo. Mas não aceita que pode naufragar, se continuar a navegar em direcção ao iceberg. Está a ver a parte de cima e não aceita que o maior perigo está por baixo, em quem mais o aplaudiu: o povo, que a cada dia começa a ficar mais agastado com esse apertar do cinto, porque já percebeu que o verdadeiro projecto de quem governa, não é a eliminação gradual da pobreza. Continua despesista, não elimina as gorduras do aparelho administrativo do Estado, não faz mudanças estruturais profundas e a nossa condição social agravase a cada decisão que se anuncia.
Transmite a imagem de primazia no cumprimento de uma agenda pessoal em vez de um projecto de Estado, porque em contrapartida, tal como antes, a satisfação da luxúria está em primeiro plano e nesses casos, também não se observa sequer qualquer reacção do nosso novo patrão, o Banco Mundial. Porque será?
Vendo o cenário por esse monóculo, uma pergunta é incontornável: que serventia terá o dinheiro repatriado na efectiva solução dos nossos problemas, tendo como base esse modelo de governação que não é peixe nem carne, ou melhor, tal qual o camaleão, muda o disfarce conforme o interesse? Será para pagar o empréstimo da nova cidade administrativa, ou para comprar mais carros? Sim! Porque o que de bom continua a ser feito em diferentes sectores, ainda é continuidade da antiga gestão do país. Para se governar melhor, que vantagem temos em construir novos aposentos à beira mar, para acomodar a governação? Apenas para diminuir os encargos com o pagamento de rendas em edifícios construídos com dinheiro público ou empréstimos bancários não amortizados?
Num país em crise, endividado e com tantas carências, construir uma cidade administrativa para acomodar a governação, nem deveria constituir assunto para a Nação e muito menos para quem se propôs fazer diferente e melhor, e anda pelo mundo de mão estendida a solicitar apoio.
A grande revolta que se apossou de todos nós ao tomarmos conhecimento dessa decisão, começa a fazer transparecer que a nossa aposta na mudança vai perdendo o ânimo. Que decepção! Que grande bluff! E onde anda esse tal partido, a quem em voz alta e em bom tom, o seu novo líder pediu a fiscalidade dos actos da governação? Está mudo? Afinal, tirar os velhos para colocar novos não passou de mera maquiagem dessa máquina, que tal como no passado, continuará amordaçada ( e a amordaçar- nos) pela ditadura de quem lidera? Convenhamos, a esse nível, o que mudou foi o ocupante do cadeirão. O mais importante que é a democracia interna, a liberdade de pensamento e de expressão dentro e fora, mantém- se inalterável. É duro concluir que mudamos para ficar igual.
Triste destino o nosso.
* Jornalista