OS MALEFÍCIOS DO ATIPISMO CONSTITUCIONAL
Sendo assim, grande parte da imprecisão do interesse público desaparece quando contextualizada, de acordo com o atipismo de uma Constituição violadora dos mais sublimes interesses dos cidadãos e de Angola, feita não por José Eduardo dos Santos, mas por juristas, que deveriam ser criminalizados ou responsabilizados, por terem visto o umbigo de um homem ao invés do país.
No entanto é mister não descurarmos que “o interesse público é um conceito que recebeu no decorrer da história significações que vão da absoluta discricionariedade à total vinculação.
De qualquer modo é um conceito que foi e continuará a ser utilizado pelo Direito administrativo de forma ampla, ainda que diferente, em cada sistema jurídico concretamente considerado e em cada sociedade na qual esteja inserido”.
Nesta situação a confirmação do ex- presidente da República e Presidente Emérito do MPLA foi dada através de uma carta através da qual José Eduardo dos Santos respondeu ao Tribunal Supremo onde decorre o julgamento do chamado caso “500 milhões”, que tem como arguidos, dentre outros, o seu filho varão, José Filomeno dos Santos “Zenú”, à época presidente do Fundo Soberano.
A solicitação para ouvir José Eduardo dos Santos foi pedida por Sérgio Raimundo, advogado de defesa do arguido Valter Filipe, ex- governador do BNA.
O caso envolve uma suposta transferência indevida de 500 milhões de dólares ( 458 milhões de euros) do Estado angolano para um banco no exterior do país, em que são arguidos o ex- governador do BNA, Valter Filipe, o antigo presidente do Fundo Soberano de Angola, José Filomeno “Zenu” dos Santos, o empresário angolano Jorge Gaudens Sebastião, e o então director do Departamento de Gestão de Reservas do BNA, António Bule Manuel.
Os réus estão acusados de diversos crimes incluindo burla por defraudação, branqueamento de capitais e tráfico de influência (“Zenu” dos Santos e Jorge Gaudens Sebastião) e burla por defraudação, branqueamento de capitais e peculato ( António Bule Manuel e Valter Filipe).
Escalpelizando a acusação, quanto a burla por defraudação e branqueamento de capitais, imputadas a Zenu dos Santos e Jorge Gaudens Sebastião, encontram- se algumas contradições, desde logo porque a construção do crime de “burla por defraudação” não dispensar a concorrência de vários elementos típicos; tais como o uso de erro ou engano sobre os factos, astuciosamente provocado; determinar a outrem à prática de actos que lhe causam, ou a terceiro, prejuízo patrimonial – ( elementos objectivos) – e, por fim, a intenção do agente obter para si ou terceiro um enriquecimento ilegítimo ( elemento subjectivo).
No caso estes elementos precisam de ser provados, mas o facto do montante ter repousado na esfera de uma instituição bancária, não tendo esta denunciado valores anormais aos contratualizados no contrato com o Estado angolano, pode deixar cair por terra esta tese, mais a mais tendo sido o montante encontrado no domicilio bancário do PNB - Paribas, Londres.
No entanto, quer o Ministério Público como o Tribunal se quiserem evocar a verificação de uma conduta ( intencional) astuciosa que tenha induzido directamente em erro ou engano o ex- Presidente da República e o Estado, terá de montar uma engenharia de provas, tal como as linhas que conduziriam a um enriquecimento ilegítimo destes, que resultaria em prejuízo financeiro evidente, quer do sujeito passivo como de terceiro ( Estado). Finalmente, não tendo sido Zenu a trazer os potenciais financiadores torna- se frágil a imputação deste crime, porquanto apenas foi intermediário de uma carta de financiadores externos, que lhe foi entregue, pelo amigo, Jorge Gaudens.
A este por sua vez é preciso saber se repousa o enquadramento de ter agido de forma livre e deliberada, sob a alegação falsa de possuir “meios” para “resolver” a situação financeira do país, com base no milionário empréstimo. Será importante determinar se chamou a si essa capacidade financeira ou se a depositou em terceiros internacional, no caso o PNB Paribas e este confirma a linearidade do acordo de financiamento, para desafogar o consulado de João Lourenço.
Não havendo burla por defraudação, cairá por terra a tese de branqueamento de capitais, sempre e se a parte financiadora confirmar os valores e a acusação não conseguir provar que das tranches que sairiam de Angola havia subfacturação, para beneficiar, ilicitamente os arguidos.