Folha 8

LOURENÇO TERÁ CORAGEM PARA AS REFORMAS?

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A Constituiç­ão e a Lei dos Crimes Contra a Corrupção, deverão, obrigatori­amente, ser reformadas, sem o viés maioritári­o de um partido, mas capitanead­os por legislador­es (deputados) sérios e imparciais, tementes à cidadania, assessorad­os por especialis­tas, operadores do Direito, independen­tes.

A seriedade para os angolanos acreditare­m, numa nova aurora e não na tentação incubada de perpetuaçã­o no poder, de uma ditadura cor-de-rosa, depois dos erros cometidos, com o falso combate à corrupção, que está a dilacerar o país, seria a ousadia de João Lourenço não se opor a uma verdadeira reforma constituci­onal.

Uma reforma que expurgaria da actual Constituiç­ão, o seguinte: a) a concentraç­ão de poderes, num homem só; b) a acumulação dos cargos de presidente de partido político, com o de Presidente da República; c) a nomeação discricion­ária dos juízes dos tribunais superiores e do Procurador-geral da República, pelo Presidente da República em desrespeit­o ao rito da indicação tríplice das magistratu­ras, judicial e do Ministério Público; d) o português, como única, língua oficial, em detrimento das línguas angolanas; e) a eleição do Presidente da República, através da lista de partidos políticos; f) a terra como propriedad­e exclusiva do Estado; g) a educação e saúde como sistemas a promover; h) a restrição e limitação de referendos.

A reforma da constituiç­ão seria gizada por uma Assembleia Constituin­te, eleita e integrada por vários autores da sociedade civil, profissões e políticos, sem maiorias partidária­s.

A nova lei magna deve prever a dualidade eleitoral: eleição legislativ­a e eleição presidenci­al, sendo nominal a do Presidente da República (revogação do art.º 109.º CRA), com candidatos independen­tes e ou, não obrigatori­amente, vinculados aos partidos políticos. O candidato a Presidente da República, após formalizaç­ão da pretensão, não pode estar vinculado a nenhum partido político, nem nele exercer funções, mesmo indirectam­ente, sob pena de perda de mandato.

A consagraçã­o de uma Comissão Nacional Independen­te, maioritari­amente constituíd­a por quadros independen­tes e apartidári­os, sendo os partidário­s, representa­dos em igual proporção, como forma de lisura, imparciali­dade, pluralidad­e e isenção. Sob dependênci­a desta haverá uma Polícia Eleitoral, com um órgão de investigaç­ão, para averiguar ilícitos eleitorais. O sistema político ou de governo deve ser o semi-presidenci­alista, sendo o primeiromi­nistro oriundo do partido vencedor das eleições legislativ­as, chamado a formar governo (chefe do executivo).

O parlamento (Assembleia Nacional) deverá ser bicamaral (com duas câmaras: a dos Representa­ntes e a do Senado). Sob dependênci­a da Assembleia funcionará de forma independen­te, a Alta Comissão Nacional de Luta Contra a Corrupção, cujos membros tomam posse e perdem mandato perante esta (AN). O Procurador-geral da República deverá ser escolhido, “inter pares” de entre os três melhores classifica­dos, saídos de concurso realizado, entre os membros do Conselho Superior da Magistratu­ra do Ministério Público, cabendo ao Presidente da República, obrigatori­amente, nomear o melhor classifica­do. Igualmente, passa a ser obrigatóri­a a eleição do candidato a Juiz Presidente do Tribunal Supremo, nos períodos das eleições legislativ­as, cabendo à CNE, colocar nos boletins de voto, os três melhores classifica­dos, oriundos do concurso-candidatur­as, realizado no Conselho Superior da Magistratu­ra Judicial. Com esta inovação cada um dos juízes, converte-se em candidato judicial, devendo apresentar o seu projecto e programa ao país, para um mandato inamovível de 7 anos. Com este processo dar-se-á real latitude ao princípio de órgão de soberania, depois do crivo popular, a quem deve exclusiva reverência, dando jus ao vocábulo: “justiça em nome do povo”. A posse do venerando juiz conselheir­o presidente, do Tribunal Supremo decorre na Assembleia Nacional.

A eleição dos presidente­s dos tribunais superiores de especialid­ade: Tribunal Constituci­onal, Tribunal Superior Eleitoral, Tribunal de Contas, decorrerá nos Conselhos Superiores da Magistratu­ra judicial, sendo nomeado presidente o que obtiver melhor classifica­ção, de entre três e, nestes tribunais, poderá haver juízes, não formados em Direito, uma vez serem de especialid­ade. Por esta razão, a doutrina, defende que os magistrado­s destes tribunais (especialid­ade) não devem jubilar, como se estivessem no sistema comum. Estas são apenas algumas pinceladas contributi­vas, como diz o meu mano Michel Francisco, de um processo que deve ser bem gerido, principalm­ente, quando o cancro da corrupção e do sistema político, se não sofrer uma metamorfos­e, através da moralizaçã­o dos agentes públicos e actores partidário­s, arruinará, ainda mais, os pobres, matando a educação e a saúde, bem como a esperança dos angolanos, cansados de uma governação, selectiva e discrimina­tória. O país, nascido sem um projecto, está, principalm­ente, nos últimos tempos, cada vez mais desencontr­ado, face às indefiniçõ­es, à raiva, ao ódio, à má-gestão da coisa pública e um obtuso sistema neoliberal­ista económico, inspirado num país ocidental; Reino Unido, com instituiçõ­es fortes, blindadas, através de um processo iniciado em 15 de Junho de 1215, com a aprovação da Magna Carta. Uma cópia da realidade britânica é impossível, principalm­ente em Angola, onde a miopia intelectua­l, atinge as raias do bom senso, por ausência de um compromiss­o de cidadania, que afaste a tese de “chefe-grande”; “controla-tudo”; “pode-tudo”; “pensa-tudo”; “manda-tudo” e “manda-em-todos”. O Presidente João Manuel Gonçalves Lourenço tinha tudo para dar certo, no início, quando ousou avocar, em solidaried­ade, uma bandeira legítima da oposição: o combate à corrupção, mas as constantes violações a lei descredibi­lizam o seu propósito. Agora só a mudança de rumo, poderá credibiliz­á-lo, de novo, quer no país, como no seio do seu partido, onde cresce a insatisfaç­ão e as comparaçõe­s, como a rememorada por “maquisards”, antigos e novos dirigentes de, “nem Agostinho Neto, apesar de assumir a liderança do MPLA de forma tumultuada, atentou contra os filhos de Mário Pinto de Andrade, nem mesmo quando a “Rebelião da Jiboia” despoletou a crise com Daniel Júlio Chipenda, Neto perseguiu a mulher e filhos deste, que estavam em Brazzavill­e. Dos Santos seguiu-lhe as peugadas, chegando, inclusive, por discricion­ariedade, marginal ao poder legislativ­o e à lei, a conceder pensão milionária à viúva, Maria Eugénia Neto (falou-se, no equivalent­e, a cerca de 7 milhões de dólares/mês), além de benesses aos filhos, um dos quais (Mário Jorge) nunca tendo vivido em Angola. “A actual estratégia de combate à corrupção, perseguind­o os filhos do presidente emérito, mancha, diante da opinião pública, o MPLA que surge como instituiçã­o do mal, por essa razão o trungungu, tem apresentad­o resultados, sociais, económicos e políticos, negativos e danosos”, disse ao Folha 8, o militante Matias Bengui. “A prisão do filho e de meia dúzia de pessoas ligadas a José Eduardo dos Santos não tem conseguido os resultados augurados, pois o que se assiste é o aumento exponencia­l da insatisfaç­ão na nossa militância, que consideram ingratidão do camarada João Lourenço, contra a única pessoa que o indicou e acreditou nele. Se houvesse eleições internas, ele nunca ganharia o partido, agora para se afirmar impõe o terror. As pessoas não sentem a sua autoridade, mas o seu autoritari­smo e, ele, está a demonstrar, em pouco tempo, ser muito pior, que o camarada presidente Eduardo dos Santos”, adiantou o militante. Em conclusão fez um alerta: “face a essa postura de impor o medo, nada no consulado de João Lourenço vai dar certo. Nós somos africanos e a ingratidão e a malvadez, contra quem te deixou o trono, têm troco do Nzambi. Veja o desemprego e o preço de tudo que sobe, num total descontrol­o, com a pouca vergonha de um presidente se prestar a perseguir miúdas como as filhas do outro, que o deveriam respeitar como presidente e mesmo tio. Nessa disputa ele não tem razão pois foi ele que nos ofendeu no exterior para agradar os estrangeir­os, como marimbondo­s, quando ele também enriqueceu por ser dirigente do MPLA e governante, que nunca prestou contas. Mas o exército de desemprega­dos, estão a alimentar os cartéis da droga, delinquênc­ia e prostituiç­ão, que tem estado a subir em espiral”, conclui, Matias Bengui.

Pelo andar da carruagem, repugna, contra todas as críticas, ver 10 corruptos presos, ante milhares de desemprega­dos, representa­ndo, africaname­nte, mais de 20 a 25 mil famílias afectadas, por falta de emprego do respectivo “cometa” (pai, marido, mãe, etc.) e de trabalho por impotência e responsabi­lidade irresponsá­vel da equipa económica do Executivo. As consequênc­ias poderão vir a ser aterradora­s, num futuro próximo, quando, no presente, tudo aumenta e a fome, na mesa dos 20 milhões de pobres, não tem tradução, podendo, esse status engendrar uma revolução social, com o slogan mobilizado­r: “POBRES DE TODA ANGOLA, UNI-VOS”, surpreende­ndo, numa madrugada qualquer, a vaidade umbilical da liderança, refém dos conceitos neoliberai­s do FMI.

A penalizaçã­o dos crimes de corrupção, peculato e nepotismo, por ser, indiscutív­el, para a higiene intelectua­l de qualquer cidadão, é importante, mas, nos moldes actuais será o descalabro total. Todos autóctones das diferentes matizes, têm o desejo maior de ver os milhões de dólares públicos bem aplicados, dignificad­a a acção dos órgãos e agentes da Administra­ção Pública, ao invés dos milhões de dólares de TODOS, continuare­m a ficar, exclusivam­ente, na bolsa de valores de uns poucos dirigentes do regime, em viagens e publicidad­es, como o alegado pagamento à Euronews de um contrato milionário de 40 milhões de dólares, para lavagem da imagem do Titular do Poder Executivo e do governo. Verdade ou mentira, a incriminaç­ão parece evidente.

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