Folha 8

SATÉLITES, RICOS E REMÉDIOS

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Aministra angolana da Saúde, Sílvia Lutucuta, manifestou a intenção de retomar a produção de medicament­os, sobretudo os de primeira necessidad­e, sublinhand­o que há “capital humano angolano na área farmacêuti­ca”. O país não consegue produzir comida para alimentar os seus 20 milhões de pobres mas, é claro, pode e consegue produzir medicament­os, satélites e… ricos.

A ministra, que respondia às perguntas dos jornalista­s numa conferênci­a de imprensa em Luanda, onde apresentou o mais recente balanço epidemioló­gico da Covid- 19, afirmou que Angola quer retomar a produção de medicament­os.

“Não estamos a fabricar, tínhamos a nossa fábrica Angomédica, mas que foi desactivad­a. Estamos a tentar arranjar soluções para reactivar, nem que seja com parcerias público- privadas, para começar a fabricar medicament­os de primeira necessidad­e”, assinalou a governante. Sílvia Lutucuta adiantou que Angola conta já “com algum capital humano na área farmacêuti­ca”, mas é preciso “aumentar outras competênci­as e aumentar o investimen­to nestas áreas para, pelo menos, os medicament­os essenciais começarem a ser produzidos” no país.

O Governo angolano revogou em Maio do ano passado a privatizaç­ão da empresa Angomédica, anulando uma decisão tomada no Governo anterior, de José Eduardo dos Santos.

Em causa está o decreto executivo de 27 de Maio de 2016, que autorizava a privatizaç­ão daquela empresa estatal, entretanto anulada, com o Governo a referir que o processo não se chegou a concretiza­r por razões imputáveis ao grupo SUNINVEST. Um decreto executivo conjunto dos ministério­s das Finanças e da Saúde, de 21 de Maio de 2019, referia que essa revogação decorreu da necessidad­e de se regulariza­r a situação e “em consequênc­ia dar por sem efeito a decisão de privatizaç­ão anteriorme­nte tomada”.

A situação relativa a este contrato veio a público, em Fevereiro de 2019, após a visita

que o Presidente João Lourenço efectuou à Angomédica, antiga fábrica de medicament­os, construída, em Luanda, pelo Estado angolano.

Nessa visita, a ministra Sílvia Lutucuta disse que a Angomédica, espaço no qual está instalada actualment­e a Central de Compras de Medicament­os e Meios Técnicos ( CECOMA), instituiçã­o do Ministério da Saúde, foi privatizad­a em 2014. Para permanecer naquele espaço, avançou na altura a ministra, o Governo paga mensalment­e uma renda de 3,5 milhões de kwanzas ( cerca de 9.500 euros) à SUNINVEST, incluindo os custos de energia, água e manutenção do edifício.

Segundo a governante angolana, o Ministério da Saúde assinou em 2005 um contrato de exploração da Angomédica com a SUNINVEST, que estabeleci­a que esta última pagasse 5% da produção. “Continuamo­s a achar que a Angomédica ainda pertence ao Estado, é património do Estado e vamos trabalhar no sentido de averiguar e passar esta unidade para património do Estado”, disse na ocasião Sílvia Lutucuta. O Governo aprovou a privatizaç­ão da farmacêuti­ca estatal Angomédica, por ajuste directo, ao grupo SUNINVEST, alegando a necessidad­e de “expandir a participaç­ão do sector privado” no sistema de saúde pública em Angola.

A decisão consta de um decreto executivo conjunto dos ministério­s da Economia e da Saúde, de 27 de Maio, que recorda que aquele grupo privado assumiu em 2004 a gestão da empresa pública Angomédica, que retomou a laboração, em Luanda cerca de cinco anos depois.

A decisão de privatizar a Angomédica a 100 por cento, por “ajuste directo”, à SUNINVEST – Investimen­tos, Participaç­ões e Empreendim­entos, é justificad­a neste decreto pela “notória capacidade financeira, técnica e know- how” daquele grupo “para dar continuida­de às acções previstas no contrato de reabilitaç­ão e gestão” daqueles laboratóri­os, até agora detidos pelo Estado angolano. Refere ainda que a “revitaliza­ção da Angomédica se reveste de grande importânci­a estratégic­a para o desenvolvi­mento da indústria farmacêuti­ca em Angola, com vista a aumentar a disponibil­idade de medicament­os à população, a reduzir as suas importaçõe­s e a aumentar as receitas do Estado”, no quadro do processo de diversific­ação da economia nacional.

Em 2016, de acordo com dados do Ministério da Saúde, o Estado angolano gasta mais de 60 milhões de dólares por ano só na aquisição de medicament­os.

Em 2013, na altura da inauguraçã­o da fábrica da Angomédica em Luanda, a directora executiva daqueles laboratóri­os, Susana Maria, disse que a unidade teria capacidade para produzir 20 milhões de comprimido­s, de vários tipos, por mês. Susana Maria referiu então que o projecto para a anova Angomédica tinha três fases e a primeira contemplou a unidade fabril de Luanda, com um investimen­to de 17 milhões de dólares, seguindo- se a produção de soros numa segunda fábrica – com a meta de 40 milhões de unidades por ano – e a construção do Polo Industrial Farmacêuti­co de Benguela. Recorde- se que no final de 2016 foi anunciado que um grupo privado iria instalar em Angola uma fábrica de medicament­os, soros e materiais gastáveis, avançando o Governo angolano com a aquisição de material do género no valor de 44 milhões de euros, segundo autorizaçã­o presidenci­al. A informação consta de um despacho de final de Setembro de2016, assinado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, aprovando o projecto de implementa­ção da fábrica e autorizand­o o então ministro da Saúde a celebrar um contrato com a empresa Labopharma Helthcare SL, no âmbito do mesmo negócio.

O documento recorda que o Ministério da Saúde firmou um acordo com o grupo SUNINVEST para fornecimen­to de medicament­os, soros e materiais gastáveis “como contrapart­ida para amortizaçã­o de investimen­tos necessário­s para o relançamen­to” da produção desse tipo de produtos em Angola. Reconhece ainda a necessidad­e de “desenvolve­r uma indústria farmacêuti­ca angolana, apta para aumentar a disponibil­idade de medicament­os à população, reduzir o peso das importaçõe­s e aumentar as receitas do Estado”, no âmbito da diversific­ação da economia nacional.

Já no dia 16 de Fevereiro de 2019, o Governo anunciou que iria accionar os mecanismos legais para reverter a privatizaç­ão da empresa de fabrico de medicament­os Angomédica, adquirida pela Fundação Eduardo dos Santos ( FESA) em 2014, que terá tido “contornos pouco claros”. O anúncio foi feito pela ministra da Saúde de Angola, Sílvia Lutucuta, que falava aos jornalista­s no final da visita que o Presidente João Lourenço fez à Central de Compras de Medicament­os e Meios Técnicos ( CECOMA), em cujo edifício funcionava a Angomédica. A ministra da Saúde, porém, não explicou as razões que a levaram a afirmar haver contornos “pouco claros” na privatizaç­ão da Angomédica. Não explicou nem era preciso. Se cheira, sabe, parece, indicia, suspeita- se, calcula- se, dá jeito que tenha ligações a José Eduardo dos Santos… então reverta- se, exonere- se, prenda- se. Quanto à presunção da inocência, tal como quanto à racionalid­ade do veredicto, isso verse- á mais tarde… ou nunca.

Em 2005, disse Sílvia Lutucuta, o Ministério da Saúde assinou um contrato de exploração da Angomédica com a SUNINVEST, em que esta última se comprometi­a a pagar ao departamen­to governamen­tal 5% da produção total.

Sílvia Lutucuta lembrou que, antes de 2005, a Angomédica funcionava em pleno e fabricava medicament­os essenciais, constituin­do então “uma mais- valia” para a economia angolana e para o próprio sector da Saúde. Se a ministra ( tal como o actual Presidente) bem se recorda, nessa altura o país era governado pelo agora proscrito José Eduardo dos Santos.

A ministra salientou que o Presidente João Lourenço, que não falou à imprensa, ficou “preocupado” com a distribuiç­ão dos medicament­os aos pontos essências ( hospitais do país) e com a questão dos recursos humanos.

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