NÃO SE EXIJA QUE O ESTADO SEJA O QUE NÃO É – SÉRIO!
OPresidente da República de Angola, João Lourenço, apela ( tal como fizera antes José Eduardo dos Santos) a um maior envolvimento dos privados para resolver os problemas da habitação e pede aos angolanos que não contem só com o Estado, defendendo a aposta na autoconstrução. Com o Estado, entenda- se, só podem contar os mais distintos filiados do MPLA. O Presidente passou dois dias no Bié, esteve com representantes da sociedade civil e dos jovens para ouvir as suas principais preocupações, sendo a habitação um dos problemas que surgiu mais destacado. Interpelado por Virgílio Elias, um dos primeiros jovens a colocar questões ao Presidente no âmbito do Diálogo com a Juventude, sugerindo a autoconstrução dirigida em loteamentos infra- estruturados para colmatar a insuficiência habitacional, João Lourenço mostrou concordância com a sugestão.
“É uma boa ideia, é disso que estamos à espera, que a iniciativa venha de vocês”, afirmou, salientando que “não é viável ser só o Estado a construir centralidades [ bairros sociais construídos pelo Estado]” e que não será esta a solução para os problemas habitacionais em Angola. “É preciso que o Estado construa, que o sector privado construa e é preciso apostar fortemente na autoconstrução”, em terrenos infra- estruturados cedidos pelo Estado, uma ideia que – diz – pretende levar a cabo em futuras centralidades. Dirigindo- se aos vários representantes de organizações juvenis e a uma plateia que encheu o salão do Instituto Superior Politécnico do Cuíto,
João Lourenço disse que está a trabalhar ( tal como MPLA “faz” há 44 anos) na resolução dos problemas, avisando que “é preciso o empenho de todos”, em vez de contarem apenas com o apoio do Estado. “O executivo tem de fazer, os privados têm de fazer, a sociedade civil tem de alertar sobre o que não está feito ou está mal feito”, exortou. Entre os jovens, o desemprego foi outro dos temas centrais, com um dos representantes juvenis a afirmar que “a única escapatória, por vezes, são os concursos públicos” para o Estado. Ao que João Lourenço respondeu que o Estado “não pode ser o único empregador”, reafirmando que está a trabalhar ( tal como MPLA “faz” há 44 anos) para “potenciar o desenvolvimento do sector privado” e convidando os privados “a ocupar o espaço que perderam”.
Esta foi a segunda edição dos Diálogos do Presidente com a Juventude ( a primeira aconteceu na província do Zaire) tendo sido escolhidos porta- vozes de várias associações juvenis para colocarem as suas questões e apresentarem sugestões. Antes, João Lourenço tinha também auscultado elementos da sociedade civil local que focaram problemas semelhantes: o custo de vida, a falta de habitação, mas também os cuidados de saúde e assistência e a integração social, numa intervenção do porta- voz dos antigos combatentes.
Nesta deslocação, o presidente inaugurou um sistema de reforço de abastecimento de água da cidade do Cuíto, construído pela chinesa CR20, que vai servir mais de 105 mil habitantes, num investimento de cerca de 39 milhões de dólares ( 35 milhões de euros).
Recorde- se que durante a campanha eleitoral de 2008 ( ainda a crise petrolífera que agora tudo justifica vinha longe), o partido de João Lourenço ( MPLA) prometeu a construção de um milhão de novas casas e a criação de milhões de novos empregos.
Nessa espécie de eleições os eleitores, vivos e mortos, deram ao MPLA mais de 80% dos votos. Quatro anos depois, os poucos que tinham milhões passaram a ter mais milhões, e os milhões que tinham pouco passaram a ter ainda menos.
Como poucos se recordam, como cada vez menos se recordam, como ainda menos estão interessados em recordar, o MPLA ( no poder deste 1975) prometeu aos angolanos também o fim da exclusão social, a consolidação da democracia e a restauração dos valores morais. Mas eis que a crise do petróleo… mandou tudo para as calemas. E eis que, “regressado” há dois anos ao país, João Lourenço descobre que o mal de tudo isto tem um nome: marimbondos. Descobre igualmente que os marimbondos têm um chefe: José Eduardo dos Santos.
De qualquer modo, na altura das eleições são sempre anunciados vários projectos habitacionais que estão em curso, ou em vias disso, ou em vias de estar em vias, em todo o país, seja por iniciativa pública, seja privada ( no caso de Angola não se sabe bem qual é a diferença).
O Governo do MPLA mantém que a construção de habitações sociais é uma das prioridades. Se calhar é por isso que a maior parte dos projectos habitacionais decorrem em Luanda onde faltam dois milhões de habitações.
E enquanto esperam, sentados à porta da cubata, os angolanos ficam a pensar que, se calhar, o MPLA precisa de mais 56 anos para, como dizia Agostinho Neto, resolver os problemas do Povo. Mas, seja como for, os investidores estrangeiros que por cá actuam já têm incluído nas suas contas os custos dos subornos e da corrupção como fazendo parte dos custos de negociação.
E até que Deus ( não o seu representante em Angola) se lembre dos angolanos, partamos a barriga a rir relembrando que foi José Eduardo dos Santos quem disse que o mundo necessita de exemplos concretos que confirmem que África pretende “virar firmemente uma página do passado de uma história em comum”, marcado pela existência de “governos autoritários ou autocráticos, para dar lugar a sociedades e instituições democráticas”. João Lourenço subscreve.