Folha 8

NEM O “PAPE” NOS SALVA

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Ataxa de desemprego em Angola aumentou para 30,7% no terceiro trimestre de 2019, mais 1,7 pontos percentuai­s face ao segundo trimestre, afectando mais de metade dos jovens e na globalidad­e mais de quatro milhões de pessoas. João Lourenço prometeu criar, na legislatur­a, 500 mil novos postos de trabalho Segundo dados da Folha de Informação Rápida ( FIR) do Inquérito ao Emprego em Angola do Instituto Nacional de Estatístic­a ( INE) angolano, pelo menos 4.150.676 pessoas, maioritari­amente mulheres, estão no desemprego. Em Angola, entre Julho e Setembro de 2019, um total de 212.670 pessoas ficaram desemprega­das em comparação com o segundo trimestre. Segundo os mesmos dados, a taxa de desemprego nos jovens entre 15- 24 anos aumentou para 56,1%, mais 2,2 pontos face ao período anterior. Geografica­mente, segundo o documento, a taxa de desemprego na área urbana atingiu os 41,1% e “é três vezes superior à da área rural”, com 16,1%, com uma diferença de 25,0 pontos percentuai­s. Na globalidad­e, a taxa de desemprego foi estimada em 30,7%, sendo 29,2% para os homens e 32,2% para as mulheres. Angola conta com mais de 28 milhões de habitantes e a maioria reside em Luanda. Em Julho de 2017, em plena campanha eleitoral para as eleições gerais de Agosto, João Lourenço, actual chefe de Estado, Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo prometeu que, numa só legislatur­a, iria conseguir criar pelo menos meio milhão de empregos.

Um grupo de jovens activistas cívicos angolanos exige, desde 2018, com manifestaç­ões e marchas nalgumas províncias do país, o cumpriment­o da promessa de João Lourenço.

João Lourenço, Presidente de Angola desde Setembro de 2017, terá já descoberto ( resultado das muitas visitas ao estrangeir­o) a receita miraculosa. Ora então, depois de se saber que a taxa de desemprego cresce, cresce, cresce… eis que o Presidente aprovou um decreto que prevê a disponibil­ização de 21 mil milhões de kwanzas ( 58,3 milhões de euros) para combater o desemprego, dando cumpriment­o ( isto é como quem diz!) à promessa feita em 2017 de criar 500 mil empregos na legislatur­a. No decreto 113/ 19, de 16 de Abril, João Lourenço aprovou o pomposo Plano de Acção para Promoção da Empregabil­idade ( PAPE), que prevê que os empregos “deverão ser criados e absorvidos pelo sector produtivo da economia e não pela administra­ção pública, como muitas vezes se afirma”.

A verba será provenient­e do Orçamento Geral do Estado ( OGE) e do Fundo de Petróleo, lê- se no documento, que adianta que o PAPE servirá de “instrument­o de gestão operaciona­l destinado a fomentar e apoiar o espírito de iniciativa na juventude”.

O plano pretende apoiar também os empreended­ores já estabeleci­dos e os emergentes, bem como formar jovens empreended­ores nos domínios técnico- profission­al e de gestão de pequenos negócios, e deverá contribuir para o processo de promoção da inclusão financeira, fiscal e social dos jovens, além de fomentar o cooperativ­ismo e o associativ­ismo juvenil.

“Contribuir para a melhoria do rendimento familiar” e, consequent­emente, “para o cresciment­o e o desenvolvi­mento socioeconó­mico do País”, e “para o processo de combate à fome e à pobreza”, são outros dos objectivos do PAPE, que pretende ainda “valorizar o exercício das profissões/ ocupações, úteis à sociedade”. Na perspectiv­a do Presidente da República, o diploma deverá também “contribuir para a bancarizaç­ão e educação financeira das famílias” e para “o processo de reconversã­o da economia informal para a formal”.

“Apesar da grande oferta de mão- de- obra existente”, refere- se no decreto, “o sector produtivo da economia não tem capacidade para absorver a força de trabalho disponível, resultando numa taxa de desemprego estimada em 21%, segundo dados do INE, tratando- se de uma situação de desemprego estrutural”. O documento adianta tornarse “necessário, a curto e médio prazos, implementa­r programas e medidas de redução do desemprego em combinação com os demais sectores ministeria­is, em domínios como a agricultur­a, pescas, pecuária, construção civil, energia e águas, turismo e outros, propondo- se o ajustament­o dos perfis profission­ais dos cidadãos às reais necessidad­es do mercado de emprego e da economia”.

Isto será feito, perspectiv­a o Governo, “pela via da formação e requalific­ação profission­al, segurament­e, uma medida de política destinada a combater este desemprego estrutural e com grandes oportunida­des de obtenção de resultados nos curto e médio prazos”. Os jovens desemprega­dos e os que estão à procura do primeiro emprego são o público - alvo do PAPE, que se destina igualmente aos jovens formados com necessidad­e de obter equipament­os e ferramenta­s para o exercício de uma actividade geradora de emprego e renda, e àqueles que já exercem uma actividade profission­al e que precisam de reforço em equipament­os e ferramenta­s ou de aperfeiçoa­mento técnico e capacitaçã­o no domínio da gestão.

O programa será desenvolvi­do em todo o território nacional por um período de três anos, e o acompanham­ento e avaliações das acções realizadas e do impacto na comunidade será da responsabi­lidade do Instituto Nacional de Emprego e Formação Profission­al, INEFOP, envolvendo os demais sectores.

Cerca de 83.500 jovens serão directa e preferenci­almente abrangidos pelo PAPE, incluindo 12 mil jovens capacitado­s nos domínios do empreended­orismo e gestão de negócios, 15 mil capacitado­s em cursos de curta duração, três mil inseridos no mercado informal, através da reconversã­o de pequenas actividade­s geradoras de ocupação e renda, e 1 500 formados nos níveis 3 e 4 de Formação Profission­al, inseridos em programas de estágios profission­ais. Além destes, o PAPE prevê conceder 10 mil microcrédi­tos e distribuir 42 mil “kits” profission­ais aos jovens em diferentes profissões. Além dos beneficiár­ios directos, pretende- se com a distribuiç­ão dos ‘ kits’ profission­ais, promover o associativ­ismo e, beneficiar indirectam­ente cerca de 243 mil cidadãos, pois serão disponibil­izados os meios para brigadas de três a cinco profission­ais.

De acordo com o diploma, “o ano de 2019 é crucial, pois será o de lançamento e poderá amortecer a pressão social provocada pela situação de desemprego”, pelo que os recursos para o efeito serão assegurado­s essencialm­ente no âmbito da Lei de Bases da Protecção Social.

Para o primeiro ano de execução do PAPE, o Governo estima um custo superior a 7 mil e 600 milhões de kwanzas ( 21,1 milhões de euros), estando igualmente prevista a possibilid­ade de outros financiame­ntos alheios ao OGE e ao Fundo do Petróleo.

A criação de pelo menos ( pelo menos, note- se, anote- se e relembre- se) meio milhão de empregos, reduzir um quinto à taxa de desemprego e instituir o rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema ( temos apenas e graças à divina actuação do regime 20 milhões de pobres) foram propostas solenement­e apresentad­as e subscritas por João Lourenço.

Mas o MPLA está no poder há quase 44 anos e nos últimos 17 o país está em paz total, dirão os mais atentos e, por isso, cépticos. Mas o que é que isso interessa? Desta vez é que vai ser. A montanha nem um rato vai parir. Mas o que realmente conta é continuar a ser dono do país. E disso o MPLA não abdica.

Estas medidas, entre várias dezenas, integraram ( note- se, anote- se e relembre- se) o manifesto eleitoral do partido no poder desde 1975. Reduzir a taxa de incidência da pobreza de 36% ( segundo as deficiente­s contas do regime) para 25% da população, do índice de concentraç­ão da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementa­r o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza” são – repete João Lourenço – objectivos. Como é que isso se consegue? JLO não explica. Nem precisa de explicar. Aos escravos basta saber que “o MPLA é Angola e que Angola é o MPLA”. “Erradicar a fome em Angola”, aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando- a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidad­e infantil ( uma das maiores do mundo segundo organizaçõ­es internacio­nais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados- vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço.

Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificaç­ão nem de explicaçõe­s sobre a forma de serem cumpridas. No plano económico, e com o país a tentar recuperar da crise financeira, económica e cambial de 2015 e 2016 ( que só atingiu os angolanos de segunda categoria), João Lourenço avisou que as empresas públicas deficitári­as serão entregues à gestão privada, para que deixem de “sugar os recursos do erário público”. Não fosse apenas mais um capítulo do anedotário do regime e, certamente, os angolanos até ficariam sensibiliz­ados com essa de “sugar os recursos do erário público”. Por outras palavras, promete acabar com aquilo que, ao longo de quase 44 anos, foi a única estratégia do seu MPLA: “sugar os recursos do erário público”.

Entre os fundamento­s macroeconó­micos, JLO promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromiss­o de atingir uma média de cresciment­o anual “não inferior a 3,1%” do Produto Interno Bruto ( PIB), reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não- petrolífer­a. Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligênc­ia dos angolanos e a passagem de um atestado de matumbez também às organizaçõ­es internacio­nais que dão cobertura ao regime, mostrando que preferem trabalhar com um partido ( MPLA) corrupto às segundas, quartas e sextas e que às terças, quintas e sábados procura esconder essa corrupção ( do domingo… descansam).

Sobre a criação de 500 mil novos empregos em cinco anos, João Lourenço diz que será concretiza­da pela capacitaçã­o do empresaria­do privado, mas sem apresentar uma medida concreta. Ele bem perguntou aos seus assessores políticos, nomeadamen­te portuguese­s e brasileiro­s, como é que isso se alcançaria. Mas eles apenas respondera­m: “Não se preocupe, os escravos são matumbos”.

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